domingo, fevereiro 19

Defender a Saúde e o SNS


As declarações de CC no Seminário sobre Financiamento da Saúde, referindo a possibilidade de voltarmos a ter “Porcionistas” e “Gratuitos”, caíram que nem uma bomba com os estilhaços a espalharem-se em várias direcções. Sobre este assunto gostaria de deixar aqui três pequenas notas.

1ª- Desdramatizar

CC é um dos nossos melhores Investigadores e Estudiosos/Peritos em Saúde com um brilhantismo e capacidade de analisar a Saúde por todos reconhecido – incluo-o no grupo restrito das Quatro Maiores Estrelas actuais dos AH. Não duvidamos que pretende melhorar a Saúde e o SNS, embora por vezes as suas afirmações (mediatizadas) pareçam não o acompanhar nesse desejo.
As mudanças que se propõe fazer não suscitaram contestação política significativa (grande consenso implícito?) mas quem trabalha na Saúde sabe como serão difíceis de aplicar, sobretudo num quadro em que já se impuseram sacrifícios e se retiraram “direitos”. O MS estará porventura entre a espada e a parede:

A espada são os constrangimentos orçamentais (OE e MF) e económicos (necessidade de produzir melhores resultados em saúde usando menos recursos do País) que empurram para a continuidade de reformas com vista à racionalização do SNS e do Sistema de Saúde (maior qualidade e eficácia com o mesmo dispêndio);
A parede são as pressões para aumento das despesas dos lobbies (Área farmacêutica, Prestadores, Profissionais, Associações de doentes, etc.) e manutenção do status quo, “mais e melhores serviços, sem nenhum encargo ou responsabilidade adicional” (autarcas, população e politiqueiros).

Neste enquadramento não surpreende que por vezes o Perito/Investigador ressurja e se sobreponha ao Ministro “anti-político” que por vezes parece ser. Esta tendência, a acontecer, será mais marcante em períodos em que o papel de Ministro seja especialmente difícil e já terá acontecido também aos que o antecederam (MS).

2ª- Lembrar

De facto convém lembrar outro Perito de extraordinário prestígio, Dr. Paulo Mendo, que teve a coragem de afirmar publicamente, várias vezes, uma convicção semelhante: defendeu que as pessoas pagassem parte dos cuidados em função da sua rendimento/IRS (isenção para quem não tivesse determinado rendimento). No mesmo plano pode considerar-se também o desejo expresso pelo Dr. Luís Filipe Pereira de pagamento de taxas moderadoras diferenciadas, em função da capacidade de pagar.
É para mim pacifico que estas afirmações sempre pressuporiam, antes de serem levadas à prática, de três condições concretizadas sina qua non:

– O apoio do Primeiro-Ministro e do Partido (do Secretário Geral?);
– Um debate nacional a que se siga um amplo consenso político;
– A alteração da Constituição.

A sua aplicação imediata não está (não estava) por isso em causa.
Poderia considerar-se para sustentação daquelas posições a teoria do “balão de ensaio” em que se poderia pensar que se teria garantido aquele apoio prévio ou, no mínimo, o acordo implícito do 1º Ministro/SG. Compreende-se esta teoria num quadro pré-eleitoral e como rampa de lançamento de ideias, o que agora não tem qualquer cabimento. Resta assim a possibilidade de CC, num ambiente de alguma informalidade e considerando uma perspectiva teórica e de longo prazo, ter deixado que o Investigador se soltasse demasiado e se sobrepusesse ao MS.

3ª- Reafirmar

Finalmente uma nota mais técnica e de opinião pessoal quanto ao que se justifica fazer/o que nos espera.
Começaria por questionar se os problemas de financiamento do SNS se resolvem injectando-lhe mais dinheiro dos doentes que possam pagar?
Penso que não, pelo menos imediatamente, visto que quem pode pagar veria os seus impostos reduzidos em conformidade, daí que para o Estado a diferença entre o que receberia de impostos e o que pagaria ao SNS não se alterava (!), ressalvada a alteração de padrão de consumo (se houvesse menor consumo sim, mas os mecanismos de co-pagamento estimulam mais o recurso ao sector privado onde os preços são mais altos e há mais indução de actos, pelo que o resultado seria até negativo!).
Depois acredito que globalmente os recursos que chegam à Saúde (% do PIB) são suficientes, daí que o que se justificaria seria essencialmente a reformulação do Sistema de Saúde e da oferta e não do seu financiamento. Considero que os impostos são a melhor forma de financiar o SNS, sendo no entanto necessário garantir equidade e eficácia no seu pagamento. As taxas moderadoras devem ser ajustadas, anual e “automaticamente” em função da evolução do custo dos actos e também, quando o sistema estiver a funcionar normalmente, devem poder ter ajustamento excepcional em situações de procura inapropriada pelo doente.
Assim não haverá opção à racionalização do Sistema e do SNS, sendo de destacar medidas do seguinte teor:

