quinta-feira, dezembro 24

SU, equipas dedicadas

Uma das medidas anunciadas por Fernando Araújo, secretário de estado adjunto da saúde, refere-se à alteração do modelo de funcionamento das urgências através da criação de equipas fixas . A referida proposta de alteração vai ser discutida com os hospitais, tendo por base as "boas experiências" verificadas em algumas unidades hospitalares.
 “Os serviços de urgência são serviços multidisciplinares e multiprofissionais que têm como objetivo a prestação de cuidados de saúde em todas as situações enquadradas nas definições de urgência e emergência médicas”. (despacho normativo n.º 11/2002 de 06 de março).
O despacho n.º 10319/2014, de 11 de agosto, determina a estrutura do Sistema Integrado de Emergência Médica (SIEM) ao nível da responsabilidade hospitalar e sua interface com o pré -hospitalar, os níveis de responsabilidade dos Serviços de Urgência (SU), bem como estabelece padrões mínimos relativos à sua estrutura, recursos humanos, formação, critérios e indicadores de qualidade e define o processo de monitorização e avaliação. A alínea a) do artigo 21º do referido despacho, prevê a constituição de equipas dedicadas: A constituição preferencial do SU por equipas de profissionais de saúde dedicados à Urgência, ou seja, profissionais que trabalham na sua totalidade ou maioritariamente apenas no SU, sobretudo nos períodos do dia de maior procura, no cumprimento do Despacho nº 47/ SEAS/2006. link
As equipas dedicadas existem em cerca de 5% dos SU e 49% dos hospitais adoptaram um modelo misto. O Hospitalar de São João, onde António Ferreira é presidente do Conselho de Administração conta-se entre os hospitais que adoptaram este modelo.
A solidez desta solução dependerá da concordância da Ordem dos Médicos na criação da especialidade de Urgência/Emergência e no aumento de formação em Urgência a nível do internato médico. De notar que os SU têm de há muito um quadro específico de enfermeiros e assistentes operacionais.
Nos hospitais onde não há equipas de dedicadas nas Urgências, o trabalho médico caracteriza-se pela prática de largas horas de trabalho extraordinário (a remuneração base apenas cobre 15 horas de trabalho nas urgências, 18 horas após implementação dos horários de 40 horas semanais) muitas de presença não activa.
Associado à criação de equipas médicas dedicadas de SU deverá estar a alteração do modelo de pagamento existente de base salarial para um modelo “pay-for-performance” (P4P) . Ou seja, a contratação das equipas fixas deverá ser acompanhado de novo modelo que a par da remuneração base preveja uma remuneração variável dependente da performance, aferida por resultados e metas pré-definidas, que possa premiar, entre outros, o controlo de custos, número de complicações e mcdts sem comprometer a qualidade do atendimento.
 Quem está contra:
Sociedade Portuguesa de Medicina Interna (SPMI): Para esta entidade, «a aplicação cega do modelo estrito de equipas médicas dedicadas, tem enormes riscos em Portugal», visto que «o número de doentes que recorre aos serviços de urgência é muito elevado, ao contrário do que acontece noutros países Em Portugal o doente chega por regra à Urgência sem qualquer tipo de triagem médica ou contacto com o Médico Assistente, pelo que é crucial a abordagem holística garantida pelo Internista». link
FNAM, para quem a « repentina obsessão com as chamadas “equipas dedicadas” visa, na nossa apreciação, facilitar, entre outras questões, a entrega, em diversos casos, do serviço de urgência a empresas de contratação de médicos indiferenciados. as “equipas dedicadas”, constituídas por médicos sem formação e não integrados no corpo clínico da instituição, não fazem qualquer sentido nem se traduzirão em qualquer benefício para o funcionamento deste delicado e sensível serviço link
 Ao longo de várias décadas as urgências hospitalares têm sido objecto de vários estudos: Relatório sabre a Reestruturação das Urgencias (Ministerio da Saude 1996); Relatório Proposta da Rede de Urgencias - Comissão Tecnica de Apoio ao Processo de Requalificação das Urgencias- CTAPRU (Ministerio da Saude 2007); Proposta de Rede de Referenciação de Urgencia e Emergencia - CTAPRU (Ministerio da Saude 2007, com atualização em 2008); Reavaliação da Rede Nacional de Emergência e Urgência Relatório CRRNEU link
Clara Gomes

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2 Comments:

Blogger e-pá! said...

Poderá existir na proposta de 'equipas dedicadas' para as urgências hospitalares um oculto e grave contratempo. Trata-se da integração desses doentes no ambiente hospitalar, pós prestação do serviço de urgência.
A proposta que tem certamente justificações na área de gestão (dos recursos humanos e na organização das 'respostas') mas poderá revelar-se enferma por introdução de 'mecanismos de exclusão' que só se revelarão à posteriori.
Claro que estamos a considerar as 'verdadeiras urgências', ou se quisermos 'emergências' que, em grande número, determinam cuidados hospitalares subsequentes (em regime de hospitalização).
A continuidade assistencial de um doente que subitamente foi colocado numa situação de emergência é fundamental para os resultados a obter neste tipo de prestação de serviços. Com as dificuldades conhecidas nas tarefas de articulação entre serviços (e até entre profissionais) é de recear as 'soluções de continuidade'.
As urgências hospitalares - bem como as urgências prestadas pelos cuidados primários - não devem ser liminarmente dissociadas das instituições onde estão alocadas. A alocação física (instalações) não chega e deverá simultaneamente pugnar-se para que esta seja complementada por uma integração expedita e funcional na instituição acolhedora.
O conceito de 'corpo profissional' (médico, de enfermagem e de outros técnicos) que foi caindo em desuso por motivações orçamentais em privilegio de contratações temporárias e ad hoc, não será tão obsoleto como o pintam.
Ninguém à partida pode garantir que a solução das 'urgências dedicadas' respeite estas condições que se afiguram basilares para uma boa efetividade dos serviços prestados nas urgências e consequente na tramitação a jusante.
Esta situação enxerta-se nas questões de levantadas pela SPMI (Sociedade Portuguesa de Medicina Interna) acerca da necessidade (amplamente reconhecida) de em termos qualitativos da resposta se dever proporcionar uma abordagem global do doente urgente.
Na verdade poderá ser arriscado adaptar a situação das urgências hospitalares às ilusões de séries televisivas (como a Anatomia de Grey).
Na realidade (e é isso que interessa), as situações médicas urgentes no território nacional não são uma cópia do que virtualmente acontece em Chicago (nem nos mecanismos de acessibilidade são idênticos, nem na resposta funcional das estruturas hospitalares dada a inexistência de um SNS nos EUA ) e, por outro lado, não se divisa a possibilidade de dispor de um filão de recrutamento para míticos e imaginários Drs. House's...
Deveremos separar as soluções de conteúdos ficcionais. É prudente.

12:47 da tarde  
Blogger geraldes said...

As ilusões e o fascínio pela modernidade começaram com a série ER onde o doente chegado de nenhures sem referenciação e sem história prévia de contacto com o sistema de saúde era abordado de forma "holistica" por emergentistas. A questão a que ninguém responde é qual o futuro a médio longo prazo destes holisticos colegas. Quando o natural burnout surgir vão ser integrados em que funções ? Talvez nalguma comissão de qualidade ou de risco ou numa obscura consulta de triagem? Mudam se os tempos mudam as vontades mas a urgência será sempre o nó gordio do SNS.

3:51 da tarde  

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