Abiraterone or the ‘NICE’ story ?…
“No princípio era o verbo”…
1. Tirada bíblica que se aplica às trapalhadas do MS.
E o princípio foi - como suspeitou desde o início - um polémico ‘PARECER SOBRE UM MODELO DE DELIBERAÇÃO PARA FINANCIAMENTO DO CUSTO DOS MEDICAMENTOS’, lavrado pela CNECV, em Set 2012. link Com peregrinas especulações sobre ‘racionamento de custos’ em contraponto com a consensual ‘racionalização de despesas’.
Mas existe um parágrafo (Introdução, pág. 3 link)
nesse parecer que ‘adivinha’ – sem o acautelar nas conclusões – situações que, neste momento, poderão estar a acontecer ao no SNS. Escreve-se aí: “O ponto está em que se passe do actual racionamento implícito – que muitos defendem há décadas como eticamente e politicamente inaceitável (Sulmasy, 1992) e que está ao sabor de contingências múltiplas, por vezes unilaterais, dos clínicos ou de outros decisores hospitalares – para uma escolha e racionamento explícito e transparente, em diálogo com os cidadãos que devem ser informados (porque nada substitui a participação democrática), para que assim se mantenha intacta a confiança dos doentes nos profissionais de saúde e no SNS e maximize a responsabilidade dos decisores”.
Na verdade, o ‘caso abiraterona’ que colocou sob fogo a introdução de medicamentos inovadores no âmbito oncológico e trouxe à liça a posição concertada dos IPO (Lisboa, Porto e Coimbra) evidencia a probabilidade de existir por detrás um percurso deveras sinuoso.
Apenso a isso o País assiste ao desenvolvimento de um macabro ‘ping-pong’ acerca das responsabilidades pela recusa do fármaco nessas instituições no meio do qual se encontra indefeso um habitual sujeito: o doente. link
2. De facto, em todo este imbróglio nenhum membro das Comissões de Farmácia e Terapêutica – órgão em que o MS fundamenta as medidas de não-administração do fármaco abiraterona link - veio a terreiro defender esta ‘posição’ de princípio. Aqui falta o tal verbo. E ficamos por tentativas de explicações por parte de cidadãos que – independentemente da sua formação - exercem presentemente funções administrativas em instituições do SNS ou cargos associativos em organizações profissionais.
Voltemos ao concreto, isto é, à recusa de administração, por parte dos 3 IPO, do acetato de abiraterona a doentes portadores de carcinoma prostático metastizado.
O percurso desta nebulosa situação é, pelo que se pode dedutivamente depreender, complexo e sinuoso.
O acetato de abiraterona passou o crivo da Agencia Europeia dos Medicamentos (EAM) link e da Food and Drug Administration (FDA) link, que aprovaram (ambos em 2011) a sua introdução no mercado, com a indicações para o uso no cancro avançado da próstata.
Depois de divulgadas estas autorizações as mesmas seriam, numa primeira fase, bloqueadas pelo NICE (National Institute for Clinical Excellence) que recusou a sua administração, no âmbito do serviço de saúde inglês (NHS) link; link nos citados doentes baseando-se numa confusa e insidiosa argumentação à volta do binómio custo/benefício. Um artigo publicado no The Telegraph, em Fev. 2012, documenta bem esta confusa situação e as múltiplas reacções que foram surgindo, relativas à decisão inicial do NICE sobre este fármaco link, bem como várias tomadas de posição de reputados oncologistas britânicos link
3. Na realidade, a argumentação usada pelo NICE para rejeitar a introdução deste fármaco no NHS não conseguiu escamotear a qualificação de ‘ser muito onerosa’ (‘too expensive for NHS’) link passando para a opinião publica o carácter ‘economicista’ desta decisão.
Após um percurso conflituoso (nomeadamente com organizações profissionais, opinion makers, órgãos de comunicação social e utentes do NHS) a terapêutica com abiraterona no cancro avançado da próstata (após quimioterapia) é autorizada pelo NICE em Maio 2012 (três meses a pós a sua rejeição) link
Portugal (através dos órgãos competentes) resolveu colar-se à decisão primitiva (de recusa) do instituto inglês, cujas habilidades em ‘deturpar evidências’, relativamente a alguns fármacos oncológicos (e não só), já vem de longe link; link; link. E mesmo após a derrogação do ‘racionamento’ preliminar os persistem metódicas dúvidas sobre a efectividade de um fármaco já usado em toda a Europa.
Depois, a chicana que somos obrigados a assistir. Passado quase ano e meio Portugal ‘esqueceu-se’ ou ‘adiou’ (será que vamos saber qual a verdadeira motivação?) fazer o impositivo ‘up-date’ sobre o referido fármaco. Hoje, estamos confrontados com uma discussão sobre questões que aparentemente estão cientificamente ultrapassadas e de certo modo requentadas. Persistimos a defender convicções derrogadas sendo de suspeitar se também aqui não pretendemos estar para além da restritiva NICE.
Não vai ser fácil explicar esta história. Na verdade, ficámos mergulhados (e imobilizados) nos constrangimentos à volta do seu custo acalentando dúvidas sobre eficiência e , finalmente, apoiados por uma implacável burocracia de fachada técnico-científica.
Esta não é uma história muito ‘NICE’.
E-Pá!
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