1. Garantir cuidados primários de qualidade e imediatamente acessíveis a toda a população;
2. Ajustar a oferta hospitalar:
Novos hospitais e remodelação/expansão dos que se justificarem, devolução dos restantes aos proprietários (as Câmaras Municipais poderão querer oferecer maior disponibilidade e associar-se a outras entidades para oferecer à população outros cuidados, eventualmente com co-pagamentos);
Garantir qualidade e eficiência em todos os hospitais, diminuindo desse modo a procura/aquisição de actos injustificados (ex. MCDT p/ os quais a capacidade actual é não só suficiente como excedentária!);
Encerrar as urgências e maternidades que já não se justificam e, em geral, cumprir a RRH;
3. Redefinir o âmbito do pacote de cuidados que o SNS garante, alargando substancialmente nos cuidados primários e continuados e limitando a utilização inapropriada de meios sofisticados (ex. hospitais);
4. Continuar o caminho de contratualização exactamente como tem sido efectuado: contratos com entidades públicas (HH EPE e USF/CS) e instituições privadas (sociais) que disponham dos requisitos necessários de qualidade (alargamento progressivo do horizonte temporal);
5. Extinguir a prazo os Subsistemas públicos, fomentando a criação de uma Organização Integrada de Cuidados para todos os funcionários: Estado pagaria uma % fixa anual, os beneficiários contribuiriam de modo a garantir o equilíbrio financeiro da OIC;
6. Continuar as medidas na área difícil do medicamento;
7. Etc., etc...

A agenda sendo essencial é também longa e complexa, daí exigir-se um adequado planeamento e gestão da mudança.
Pela sua importância nacional todos desejamos sucesso pleno ao Sr. MS, o apoio no terreno sem dúvida que lho daremos porque doutro modo é o nosso SNS que ficará em causa!
SemMisericordia

19 Comments:

Blogger xavier said...

Um grupo de profissionais da saúde reunidos em minha casa discutiram vivamente o momento actual da saúde (após as últimas declarações de CC).

No meio da acesa contenda veio à baila este texto do semMisericórdia.

Ultrapassadas algumas divergências e sanadas algumas irritações decidimos por unanimidade adoptar este documento do SemMisericórdia como a posição do SaudeSA face aos últimos acontecimentos da Saúde.

E desejar ao senhor ministro da Saúde o sucesso pleno e garantia do nosso apoio, certos de que esta será a melhor solução para o SNS (trave mestra da nossa democracia).

9:46 da tarde  
Blogger tambemquero said...

É mais difícil governar a Saúde do que governar Portugal.

Devemos atender ao que é essencial.
Implementar mecanismos que tornem exequível a governabilidade da Saúde é absolutamente necessário.

CC é esclarecido e honesto duas condições essenciais para acreditarmos na bondade das suas medidas.

Quanto ao resto cabe-nos abrir o coração e fazermos o melhor que sabemos e pudermos.

9:55 da tarde  
Blogger tonitosa said...

