sábado, fevereiro 11

Ai, aguenta, aguenta!

O senhor “Ai, aguenta, aguenta!” não aguentou 
Bom dia. 
Este é seu Expresso Curto, no dia em que Fernando Ulrich, o homem que um dia disse a frase “ai, aguenta, aguenta!”, referindo-se à possibilidade do país aguentar ainda mais austeridade, não aguentou ele próprio os sucessivos golpes no BPI, deixando a presidência executiva do banco para um espanhol e passando a presidente não executivo. 
Convenhamos que os últimos anos não foram fáceis para Ulrich. Devido à crise e às novas e mais duras regras europeias para o setor bancário, que sempre criticou, teve de pedir 1500 milhões de euros de ajuda estatal em meados de 2012, que pagou dois anos depois. Assistiu à saída de um dos principais acionistas de referência do banco, o brasileiro Itaú e os equilíbrios a esse nível, que sempre tinham assente num tripé de grandes investidores, começaram a esboroar-se. Depois, o grande sucesso do Banco de Fomento de Angola sofreu um primeiro golpe, quando o governo angolano exigiu que 49% do capital passasse para investidores locais. Ulrich tentou adiar o mais possível esse momento, remetendo-o para quando o mercado de capitais abrisse em Angola (continua por abrir…), mas não conseguiu resistir à pressão de Luanda e teve de aceitar como sócia a filha do presidente angolano, Isabel dos Santos, que entretanto também já se tornara uma das principais acionistas do BPI em Portugal. Mesmo assim, o desempenho continuou a ser tão bom, com o BFA a representar mais de dois terços dos resultados do BPI, que quando o Banco Central Europeu, por considerar que o mercado angolano não cumpria as regras de supervisão europeias, impôs a Ulrich a venda da maioria do capital, o presidente executivo tentou por todos os meios encontrar uma solução que lhe permitisse não perder o controlo de um ativo tão precioso. Em vão. O maior acionista do BPI, os catalães do CaixaBank e Isabel dos Santos encetam então um atribulado processo de negociações para encontrar uma solução, que acaba agora num divórcio: Isabel vende a sua participação no BPI mas torna-se a acionista maioritária do BFA. Por seu turno, o CaixaBank passa a controlar 84,5% do capital do BPI pelos catalães do CaixaBank na sequência da OPA que lançou, acabando de vez com o equilíbrio acionista tripartido que era uma das imagens de marca da instituição e que permitia que esta tivesse uma gestão inequivocamente em mãos nacionais, primeiro por Artur Santos Silva, depois por Fernando Ulrich. Agora há um único acionista que passa a mandar na instituição e um presidente executivo de nacionalidade espanhola, Pablo Forero. O projeto BPI, tal como o conhecemos desde a sua fundação, morreu ontem.
 Leiam-se as declarações de Ulrich: “O BPI, a partir de hoje, faz parte do grupo CaixaBank. Isso é claro. Até agora, o CaixaBank era o maior accionista. A partir de hoje, o CaixaBank controla o BPI. Não há nenhuma dúvida sobre isto e eu entendo que isto é uma boa notícia para o BPI e para os clientes”. Está bem, Fernando: então o modelo anterior era mau para o BPI e para os clientes? 
Dos cinco maiores bancos que operam no mercado português, só a Caixa Geral de Depósitos se mantém nacional, com o seu capital controlado a 100% pelo Estado. O BCP é controlado pelos chineses da Fosun, o BPI pelos catalães do La Caixa, o Santander Totta pelos espanhóis do Santander e o Novo Banco aguarda quem o compre – mas não será capital nacional a mandar no futuro da instituição. Foi a isto que chegámos, 37 anos depois da abertura do setor à iniciativa privada por decisão de um governo liderado por Mário Soares. 
Nicolau Santos
Perguntar-se-á, mas que raio tem a ver este arguto comentário sobre a Banca Nacional com a discussão em curso sobre as PPP em Saúde? Aparentemente pouco mas na essência muito, digo eu. Depois da queda do BES e do afastamento da CGD do “negócio privado da Saúde”, à excepção do grupo Mello (até quando?) as PPP estão hoje nas mãos de grupos financeiros internacionais. Sendo decisão política do Governo manter, senão mesmo reforçar (veremos o que vai suceder com os novos hospitais anunciados) este modelo de construção/gestão de hospitais públicos, será que vamos assistir na Saúde ao mesmo que hoje se verifica no sector bancário? Com grupos económicos internacionais a controlar grande parte do Serviço Nacional de Saúde? 
Tavisto

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