quinta-feira, agosto 15

Regresso do lápis azul


O Diário da República publicou no seu n.º 140, 2.ª série, de 23 de julho de 2013 um Despacho (n.º 9635/2013) proveniente do Gabinete do Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Saúde que julgávamos impossível acontecer numa sociedade que se quer democrática, informada, transparente e participativa e num governo e numa administração constitucionalmente comprometidos com o princípio ético e republicano de prestação de contas aos cidadãos.
Através deste despacho fica proibido às Administrações Regionais de Saúde (ARS), aos estabelecimentos hospitalares, aos Agrupamentos de Centros de Saúde (ACES), e às Unidades Locais de Saúde (ULS) tornar pública qualquer informação estatística na área da saúde, de carácter regional ou local, sem que a mesma seja previamente submetida à autorização do Director-Geral.
Sabendo-se que hoje em dia toda a informação estatística relativa à saúde, produzida no quadro dos estabelecimentos do SNS, só é possível através dos sistemas de informação electrónicos validados pelo Ministério da Saúde, esta decisão apenas pode configurar um dispositivo censório inaceitável do ponto de vista dos direitos dos cidadãos à informação, e uma inconcebível desautorização e desrespeito pela autonomia e responsabilização dos vários organismos integrados na administração direta e desconcentrada do Ministério.
O articulado não deixa dúvidas. É suficientemente explícito nesta matéria ao atribuir ao Director-Geral da Saúde a prerrogativa de decidir que tipo de informação deve ser, ou não, considerada de interesse para divulgação pública generalizada.
Se a preocupação do Ministério é uniformizar termos de referência no quadro do sistema estatístico nacional tal só é possível através duma política coerente e tecnicamente sustentada relativamente à produção de matrizes analíticas e programas informáticos que assegurem este objectivo, possibilitem a comparabilidade de indicadores e, por conseguinte, de desempenhos e produzam a informação destinada à análise e à prestação de contas perante a sociedade em geral. Nunca através dum órgão central encarregue de, a partir da informação gerada a nível regional ou local, e usando as palavras do referido Despacho, garantir a produção e divulgação de informação adequada no quadro do sistema estatístico nacional, eufemismo para censura prévia.
Como pode o Ministério da Saúde fazer publicar semelhante atentado à informação e à autonomia das instituições quando a prestação de contas, divulgação de relatórios de actividades e publicitação entendida como relevante são quesitos avaliados na maioria dos processos de acreditação para a qualidade e estão contemplados em múltiplos dispositivos legais produzidos pelo próprio ministério, enquanto competências e obrigações próprias dos seus órgãos de governação?
Estranhamos até agora o silêncio, não sabemos se subserviente, cúmplice ou temeroso, dos órgãos de administração dos hospitais, ARS, ULS e ACES. Mas estranhamos particularmente o silêncio do Sr. Director-Geral da Saúde.
Será que se sente confortável e disponível para aceitar as funções de censor-mor que agora lhe passam a atribuir no quadro do ministério da saúde?
A Comissão Executiva da FNAM, Coimbra, 8 de Agosto de 2013 link

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1 Comments:

Blogger e-pá! said...

Bravo!
Passamos do livro 'único' às estatísticas 'únicas'.
A partir daqui só falta recriar o SNI (Secretariado Nacional de Informação).

9:23 da tarde  

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