O Saude SA pode tomar o texto do SemMisericordia como sendo a sua posição face aos últimos acontecimentos da Saude.
E percebe-se a "compreensão" perante a posição de CC, uma das "Estrelas da Companhia".
Pessoalmente, confesso, sou mais crítico em relação às medidas apregoadas por CC.
Entendo que em política não vale tudo e não se devem defender posições perfeitamente contraditóriass conforme se está no Governo ou "fora dele". Digo "fora dele" e não na oposição porque por vezes as críticas surgem mesmo contra medidas de colegas/companheiros/camaradas de partido, bastando para tal não se ser titular do cargo.
O que eu gostava de ver era "postadas" neste blog as posições assumidas por aqueles que agora parecem acomodar-se com as declarações de CC. E até seria interessante colocar aqui as posições expressas por CC e outros responsáveis do PS sobre a "diferenciação de taxas" anunciada por LFP, para além de outras medidas, de outros ministros, de outros tempos.
Agora até querem invocar esse facto a seu favor.
O semMisercicordia vem dar uma ajuda, lembrando as posições de Paulo Mendo e de Luís F. Pereira. E diz que como se não está em época pré-eleitoral, CC terá actuado como investigador, soltando-se demasiado e sobrepondo-se ao MS?!
Seja assim, mas CC não deve fazer dos Portugueses parvos. Ele está a dar-se conta da sua incapacidade para lidar com questões nucleares do SNS, sobretudo no que possa por em causa os interesses corporativos instalados.
CC, parece dizer o SemMisericordia, está entre a espada e a parede! Eu lembraria que "quando o mar bate na rocha quem se lixa é o mexilhão"!
Parece mesmo que todos estão contra o MS/CC: os autarcas, os farmacêuticos, os prestadores, os profissionais, a população e repare-se "os politiqueiros". Não eram esses mesmos "politiqueiros" que antes criticavam LFP?!
Quem não está contra o MS/CC são certamente as seguradoras e os prestadores privados que o SemMisericordia se esqueceu(?) de referir. Se os utentes tiverem que pagar do seu bolso as despesas de saúde, não vão deixar de se encontrar utentes dispostos a subscrever seguros.
Pessoalmente, entendo que novos recursos financeiros para a saúde só podem ter justificação depois de esgotadas todas as vias para a melhoria da eficiência do sistema e comprovada a sua eficácia.
O problema está essencialmente do lado das despesas, associado à racionalização na utilização de recursos (humanos e materiais) com especial destaque para o que se passa com a remuneração do trabalho extraordinário nos SU's e a remuneração dos médicos no regime de 42 horas com exclusividade nos HH.
E são os "desperdícios" pelas mais variadas razões, outro dos males principais do sistema.
É preciso, e urgente, acabar com a promiscuidade entre o exercício de funções públicas e privadas. A saúde é dos poucos sectores onde "não é levada a sério" a lei das incompatibilidades; onde os dirigentes num hospital ou centro de saúde desempenham funções em estabelecimentos particulares para onde são encaminhados utentes, cujos processos carecem de autorização/concordância desse mesmo dirigente.

Nas opiniões expressa pelo SemMisericordia, até parece boa a intenção de fazer pagar taxas "agravadas" em situação de procura inapropriada pelo doente. Não será isto exigir ao doente que seja médico de si próprio? Será que alguém pensa que os doentes (bons da cabeça!), têm interesse e prazer em ir a um SU e estar horas à espera de serem observados e vão para lá para passar o tempo?! E quantos doentes vão à Urgência e são enviados para casa com diagnóstico incorrecto (as tais falsas urgências) e quando voltam ao hospital já é tarde?
A solução é criar alternativas de acesso, geradoras de comodidade e confiança, com respostas adequadas e não em longas listas de espera num qualquer Centro de Saúde.
Discordo de uma qualquer redefinição dos cuidados "que o SNS garante" se por tal se entender que cuidados a exigir meios mais sofisticados devam ser reservados a quem pode pagar (penso que não é esse o sentido da referência do Sem Misercicordia). Carece de alguma precisão a noção de "utilização inapropriada de meios sofisticados".
Quanto ao subsistema dos funcionários públicos a solução deve ser no sentido da integração no SNS sendo o Estado, enquanto entidade patronal, chamado a assumir as mesmas responsabiliades que os restantes empregadores.
Há no entanto aqui um aspecto importante que gostaria de salientar: o Estado, enquanto maior empregador do país, tem obrigação de proporcionar aos seus "empregados" o melhor dos subsistemas de apoio na saúde, por referência ao que é garantido por entidades privadas. Não deve nivelar por baixo o sistema de saúde dos seus trabalhadores, ao mesmo tempo que permite a dedução fiscal das despesas dos empregadores privados, com seguros e outros meios, proporcionados aos respectivos trabalhadores, bem acima da "qualidade/acessibiliadde do SNS.
Não posso subscrever o apoio do SemMisercordia ao Sr. Ministro da Saúde no que diga respeito a reduzir o acesso dos utentes a cuidados de saúde. E todas as soluções que caminham no sentido do utilizador-pagador serão sempre medidas restritivas penalizadoras de quem menos pode aceder aos cuidados. E nem sempre o problema, como sabemos, tem a ver com poder económico; os conhecimentos, a posição social, a "cunha" são meios claramente discriminatórios que todos conhecemos.

