Cada vez pior!
Acha que Vieira da Silva é um ministro mais amigo dos patrões?
Eu nunca vejo a política como um jogo de simpatias ou meço um Governo
pelas vontades individuais dos ministros. Política é relação de forças. O que é
verdade é que o PS é permeável aos grandes interesses económicos. E isso vê-se
na medida da energia, como se vê na recusa de mudar a legislação laboral, ou vê-se também na forma como continua a
proteger o sector privado da saúde numa altura em que é tão necessário proteger
o SNS
O Governo acabou discretamente por renovar por dois anos a PPP do
Hospital de Cascais, quando há um ano o ministro da Saúde tinha dito que a
decisão estava tomada e que não haveria negociação direta.
O PS faz parte de um centro político em Portugal que ao longo dos
tempos promoveu a promiscuidade entre os grandes interesses económicos e a
decisão política. Há uma enorme expectativa, desde logo da base do PS, que os
acordos feitos à esquerda permitam cumprir a expectativa de uma democracia que
fica mais reforçada e que é capaz de colocar os interesses económicos onde
devem estar e não a mandar no poder político. E acho que o PS frustra essa expectativa quando mantém as PPP de
hospitais privados como Cascais, que custam por ano €10 milhões a mais do que
um hospital público nas mesmas condições. Ou quando é incapaz de mexer na
energia. Ou quando nem as alterações laborais que estão no programa de Governo
é capaz de fazer.
Mas acha que é um mau sinal em relação a uma possível negociação com o
PS para uma nova lei de bases na saúde?
O SNS é dos serviços mais fragilizados. O que tem acontecido é que tem
existido um desgaste do SNS por meios muito diversos. Portanto, é preciso
atacar esses problemas todos.
Quais?
Há o problema claro do
subfinanciamento. O orçamento do SNS durante os anos da troika, com o
Governo PSD-CDS, encolheu 1600 milhões. De lá até cá só recuperámos 600
milhões. Ou seja, ainda estamos mil milhões abaixo do que estávamos nessa
altura. Portanto, há aqui um problema claro de opções. Nós temos estado a fazer
opções de financiamento que fazem com que grande parte dos recursos da saúde
vão para o sector privado. Para lá das PPP de que já falámos, nos meios de diagnóstico, por exemplo, o
Estado gasta em contratualizações de diagnóstico todos os anos mais de mil
milhões de euros. E há um ano o ministro da saúde dizia que bastavam 800
milhões de euros para substituir material obsoleto e poderíamos internalizar
boa parte desses serviços. E finalmente temos o problema dos trabalhadores do SNS, nas suas mais variadas áreas. E
é para nós difícil de compreender como é que este tempo todo o ministro da
Saúde tem problemas por resolver com todos os profissionais da área da saúde.
Alguns com casos tão caricatos — ou terríveis — como os técnicos de
diagnóstico, que deixaram de ter carreira com a promessa de que teriam uma nova
carreira e não se criou carreira nenhuma. Ficaram num limbo. E o ministro nem
encontrava tempo para se reunir com estes profissionais da saúde.
Quando é que o BE apresentará a sua proposta?
A proposta de Arnaut e Semedo será apresentada formalmente pelos seus
autores no início de janeiro. O que nós já nos comprometemos a fazer é pegar na
proposta e fazer um debate interno e externo.
Essa poderia ser uma das áreas de convergência além dos acordos
assinados em 2015. Tendo em conta que dos acordos de 2015 já quase 80% a 90%
estão cumpridos ou em andamento, o que é que falta ainda cumprir?
O problema dos serviços públicos é o mais complicado e é o que diz mais
a toda a gente. Porque servem toda a gente. A escola pública está muito
fragilizada. No SNS, dos 1600 milhões que foram cortados ainda só recuperámos
600 milhões. Na educação, dos 1200 milhões que foram cortados ainda só
repusemos 300 milhões. E isto em termos nominais, sem ter em conta a inflação
ou o crescimento do PIB. É preciso, no espaço desta legislatura, ter a coragem
de proteger serviços públicos que são fundamentais. E isso significa mais
investimento na escola, retirar as medidas de Nuno Crato que estão a retirar os
alunos das famílias mais carenciadas da possibilidade de terem um processo de
aprendizagem pleno. E é possível, do ponto de vista da economia, fazer algumas
alterações ainda durante esta legislatura, assim o queira o PS. Nomeadamente
nos direitos do trabalho, na energia e no investimento público.
Maria de Belém é opção
“preocupante”
O BE reage de forma dura à escolha de Maria de Belém Roseira para rever
a Lei de Bases da Saúde, a convite do ministro da Saúde, Adalberto Campos
Fernandes. Maria de Belém, ex-ministra da Saúde, ex-deputada e ex-presidente do
PS (a convite de António José Seguro) é também consultora do grupo privado Luz
Saúde e é isso que leva Catarina Martins a considerar que a sua escolha por parte
do Governo foi “um sinal estranho e preocupante”. “Uma nova lei de bases da
saúde — que protegesse o SNS da predação dos privados e ao mesmo tempo
conseguisse respeitar os profissionais e utentes — era uma medida que tinha
espaço para uma alargada convergência política, porque não seria só acarinhada
pelo BE”, considera a bloquista. Catarina Martins insiste que “teria sido
possível fazer mais com negociações a três”, ou seja, que se PCP tivesse
aceitado negociar à mesa mesa de BE e PS, este teria cedido mais. A
coordenadora do BE não quer falar muito sobre o pós-2019 mas vai dizendo que
uma das próximas prioridades será a reforma fiscal.
