Se não puder destacar-se pelo talento, faça de conta
Assim, reflectindo no
potencial desta máxima proposta por Dave Weibaum1 o
talento e o esforço são duas potencialidades que se podem conjugar.
Contudo, numa lógica de competitividade estas duas potencialidades, que podem
ser obtidas a partir de qualquer recurso, devem ser talentosamente geridas e muitas
vezes cautelosamente guardadas.
Alguns autores definem os
recursos, como activos específicos de uma organização, que são difíceis, senão
impossíveis de imitar, dando como exemplos os segredos comerciais2, a
especialização e competências em determinadas áreas de difícil aprendizagem3 (Teece,
Pisano & Shuen, 1997:509-533).
Para Wernerfelt (1985),
recurso é qualquer coisa que pode ser pensada como um ponto forte ou fraco de
uma dada organização. De acordo com o autor, as organizações conseguem vantagens
competitivas se adquirirem ou desenvolverem recursos superiores ou conseguindo
uma combinação superior de ambos, relativamente aos concorrentes que também
estão posicionados nos mesmos segmentos de mercado.
Não podemos falar da teoria
baseada nos recursos sem falarmos do contributo de Edithe Penrose4 e a focalização que centrou nas vantagens
competitivas destes. Para esta autora a organização constitui uma entidade integrada
por pessoas e outros meios necessários à sua actividade, capazes de garantir a
sobrevivência da organização para além dos seus fundadores, fundamentando a sua
afirmação com referência às organizações centenárias que ainda hoje resistem às
adversidades dos tempos modernos.
O principal ingrediente que
a autora sustenta é a criação de valor centrado no conhecimento, que a jusante
vai gerar valor acrescentado e consequentemente novas oportunidades de negócio,
garantindo autonomia à organização para enfrentar as incertezas do curto prazo
e as adversidades que o mercado impõe.
Ora, não há conhecimento sem
aprendizagem e para que o conhecimento se torne um activo intangível tem que
ser partilhado por canais fluídos e transversais a toda a organização fazendo
mesmo parte da sua cultura e garantindo a capacidade de inovar e diferenciar.
Assim, quando as
organizações criam produtos únicos, desenvolvendo capacidades únicas e competências
próprias, tornam os recursos mais competitivos e sustentáveis em contextos de
mercado.
A teoria baseada nos
recursos reconhece as especificidades de cada organização, focalizando a oferta
em detrimento da procura, ao invés do que a teoria neoclássica5 nos propõe.
A ideia central desta teoria
que associa os conceitos de criação de conhecimento e aprendizagem
organizacional, para de forma conjugada partirem à conquista da vantagem
competitiva, sustentável e diferenciada, centrada nos recursos e nas suas superiores
qualidades, de forma a garantir o futuro da organização face as demais concorrentes
do mercado.
Todavia, este pressuposto
implica que os recursos não sejam facilmente replicados e transaccionados.
Assim, garantida a dificuldade de replicação e da transferência dos recursos superiores
estão criadas as condições para a garantia das vantagens competitivas que podem
originar diferenças substantivas face às organizações concorrentes. Importa
assim aqui, também dizer, que quando um activo se torna objecto de substituição
difícil ou impossível, não se pode considerar, só por isso, um activo de
vantagens competitivas superiores mas antes “activo crítico6”, porque a sua
saída, pode eventualmente trazer dificuldades acrescidas à organização,
dificultando ou bloqueando, a cadeia de produção.
Desta forma se uma
organização neste caso, um hospital, despende muitos recursos num determinado projecto
altamente diferenciado, conduzido apenas por um colaborador, é provável, que
este se torne num recurso altamente apetecível pelas organizações que sentem as
mesmas dificuldades. Por outro lado podemos também dizer, que as competências superiores
de um recurso dependem do seu contributo para as vantagens distintivas da
organização, que se por um lado reforçam as suas potencialidades, por outro lado
aumentam a dependência desta (organização), relativamente a este recurso que em
determinado contexto pode mesmo propiciar determinados tipos de abusos.
Para Rugman e Verbeke
(2002), a emergente influência desta teoria pode dever-se à polivalência de
ingredientes que a incorporam da área da economia, estratégia, logística e
comunicação. Assim, um recurso distintivo deve possuir os seguintes atributos:
• Precisa ser superior,
detendo capacidades distintivas face aos concorrentes;
• Deve ser escasso entre as
organizações, particularmente nas que operam no mesmo sector;
• A sua replicação deve ser
difícil e nunca deve ser perfeita;
• Devem ser eliminados os
substitutos estrategicamente equivalentes e facilmente replicáveis (Barney,
1991).