Subscrevo os votos de sucesso ao Sr. Minsitro da Saúde, mas não no âmbito da aplicação das medidas que anunciou e de muitas das que têm sido tomadas e que já neste blog foram muitas vezes criticadas.
O caminho para o maior envolvimento dos privados na área da saúde não deve ser forçado pela redução do acesso ao SNS.

12:35 da manhã  
Blogger Peliteiro said...

Bem sei que pelas leis da entropia é bem mais fácil destruir que construir.
Correia de Campos nunca conseguiria acabar com o SNS, muito menos encontraria alternativas de remodelação ou reformulação do seu financiamento.

O Ministro tem uma atracção - que lhe pode ser fatal - pela ribalta, pelas luzes do palco.
Nós vamos conhecendo o espécimen e sabemos que estes excessos de protagonismo - que lhe podem ser fatais - visam esconder a incompetência e a inoperância.

Anunciar o fim do SNS - julgava ele - daria conversa, desmentidos, explicações, anda para trás, anda para a frente, entrevistas e comentários para o próximo semestre. Entretanto distraíam-se os pategos e ninguém reparava que a Saúde continua mal em Portugal; muito mal.

Julgo que se enganou. Já ninguém lhe dá crédito. Palhaço!

12:54 da tarde  
Blogger Vladimiro Jorge Silva said...

Tal como já aconteceu no sector do medicamento, CC só consegue controlar os custos quando põe os utentes a pagar directamente pelos bens ou serviços que consomem. A proposta agora apresentada é, por isso, tristemente coerente com outros actos do mesmo autor. Não é aceitável (aliás, até é inconstitucional) que o Ministro da Saúde de um país com um SNS com as características do nosso e cujos gastos em saúde até são superiores aos da média europeia coloque publicamente a hipótese de abdicação em relação à natureza do sistema. O que CC fez foi apenas um acto de show-off da vedeta mediática em que o nosso MS se tornou. E o tom contemporizador do post do SemMisericórdia é por isso lamentável:
- Não devemos desdramatizar o que CC disse (o seu currículo académico e político apenas torna mais preocupantes as suas afirmações);
- CC não está entre a espada e a parede (sobretudo porque, ao contrário da imagem que tem feito passar de si, nada fez para enfrentar a parede dos interesses instalados);
- CC não é um ministro ant-político. Aliás, antes pelo contrário: CC é provavelmente o ministro mais político do actual governo e é sem dúvida aquele que melhor consegue manipular os media e os opinion makers a seu favor;
- Devemos de facto lembrar-nos, não do que disseram Paulo Mendo e LFP, mas do que escreveu o próprio CC a propósito de tais absurdas medidas (aliás, o demérito desta proposta não caberá a LFP, mas principalmente a uma das bojardas mediáticas de Santana Lopes);
- Devemos, de facto, reafirmar que os principais problemas do SNS são de facto a falta de eficácia e de coragem do MS e não a falta de dinheiro.
Acho sinceramente que o Peliteiro, o Guidoblado e o Tonitosa têm razão: CC é um político mediático e mediatista, que gosta do seu papel de estrela e que vive um momento de euforia, excesso de auto-estima e uma profunda vaidade. O que CC quis dizer nem foi sequer que o SNS estava em perigo - o principal aspecto da sua intervenção foi afirmar-se a si próprio como a única alternativa ao caos.

2:09 da tarde  
Blogger tonitosa said...