Expresso 09.12.17
Vejo com muito cepticismo o relançamento político do próximo ano:
Discussão da Lei de Bases da Saúde
(Maria de Belém, concordo, é péssima escolha); continuidade das PPP (todos
sabemos o logro que são as PPP e o empenho dos defensores do Pacto para a Saúde); resolução do rosário de problemas que afectam a Saúde: Subfinanciamento,
pacificação dos grupos profissionais, renovação do parque de equipamentos.
Ao fim de dois anos de exercício nunca como nesta legislatura os
problemas da Saúde continuam a acumular-se/agravar-se e o ministro da saúde a demonstrar
cada vez maior incapacidade para a sua resolução.
Clara Gomes
Etiquetas: Clara
3 Comments:
Fala-se muito, em especial à Direita, na necessidade de prosseguir com as reformas estruturais. Por trás deste chavão, está normalmente o desejo de implementar medidas que penalizem o mundo do trabalho, cortando direitos e diminuindo salários. Nada é dito porém, relativamente à principal reforma estrutural que urge tomar: o combate à promiscuidade público-privada que se foi instalando aos mais diversos níveis e sectores, da nossa sociedade.
Lembram-se do paradigma das parcerias no país vizinho?Imensos gestores de reconhecido mérito e quejandos fizeram imensas visitas de estudo e muitos quiseram transformar esse no paradigma da inovação da gestão hospitalar.Mas agora Pasme-se , um governo de direita , o de Espanha retira-o da esfera privada e passa-o para o sector pubico
É so ver o link
http://www.publico.es/sociedad/hospital-alzira-sera-definitivamente-gestion-publica-partir-del-1-abril-2018.html
mesmo como em Portugal
É a Constituição, senhor Presidente
O que agora está em jogo é o SNS poder retomar o papel constitucional de prestador de cuidados.
Quando toma posse, o Presidente da República faz a seguinte declaração de compromisso: “Juro por minha honra desempenhar fielmente as funções em que fico investido e defender, cumprir e fazer cumprir a Constituição da República Portuguesa.” Considerando que esta declaração não é uma figura de retórica, mas traduz aquilo a que fica comprometido e obrigado a cumprir, o Presidente da República há-de respeitar escrupulosamente, durante o mandato para que foi eleito, o que a Constituição da República consagra.
Já se percebeu que este Presidente da República, em particular, quer habituar os portugueses de que tem uma palavra a dizer sobre todos os assuntos, que nada escapa ao seu escrutínio e ao seu julgamento. É o que tradicionalmente se tem entendido como magistratura de influência, entendida como orientações para o que há-de acontecer, seja qual for a matéria, trate-se do que se tratar. Exemplificando. Ainda a comissão nomeada pelo Governo para elaborar uma proposta na qual se há-de basear o seu projecto de Lei de Bases da Saúde não começou a funcionar, e já o Presidente da República se manifestou, entregando-lhe um caderno de encargos no qual defende que deseja uma “fórmula intermédia”, referindo-se à combinação entre os interesses do sector empresarial da prestação de cuidados de saúde e as obrigações impostas pela Constituição quanto ao direito à protecção da saúde dos portugueses e quem a realiza.
Se bem se entende este propósito, ao introduzir na organização do sistema de saúde a teoria dos dois hemisférios, o hemisfério do sector empresarial privado, em contínuo crescimento, e o hemisfério do sector público, em definhamento constante, o ponto de vista do Presidente da República só é compreensível à luz da defesa de um maior aumento do crescimento do sector empresarial, para que a teoria seja compreensível. É a defesa da figura de sistema de saúde, consagrada pela primeira vez na actual Lei de Bases da Saúde, em vigor desde 1990, em que o Serviço Nacional de Saúde passou a ver-se obrigado a concorrer com o sector privado. Ora o que agora está em jogo, em particular nesta conjuntura política, é o SNS poder retomar o papel constitucional de prestador de cuidados, e não o de evoluir para a função de pagador da produção realizada pelo sector empresarial, como já tem vindo a acontecer.
Ser o Presidente da República a condicionar as regras a que há-de estar obrigada a comissão no cumprimento da missão que lhe foi atribuída é uma exorbitância e uma interferência que deve ser rejeitada, em particular pelos deputados da Assembleia da República, os quais serão os únicos a ter a última palavra sobre esse dispositivo legal.
No entanto, se há aspecto em que o Presidente da República podia ter uma palavra a dizer, era na política de saúde, e não tanto sobre quem deve deter os meios de produção. E na política de saúde, naquilo em que o défice acumulado é gigantesco: a promoção da saúde a prevenção da doença. Percorrer o país de lés-a-lés levando a palavra sobre a importância destas dimensões com resultados tão relevantes para a saúde de todos seria uma contribuição concreta que estaria certamente ao seu alcance. E se o seu desejo de consensos neste sector é tão forte, aceitando este desafio certamente que era capaz de obter melhores e mais úteis resultados.
Cipriano Justo, JP 28.11.17
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