O recurso capaz de criar
vantagem competitiva e sustentável é socialmente complexo (Barney,1991). O
aspecto que melhor explica a dificuldade de imitação deve estar ligado à sua
escassez, ou dificuldade de obtenção, garantida pelo controlo de acesso ou uso exclusivo,
tais como registo de marca, propriedade exclusiva, a destacar de entre outros
(Rumelt e Lippman, 1982). A dificuldade de imitação deve estar também associada
à dificuldade de transferência dos recursos entre organizações e à incerteza dos
investimentos na sua obtenção.
Para Mathews (2003), os
recursos da organização podem ser entendidos como sendo o núcleo fundamental
para gerar valor sustentado. Estes recursos não existem desagregados, mas
interligados dentro de um dado contexto organizativo, que levam a organização a
alcançar resultados superiores para os seus accionistas, tais como retorno sobre
investimento, retorno sobre activos e fluxo de caixa líquido.
A partir do trabalho de
Penrose (1997) outros autores como Wernerfelt (1984) também começaram a
analisar as organizações a partir dos recursos, ao invés de centrar a análise
nos seus produtos, o que permitiu abrir novas perspectivas para a estratégia
organizacional.
Já antes, Barney (Barney e
Hesterly, 1996:133) tinham desenvolvido este paradigma transformando a visão
baseada nos recursos numa teoria completa, suportada em dois pressupostos
básicos respeitantes às capacidades e aos recursos da organização:
• 1.º Os recursos e as suas
competências podem evoluir, de forma significativa na organização, isto é, o
pressuposto da heterogeneidade da organização;
• 2.º Estas diferenças
permanecem estáveis, ou seja, o pressuposto da imobilidade de recursos e das competências.
Assim, face ao exposto podemos afirmar que a teoria baseada nos recursos
diverge da teoria económica tradicional, já que nesta, as diferenças entre as
organizações são tratadas como fruto do acaso em detrimento das vantagens
competitivas dos recursos. A principal consequência dos pressupostos desta
teoria é que a diferença de desempenho entre as organizações, ou melhor, a obtenção
de vantagens competitivas, é explicada pela heterogeneidade superior dos recursos.
Isto significa que a fonte básica para a vantagem competitiva e distintiva, são
os recursos e competências que estes detêm, que devem ser desenvolvidas e
controladas pelas organizações, particularmente quando estes são elementos
escassos e valiosos, ao ponto de se tornar impossível a sua substituição.
Ora, em contextos de
mudança, todos estes determinantes têm que ser apurados.
Quando, na tomada de uma
decisão, oconhecimento constitui a variável mais importante, é aconselhável que
a autoridade de quem decide e a capacidade de decisão coincidam. Podemos fazer
coincidir o conhecimento e autoridade de decisão de duas maneiras: uma é
deslocando o conhecimento para os que possuem o poder de decisão, outra é
deslocando o poder de decisão para os que detêm o conhecimento. Esta foi a
opção escolhida pela gestão da qualidade total.
A transferência de saberes
não é instantânea. As pessoas levam tempo a assimilar a informação. Estas
dificuldades têm um custo e, em contextos de crise, estes podem ser muito elevados,
incluindo a perda irreversível de oportunidades, não fazendo, por vezes, qualquer
sentido o seu investimento. Problemas difíceis e específicos de transferência de
informação acontecem, quando a melhor tomada de decisão exige a integração
específica de conhecimentos, localizados em indivíduos, que trabalham afastados
uns dos outros. A integração de conhecimentos para concepção de um novo produto
e a difusão no mercado da sua disponibilidade, é disto um bom exemplo. Ao nível
das organizações de saúde a falta de visão gestionária na agenda de recursos, leva
a uma completa desregulação da sua transacção. A relação competitiva entre as organizações
públicas e privadas é agressiva e tensa. Em algumas especialidades altamente
diferenciadas como é o caso da radiologia, o espaço dos privados tem vindo a
monopolizar os recursos, vendo-se depois as organizações públicas na
necessidade de recorrer a estes serviços a custos despropositados em sistema de
outsourcing, ou outros tipos de prestação de serviços.
Mas o inverso também é
verdadeiro. Então, depois de toda a integração normativa que decorre desde
finais de 2002, no sector Empresarial do Estado, que tornou a gestão das
organizações públicas mais flexível e célere, permitindo promover a concorrência,
centrada na estratégia da vantagem competitiva baseada nos recursos,
nomeadamente em especialidades altamente diferenciadas, como bem acontece
nalguns centros de reconhecida idoneidade neste País.