Ao Xavier,
Com toda a consideração, que é muita, permita-me que diga o seguinte:
Parece-me que o "comité de sábios" (sem ofensa, mas admitindo que se trata de estrelas) reunidos em sua casa não traduz o sentimento da maioria dos comentadores habituais do Saude SA.
Compreendo que, por razões que não podem sequer ser contestadas, alguns colegas pretendam "dourar a pílula" para que "o remédio" de correia de campos se não torne tão amargo.
Eu compreendo que é difícil ao Saude SA assumir-se como um blog "crítico" do actual Ministro da Saúde, pelo seu passado de grande defensor do PS em período de campanha eleitoral. É difícil ao Saude SA criticar CC quando os AH's conotados com o "poder" (que não os outros) vão sendo colocados aqui e acolá em lugares pelos quais há muito lutam.
Mas o saude SA, por vontade do Xavier, é um lugar de debate aberto e como tal não me parece coerente que assuma posições "oficiais" face a medidas do Governo. Como se verifica pelas opiniões até agora expressas, o texto do SemMisericordia, independentemente da qualidade analítica nele contida, não merce acordo da maioria, antes pelo contrário.
Desde sempre aqui no Saude SA vi defender acerrimamente o SNS contra a entrega a privados. Muitas foram as críticas aos projectos PPP por na opinião dos seus sutors uma tal solução representar o caminho para a privatização da Saude. As medidas apontadas por CC, fazendo pagar aos utentes os cuidados de saúde nos termos anunciados, são um forte contributo (talvez o maior até agora enunciado) para que a oferta dos privados encontre terreno fértil para os seus "negócios" limitando-se o Estado so seu papel de Estado-mínimo (nesta área).
Como pode essa política ser apoiada, de forma mais ou menos encapotada, pelo Saude SA?
Assim, Xavier, parece-me precipitada a decisão de assumir o comentário em causa como a "posição do Saude SA" face aos últimos acontecimentos da Saúde.
Um abraço.
PS.: estou tão à vontade para ter esta opinião quanto tenho expresso, frequentemente, maior abertura ao papel dos privados do que muitos dos colegas. E acho que a opção por subsistemas privados deve ser voluntária.

5:18 da tarde  
Blogger ricardo said...

Evidentemente que é muito mais fácil alimentar uma conversa de café do género "público" versus "privado" do que mudar a sério as regras do jogo. Foi isso que o ministro da Saúde fez.
As duas coisas. Questionou as regras do jogo, ao propor que os portugueses passem a pagar os cuidados de saúde em função dos seus rendimentos. E fez isso em conversa de café, o que leva Correia de Campos a passar de ministro competente a político leviano.
Santana Lopes governava assim: lançava primeiro as bombas em público (chegou, aliás, a sugerir também esta "diferenciação" das taxas moderadoras), para depois recuar.
O Governo felizmente mudou. Mas há ministros que não aprendem. Correia de Campos agora diz que estava a falar num cenário sobre o modelo de financiamento da saúde. Tal como Freitas do Amaral já defendeu "opiniões pessoais" em assuntos de política externa.
Sucede que o ministro da Saúde não é um comentador da política de saúde, mas o seu principal actor. E deveria saber que o assunto é demasiado sensível para ser lançado num seminário.
Sérgio Figueiredo, JN 20.02.06

5:23 da tarde  
Blogger xavier said...

A minha opinião sobre esta matéria está expressa em três posts .

O post do semMisericórdia e as conclusões do debate efectuado em minha casa convergiram no reconhecimento de que é necessário assumir uma atitude positiva, como inúmeras vezes tenho visto o tonitosa defender aqui na SaudeSA, acertadamente.

A situação da nossa Saúde é tão grave que requer o esforço, o empenhamento de todos nós - refiro-me, evidentemente, aqueles que gostam da Saúde e lutam para que o SNS sobreviva se desenvolva e melhore a qualidade.

Este difícil processo requer um envolvimento efectivo daqueles que entendam que chegou a hora de pôr mãos à obra, de sacrificar um pouco do nosso ego, de avançar mesmo que não se concorde com tudo o que está em jogo (como acontece connosco em tantas outras situações da vida), tentando assim contribuir de forma efectiva para que as coisas melhorem (se salvem).
Eterno comentador de bancada não chega.

É este esforço que estamos a tentar fazer.

6:04 da tarde  
Blogger Clara said...

Reconheço que a intervenção de CC foi extremamente desastrada.

Muita gente ficou contente com o anúncio do fim do SNS.

Outros censuram o ministro porque em vez de avançar limita-se a mandar bocas para a assistência.

Não gostamos de ver CC fazer estas figuras.

Não gostamos de ver CC a promover a liquidação do SNS.

Confiamos que CC é capaz de levar a pesada nau da Saúde a bom porto.

Queremos expressar ao ministro da Saúde todo o nosso apoio e desejar-lhe as maiores êxitos na governação da Saúde.

6:18 da tarde  
Blogger Vladimiro Jorge Silva said...

