A destruição “criativa” do SNS
À medida que a legislatura se aproxima do fim a
"política de saúde" de saúde deste (des)governo fica cada vez mais
clara nos seus objetivos e propósitos. Em jeito de balanço podemos enunciar os
pontos-chave da metodologia desta “governação”:
- “Sangrar” o SNS indo além da troika esgotando-o assim do
lado financeiro;
- Desprestigiar o serviço público e os seus profissionais
alimentando uma sórdida e paranóica campanha, contra tudo e com todos, com o
objetivo de incutir na opinião pública a ideia de que a insustentabilidade do
SNS é devida a quem nele trabalha;
- Bater no peito a clamar pelo SNS enquanto por ação mas,
sobretudo, por omissão tudo foi feito para o destruir;
- Arrasar a máquina administrativa e técnica dos órgão de
administração do sistema de saúde através de recrutamentos esotéricos e
incompetentes conduzindo a uma crise de competências nunca vista e deixando os
lugares de topo sem titulares de valor refugiando-se no refugo partidário;
- Fazer ilusionismo político com as promessas de reforma, as
contra-reformas e as não reformas.
Então e agora afinal o que temos?
- Um flop nunca visto. (resistem 2 ou 3 acólitos (os do
costume) a defender esta política ( certamente para poderem conservar as
posições);
- Uma erosão das instituições sem precedentes;
- Uma profunda desmotivação e uma grande vontade de fuga dos
profissionais;
Perante esta desgraça o “mercado” privado anima-se e vai-nos
fazendo entrar pela porta “fantásticos” investidores de países com sistemas de
saúde deploráveis em busca da “medicina comercial” profit oriented que bem
conhecem e praticam há décadas.
- O achincalhamento da instituição SNS e da utilidade
pública da sua missão vai abrindo as portas para o circo dos disparates.
“Jornalistas” e comentaristas vão palpitando deslumbrados pelo sonho de fazer
da saúde (finalmente) uma grande área de negócio;
- “Personalidades” como o Prof Daniel Bessa teorizam sobre a
circunstância ora descoberta de afinal os hospitais pouco mais serem do que
hotéis;
- Abrem “clínicas” a rodos nos supermercados que prometem
boa saúde entre a fileira do peixe e a bancada do repolho. A mais recente (ao
que parece de uma importante multinacional com sede num 3º andar de uma rua das
Caldas da Rainha) implementa mesmo um conceito novo e revolucionário: consultas
médicas mediadas por um enfermeiro através da televisão (não se sabe com
novelas nos intervalos de espera);
- A confusão é tanta que até o ultraliberal presidente da
Associação dos Hospitais Privados que tanto vinha proclamando as virtudes do
mercado veio agora bastante aflito dizer que mercado sim mas sem exageros.
Disse ele que é preciso ver a questão da qualidade (não sabemos se das clínicas
nos supermercados, se do peixe ou dos legumes).
É isto Portugal a chegar ao final de 2014. Um grupo de
irresponsáveis ignorantes e inconsequentes entreteve-se a estragar o que
funcionava razoavelmente não tendo alcançado nenhum dos objetivos
propagandeados.
Deixam, sem dúvida uma marca indelével muito difícil de
apagar.
Carlos Silva
Etiquetas: bater no fundo, Paulo Macedo
4 Comments:
Um bom balanço.
Acho justa uma pequena achega: os actuais decisores políticos são irresponsáveis (como se afirma e bem) mas não são, nunca foram, ignorantes nem inconsequentes. Sempre souberam o que estavam a fazer. E quanto às consequências os que sobreviverem à senha destruidora vão necessitar de vários anos para as atenuar e corrigir.
Auchan, requiem ou a robotização através do abandalhamento…
Já não nos bastavam as ‘Walk in Clinics’ salutares apêndices do Pingo Doce que, ao que parece, estão em franca expansão (Telheiras, Sintra, Santa Maria da Feira, Aveiro e brevemente em Alvalade link).
Já não nos bastava a peregrina asserção de que ‘a saúde é o melhor negócio depois da indústria do armamento’ link.
Já não nos bastavam as listas de espera (cirúrgicas link e de consultas link).
Já não nos bastavam as constantes inoperacionalidades da emergência médica link .
Já não nos bastavam os recorrentes e sucessivos cortes (link; link; link) que tudo hipotecam nas condições de acesso e na qualidade das prestações dos serviços públicos (hospitalares e cuidados primários).
Faltava-nos a habilitação à sorte grande (à taluda) que ao comprar uma ‘cautela’ de € 30, o vigésimo – se a fortuna acaso proporcionar - poderá estar premiada. E se não o conseguir tem o privilégio de poder seguir por vídeo o ‘andar à roda’.
Não acredita?
Vá a uma clínica acoitada no grupo Auchan (Jumbo & Pão de Açúcar) prestimosa mentora da onda ‘saúde aqui tão perto’ (em pleno hipermercado) e pela módica quantia anunciada até poderá aceder a uma videoconferência! link.
De facto, o que está a dar é o marketing, o empreendedorismo, a competitividade, a alavancagem dos meios de distribuição, a explosão de startup’s, etc…
E não admira que um grupo de distribuição de “hault champs” (fonética ‘Auchan’) se meta em ‘altos voos’.
Negócio é negócio e o das armas (classificado como o mais lucrativo) estará, por hora, condicionado a operações de intermediação (‘brokering’) ou à espera de uma ‘liberalização’( à Auchan?).
E a música de fundo para ilustrar estes voos bem podia ser um requiem de Schubert.
Ou, em alternativa, uma velha música cantada por Lena d’Água:
“Olhó robot!…
É pró menino e prá menina
Olha o robot
Trabalha muito e gasta pouco
Olha o robot
É muito útil pra quem manda
Olha o robot
Está pronto a ser programado”…
Questionada sobre a legalidade do exercício do acto médico nas condições praticadas pela empresa de Saúde 3.0 instalada no Almada Forum, com perspetiva de alargar os seus serviços a outras superfícies comerciais do grupo Auchan, a Entidade Reguladora da Saúde informou não ter ainda actuado por não ter recebido qualquer denúncia.
Estranha resposta quando é o próprio grupo empresarial a denunciar as condições irregulares do exercício da medicina, ao tornar públicas as circunstâncias em que são praticados nas suas instalações consultas médicas: Um enfermeiro a colher os dados (de anamnese, pressupõe-se) encaminhando-os para uma consulta médica por videoconferência.
Sabendo-se que são componentes indissociáveis do exame médico a anamnese, o exame físico, o diagnóstico e a prescrição quando devida; caberia de imediato à Entidade Reguladora da Saúde actuar dentro das suas competências de regulação, de supervisão, nos quais se incluem a garantia dos direitos relativos ao acesso aos cuidados de saúde, à prestação de cuidados de saúde de qualidade, bem como dos demais direitos dos utentes (artigo 5º dos Estatutos da ERS).
De que é que a ERS está à espera para atuar! Que haja vítimas?
Quer dizer... Com o INEM e os paramédicos, com 3 semanas de formação já se pode fazer telemedicina, agora como é com enfermeiros, a praticar actos de enfermagem( não sei porque insistem em chamar actos médicos a algo que nunca se viu um médico a fazer ou que este nem sabe para que serve)... já lhes chamam actos médicos.
Irra... tanto facciosismo já enjoa
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