Na realidade e como bem se
percebe, os recursos de capacidades superiores partilham-se entre grandes hospitais
públicos e privados, por vontade e determinação destes e, não como resultado
conseguido de alguma estratégia para o sector.
_______________________________
Notas:
1. Filósofo e pensador
Norte-Americano
2. A bibliografia cita
frequentemente a fórmula da Coca-Cola. Portugal é referência nos moldes de
vidro e em parte do calçado.
3. Na realidade trata-se do
princípio de diferenciação ou especialização.
4. Edith Penrose, nascida a
15 Novembro 1914 em Los Angeles morreu no dia 11 Outubro 1996 em Waterbeach, Cambrid-geshire,
foi uma proeminente economista americana. Diplomada em 1939, acompanhou o
marido em Gèneve no Instituto Internacional de Trabalho. A autora escreveu o
seu primeiro livro, Economics of the International Patent System, publicado em
1951. Edith Penrose obteve o seu Ph.D. na Universidade Johns Hopkins e
desenvolveu a sua tese sobre a orientação do economista austríaco Fritz
Machlup.
5. As necessidades do
mercado tendem aequilibrar a economia e há pleno emprego, ou seja, porque há
equilíbrio entre a procura e a oferta.
6. Habitualmente são pessoas
que detêm competências únicas mas, essenciais ao encadeamento do processo de
produção. Num hospital um exemplo típico será o caldeireiro, num estaleiro de
grande dimensão o serralheiro-mecânico.
BIBLIOGRAFIA
BARNEY, J. B, HESTERLY, W. (1996) Organizational Economics:
understanding the relationship between organizations and economic analysis. In:
CLEGG, S. R.; HARDY, C.;
HAMEL G. C.K. P, (1994) Competing for the Future,
Harvard: University Press.
LIPPMAN, S.; R. P. RUMELT (1982). “Uncertain imitability:
An Analysis of Interfirm Differences in Efficiency under Competition.” Bell journal
of Economics 13:418-453.
MATTHEWS, J. J. (2003) The Situatedness of Learning: A
Phenomenographical Study of the Personal and Professional Learning of Post and
Under Graduate Students. University of Sheffield, Department of Educational Studies.
PENROSE, E. (1997) The Theory of the Growth of the Firm.
In: FOSS, N. J. Resources, firms, and strategies: a reader in the
resource-based perspective, Oxford: Oxford University Press.
PORTER, M. (1989) A Vantagem
Competitiva das Nações, Rio de Janeiro: Editora Campus.
RUGMAN, A.M. & VERBEKE, A., 2008, “A New Perspective
on the Regional and Global Strategies of Multinational Services Firms”, Management
International Review (MIR), vol. 48, n.º 4, pp.397-411.
TEECE, D. J. (1992). “Competition, Cooperation, and
Innovation : Organisational Arrangements for Regimes of Rapid Technological
Progress.” Journal of Economic Behavior & Organization 18 (1): 1-25.
TEECE, P., S., A., (1997) Dynamic Capabilities and Strategic
Management, in Strategic Management Journal, Vol. 18, No 7, 1997 pp.509-533.
TEECE, D. J. (2009). “Business Models, Business Strategy
and Innovation.” Long Range Planning.
WERNERFELT, B. (1984) A resource-based view of the
firm. Strategic Management Journal. v.5, n.2, pp. 171-180
Baltazar Fernandes , Mestre
em Gestão de Serviços de Saúde pelo ISCTE e Doutorando do 3.º ano de Ciências
da Comunicação, na Universidade do Minho.
Nota: Sou gestora há mais de trinta anos. Neste longo trajecto
adquiri a ilusão de já ter visto de tudo um pouco. Um enigma, no entanto, permanece indecifrável. De que forma as empresas identificam, seleccionam, avaliam e valorizam os seus
activos de topo.
No grupo destes gestores são facilmente identificáveis dois grandes grupos: os espertos e os outros.
Os primeiros
sempre em transição. Ousados, sem melindres quanto à contenção orçamental. Capazes de gastar, sem pestanejar, muitos euros em propaganda. Dos segundos, não reza a
história. A não ser nas chorudas folhas de vencimento.
Fatalmente, faltavam os gestores de pacotilha. Réplicas facilmente transaccionáveis. Arrivistas pouco preparados e ambição desmedida. Com final anunciado de muitos
milhões de prejuízo. Afinal, réplicas são réplicas.
Clara Gomes
Clara Gomes
Etiquetas: Crise e politica de saúde
0 Comments:
Enviar um comentário
<< Home