Concordo com a necessidade de se manter uma postura construtiva. Percebo o esforço (hercúleo!) do Xavier e do SemMisericórdia para dissecarem algo de bom nas políticas de CC - eu próprio já me desiludi com alguns políticos em que acreditava. No entanto, as bocas de CC na tal "conversa de café" têm implicações demasiado graves para eventuais contemporizações. Deixemos a manteiga para mais tarde, pois os tempos não estão para meias palavras: a ideia foi apresentada de uma forma muito mais estruturada do que por exemplo eram as "bombas" (aliás, as bombocas) de Santana. CC pensou claramente no que disse e disse-o para avaliar reacções. Mesmo quando se sabe que o principal objectivo deste acto foi a alimentação do seu aparentemente insaciável ego, CC demonstrou algo que todos já sabíamos: o actual MS é perigoso para o SNS.
É impressionante a nossa capacidade de nos surpreendermos com aquilo de que estávamos à espera!

7:55 da tarde  
Blogger xavier said...

Aos colegas do SaudeSA para desdramatizar.

O SaudeSA é de todos os que aqui colaboram, debatem e lançam novas ideias.

Neste sentido quero rectificar a minha anterior declaração.

Em nome do grupo de amigos que reuniu em minha casa à conversa sobre os problemas da saúde, declaro o nosso apoio ao texto do SemMisericórdia, o qual, no nosso entender, expressa de forma exemplar o que entendemos ser a nossa posição correcta face às últimas infelizes declarações do nosso ministro da saúde.

Entendemos ainda que, faça CC o que fizer no exercício das suas dificeis funções, por mais erros que cometa, deve merecer de todos nós o maior respeito.
Um abraço ao tonitosa e a todos os colegas comentadores

11:42 da tarde  
Blogger tonitosa said...

Xavier
Começo por transcrever uma passagem que me parece importante no meu anterior comentário: "...As medidas apontadas por CC, fazendo pagar aos utentes os cuidados de saúde nos termos anunciados, são um forte contributo (talvez o maior até agora enunciado) para que a oferta dos privados encontre terreno fértil para os seus "negócios" limitando-se o Estado so seu papel de Estado-mínimo (nesta área).
Como pode essa política ser apoiada, de forma mais ou menos encapotada, pelo Saude SA?"

É isto, caro Xavier, que me parece fundamantal. A posição do Saude SA (na sequência do debate em sua casa) aceitando o texto do SemMisericordia na sua plenitude (sem reservas), contém um apoio (ou se quiser condescendência) às medidas anunciadas por CC que me parecem gravosas para a continuidade de um SNS de acesso universal e tendencialmente gratuito. Ou seja, essas medidas serão o primeiro passo para o fim do SNS. E tem sido contra esse "fim" que aqui no Saude SA têm sido assumidas posições de quase unanimidade.
Xavier, certamente todos temos bem presentes "ferozes ataques" neste blog a "alguns indícios" de medidas favorecedoras da privatização da Saúde porque isso será (ao mesmo tempo) o fim do SNS.

É isto que para mim está em causa. As mediads de CC são contra a existência do SNS e não (em minha opinião) para defender o SNS (tal como está consagrado na nossa legislação).
Tais medidas são bem mais gravosas do que outras aqui criticadas, de forma por vezes violenta contra o próprio MS.
Não importa vir dizer que estamos a fazer futurologia porque o futuro, como sabemos, começa amanhã.
Concordo consigo que é preciso assumir uma atitude positiva, como eu próprio o tenho feito. Mas essa atitude não passa por apoiarmos o discurso de CC objecto deste debate.
Pode vir dizer-se que "foram recados aos generais e aos coronéis" e sincermante também aqui me parece que CC mão foi feliz. Talvez tenha tentado tapar o sol com a peneira. Mas os generais e os coronéis precisam de receber "recados" do seu Chefe de Estado Maior transmitidos numa sessão pública?!
Dir-se-á agora que serão meras hipóteses de trabalho, com soluções que só serão necessárias "se nada se fizer". Mas não é para fazer "coisas" que existe uma equipa dirigente no MS e equipas de nível superior e intermédio nos HH e CS?
Na verdade, se nada se fizer, pouco tempo de vida nos resta!

E na verdade, Xavier, parece-me que este espírito crítico às medidas "em construção" pelo Ministério da Saúde, tem sido no Saude SA assumido maioritariamente.

12:47 da manhã  
Blogger tonitosa said...

Xavier,
A sua posição em nada me surpreende. Certamente estava a escrever o meu comentário anterior enquanto você colocava esta nota de desdramatização. Por isso volto ao assunto.
Terei, porventura feito algumas afirmações mais fortes no meu 2º comentário mas sem intenção de ofender quem quer que seja. Talvez mais uma daquelas reacções em defesa do Saude SA.
Nada a opor a que "um grupo" declare o seu apoio ao texto do SemMisericórdia.
Respeito por CC como pessoa, é-lhe devido e a todos os cidadãos. Como governante, as medidas que tomar poderão levar-nos a ter que fazer um grande exercício intelectual em torno do que se deva entender por "respeito", sempre sem ofensas e sem prejuízo de admitirmos que as medidas que toma comportam a melhor das intenções.
Com "respeito" lhe devemos dizer que "faça o que fizer"...desde que faça bem...

1:13 da manhã  
Blogger tonitosa said...

Amigo SemMisericordia
Na verdade o seu texto inicial, centro deste debate, comporta dois pontos de vista perfeitamente distintos. O primeiro de compreensão, de condescendência, para com as medidas apontadas por Correia de Campos, "desdramatizando" e "lembrando"...para poder dizer ao Senhor Minsitro da Saúde que se lhe dá o benefício da dúvida ora como Ministro (anti-político) ora como Investigador/Estudioso/Perito.
E até se percebe, em seu entender, que estando entre a espada e a parede, o Senhor Misnistro possa "não saber bem o que fazer à vida" (digo eu). O segundo ponto de vista é o de "reafirmar" o que segundo a sua análise se justifica fazer.

E é isso que explica afinal os meus comentários ao texto produzido. Na verdade, também o meu primeiro comentário (e o segundo não é contraditório) apresenta duas partes. A primeira de discordância quanto ao que entendo ser o apoio (mais ou menos assumido) a CC e às medidas por ele "propostas" como possível solução para o SNS. (Qual SNS, pergunto eu?), mas também de compreensão por esse apoio face à "relação" que liga CC aos AH's.

A segunda parte do mesmo comentário, assumindo uma posição que é mais de concordância com a generalidade das suas "reafirmações" (medidas que propõe). E por isso eu próprio faço uma reflexão coincidente com algumas das sua propostas. Quem pode discordar da necessidade de racionalização, de garantia e melhoria da acessibilidade a cuidados primários de qualidade, de medidas de melhoria da eficácia e eficiência nos HH, etc.?
Acho que são matérias em que todos (ou quase todos) estamos de acordo.
Eu, porém, não aceito um SNS porcionista à CC. Nem aceito o Estado-mínimo, que como diz foi por mim trazido ao debate no Saude SA, mas também se recorda que tive ocasião de dizer, na altura, que não era defensor desse "novo modelo".
A sua referência ao encerramento de urgências e maternidades que já não se justificam, assim como a redefinição do âmbito do pacote de cuidados que o SNS garante, alargando substancialmente nos cuidados primários e continuados e limitando a utilização inapropriada de meios sofisticados, podem ir no sentido de redução do acesso dos utentes ao SNS. E é essa "tentação" (não sua certamente) que pode ser "perigosa". Com a não-redução obviamente que estamos de acordo.
Já quanto ao sua proposta de uma Organização Integrada de Cuidados, penso que as nossas posições são divergentes apenas porque não lhe damos o mesmo sentido. O SemMisericordia parece-me referir-se a "subsistemas públicos" (várias ADSE's e outros) e defende a sua aglutinação num único subsistema (OIC). A minha abordagem é feita no sentido de que não haverá razão para que os funcionários públicos tenham um sistema próprio fora do SNS. Como sabemos hoje a ADSE permite uma maior liberdade de escolha aos beneficiários e isso pode acabar. Mas...e aqui pode parecer haver alguma contradição (que espero fique afastada) o que eu defendo é que, se a ADSE acabar, o Estado, como grande (maior) empregador tem o dever de proporcionar aos seus trabalhadores "facilidades" (por exemplo seguros) que outras grandes empresas proporcionam aos que nelas trabalham.
Como em tempo defendi, é minha opinião que a ADSE é mais vantajosa para os trabalhadores da função pública (possivelmente com maiores custos para os mesmos) e não se deve nivelar por baixo.

Em conclusão, SemMisericordia,
Estou de acordo com grande parte das medidas que aponta. Não estou de acordo com o apoio (compreensão ou aplauso, mesmo a prazo) das medidas (novas?) de Correia de Campos.
É que, quando lá chegarmos estaremos exactamente a limitar o acesso aos cuidados de saúde. Os ricos não terão problemas porque podem pagar, e possivelmente recorrem aos prestadores privados; os outros (classe média incluída) ficarão dependentes de um SNS(?) que será cada vez pior.
Um abraço

2:23 da manhã  
Blogger xavier said...

Caro tonitosa,
Achei o seu texto correcto sem quaisquer ofensas a quem quer que fosse.
Um abraço

9:25 da manhã  
Blogger ricardo said...

Parece haver aqui um equívoco.
Uma coisa é a nossa posição sobre determinada matéria, aquilo que achamos mais correcto e defendemos.
Outra coisa é não admitir que determinado tema seja debatido. Por preconceito ou porque não merece à partida a nossa concordância.

Não concordo que haja assuntos tabus. Que estejam interditos à partida à discussão.

Chegou a altura de debater a questão do Financiamento do Serviço Nacional de Saúde.

Os senhores da Comissão Europeia aí estão a exigir mais sacrifícios a Portugal que se traduzirão, inevitavelmente, em novos cortes na Segurança Social e na Saúde.
Para fazer face ao crescimento da despesa da Saúde (inevitável por melhor que seja a sua gestão)não podemos contar com mais verbas do PIB.
Como resolver o problema ?
Fingir que nada se passa e deixar morrer o SNS de morte natural ?
Aumentar e diferenciar as taxas moderadoras?
E resolve ?

Concluindo:
Há que procurar soluções. Tudo fazer para não deixar morrer o SNS.
As alternativas são muito limitadas.
Concordo com o texto do SemMisericórdia porque a sua análise vai no sentido da procura de soluções eficazes para tratar dos males de que enferma o nosso SNS.

10:01 da manhã  
Blogger helena said...

Enquanto houver auto-estradas em regime de SCUT ou ocupação gratuita de espaço público para fins privados (...), é pelo menos indecente a ideia de fazer pagar os cuidados de saúde."
Vital Moreira, JP 21.02.06

10:20 da manhã  
Blogger xavier said...

Correia de Campos agiu bem e mal quando, na sexta-feira, resolveu abanar o sector da saúde português.
Agiu bem: é preciso discutir o financiamento do sector, ponto final.
Agiu mal: lançar este assunto como arma de arremesso contra a má gestão hospitalar é olhar o assunto como castigo da má gestão – mas dizendo que a multa será paga pelos doentes em nome dos gestores. Mas o assunto é sério, e merece raciocínio sério.
Primeiro: Não é novidade que o ministro Correia de Campos acredita na liberalização do sistema de saúde. Menos Estado, mais privados. Apesar de a Constituição afirmar que a saúde é tendencialmente gratuita, o próprio Governo já se mostrou disponível para discutir a validade do texto constitucional no tempos de hoje.
Martim Figueiredo, DE 21.02.06

11:53 da manhã  
Blogger tonitosa said...

Correia de Campos, depois das críticas que fez ao seu antecessor e ao modelo SA de gestão hospitalar;
Correia de Campos, depois de ter transformado os HH SA's em EPE's segundo o modelo por si considerado apropriado à melhor gestão dos HH;
Correia de Campos, depois de ter nomeado os "melhores" gestores da sua confiança;
Correia de Campos depois de ter promovido várias e diversas alterações na estrutura orgânica da Saúde;
Correia de Campos depois de todos os estudos que mandou realizar na procura das melhores soluções para a área da Saúde;

Correia de Campos, depois de tudo isto, não pode usar armas de arremesso contra ninguém antes de as apontar a si próprio e aos seus Secretários de Estado.
Depois de tudo isto CC não tem desculpas, não pode fazer pagar aos utentes a "multa da má gestão hospitalar" aos utentes.
Os problemas da Saúde, e nomeadamente os financeiros, não se confinam à gestão dos Hospitais.

Há uma clara e indesmentível falta de coragem para alterar aspectos fundamentias na gestão da Saúde. Há uma evidente falta de coragem para mexer com muitos interesses instalados no interior do próprio Sistema. Correia de Campos sabe bem que dificilmente se conseguem mudanças de comportamentos há muito "cristalizados" e sabe que geralmente as tentativas de mudança nesses domínios fazem "rolar" a cabeça do Ministro. Mas então que o diga claramente. Que diga quem são os "generais" e os "coronéis" para que possa contar com as "tropas" e fazer a "revolução". Pois de "revolução" se trata.

12:34 da tarde  

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