quarta-feira, fevereiro 15

Painel Indicadores USF


Breve Análise:
No sítio (link) da Missão para os Cuidados de Saúde Primários (UMCSP) estão disponíveis uma série de documentos que se encontram em audição pública, entre os quais um Painel de Indicadores cuja finalidade é “Avaliar e Monitorizar o desempenho das USF, permitir a contratualização e a retribuição dos profissionais e a gestão clínica e organizacional”, sendo referido também um conjunto de dimensões a avaliar.
1. O que é que deve ser monitorizado/avaliado neste âmbito ?
Uma USF estará inserida num determinado Centro de Saúde e será constituída por diferentes profissionais que receberão uma determinada retribuição e incentivos individuais (quando existam). Para além disto estabelecerá uma relação contratual com uma Agência de Contratualização. No Contrato serão definidos, entre outros, os elementos que regem o Financiamento e os Incentivos Institucionais respeitantes a essa USF. Deste modo deverão ser primeiramente definidos indicadores directamente relacionados com o Contrato, de tal forma que permitam monitorizar/avaliar a execução do mesmo em tempo útil (i.e., que forneçam informação atempadamente para que se possa agir sobre a realidade e corrigir eventuais desvios). Assim, defendemos que por regra estes indicadores deveriam ter periodicidade mensal e ser acumuláveis para os períodos seguintes, ao mesmo tempo que deveriam ter associadas metas (valores de referência) para comparação com o efectivamente realizado.
Não significa isto que a realidade interna da USF deve ser descurada. Muito pelo contrário, deveriam ser estabelecidos um conjunto de indicadores que constituiriam o mínimo denominador comum para possibilitar comparações entre as USF, ao mesmo tempo que se promoveria o estabelecimento de metas internas (baseadas em períodos anteriores, em normas da DGS ou de outra entidade, nas melhores práticas, etc.).
Por fim também deveriam ser estabelecidos indicadores relacionados com a inserção da USF na rede de prestação de cuidados.
Parece-nos que estas questões não estão devidamente tratadas no documento apresentado.

2. Dimensões a avaliar
Tendo em conta as dimensões a avaliar, podemos constatar que há uma descontinuidade entre as dimensões propostas no Despacho Normativo do Gabinete do Ministro da Saúde, que aguarda publicação no Diário da República e está disponível no sitio da Missão, e as dimensões apresentadas neste documento, nomeadamente:
· A Disponibilidade e a Satisfação dos Profissionais não estão incluídas neste documento;
· A avaliação da Qualidade Técnico-científica que era referida no Despacho, passou a englobar apenas a Qualidade de Prescrição e o Registo Clínico (este último não nos parece de modo algum uma dimensão!) o que claramente é insuficiente e limitativo para uma boa análise da Qualidade;
· Foram criadas novas dimensões: a Qualidade da prescrição, o Registo clínico (que, tal como referido, em conjunto substituíram a Qualidade Técnico-científica), a Continuidade e a Referenciação. Esta última parece-nos ser um elemento da Continuidade pelo que não fará sentido avaliá-la isoladamente.
Fazendo uma análise apenas a este documento e ainda no seguimento do que foi dito anteriormente, consideramos que as dimensões não estão devidamente clarificadas e que algumas delas poderiam ter sido agregadas. Há ainda dificuldade em identificar facilmente qual a dimensão que cada indicador pretende avaliar, parecendo-nos que houve algumas dimensões que não foram completamente abordadas em termos de indicadores, existindo mesmo uma em que não conseguimos encontrar qualquer indicador potencialmente enquadrado nessa dimensão (veja-se o caso do registo Clínico).

3. Indicadores apresentados
Relativamente aos indicadores apresentados, existem alguns erros que se repetem ao longo deste painel e são os seguintes:
· Pensamos que existe alguma confusão de conceitos como taxa, percentagem e rácio. Assim, por exemplo, o indicador “Taxa de consultas de enfermagem programadas” da forma que se apresenta, mais não é do que a “Percentagem de consultas de enfermagem programadas”;
· A expressão (X 100) aparece sempre no denominador de cada indicador que se refere a percentagem, quando o correcto seria aparecer no numerador;
· No indicador “Nº de visitas domiciliárias médicas por 1000 inscritos” temos como numerador “Nº total de visitas domiciliárias médicas” e como denominador “1000 inscritos” quando o correcto seria no numerador “Nº total de visitas domiciliárias médicas X 1000” e no denominador “Nº total de inscritos”. O mesmo se passa relativamente ao indicador “Nº de visitas domiciliárias de enfermagem por 1000 inscritos”;
· A própria denominação de alguns indicadores é demasiado extensa e por isso mesmo pouco clara. Por exemplo o indicador “% de intervenções de enfermagem realizadas do tipo vigiar/monitorizar relativamente ao total de intervenções de enfermagem realizadas” podia ser substituído pela expressão “% da monitorização no total de intervenções de enfermagem”;
Para além deste tipo de erros mais genéricos vamos também fazer referência a alguns aspectos mais pontuais que pensamos ser importante corrigir:
· Os indicadores demográficos que se apresentam logo no início do painel, como é o caso da “Pirâmide etária dos utentes inscritos na USF”, não permitem actuar sobre a realidade que eles representam. Ao contrário, seria interessante apresentar um indicador que comparasse a estrutura etária dos utentes inscritos na USF com a da sua população alvo. Este facto poderia ainda facilitar a observação de uma eventual selecção adversa por parte da USF;
· Ainda no que se refere à estrutura etária deveria haver um esforço para garantir alguma coerência dos grupos etários ao longo do painel. Isto não se verifica no caso concreto dos jovens. Estes aparecem representados em determinados indicadores dos 0 – 14 anos e em outros dos 0 – 18 anos;
· O indicador “Obtenção de consultas de iniciativa do utente no prazo de: até 5 dias e superior a 5 dias” para além de se tratar de uma taxa, deveria ser desagregado por tipo de consultas (pelos menos em consultas programadas / não programadas, até 24h, até 48h e até 5 dias);
· No indicador “% de consultas, de iniciativa dos utentes, marcadas pelo telefone”, o que é relevante é a deslocação (ou não) do utente à USF, pelo que o mais correcto seria dizer “% de consultas, de iniciativa dos utentes, marcadas sem a sua deslocação à USF”;
· No indicador “% de consultas de intersubstituição” o numerador deveria ser “Nº de consultas não efectuadas pelo próprio, à sua lista” e não “Nº de consultas efectuadas pelo próprio, à sua lista”;
· No indicador “Produtividade global por médico” o denominador não deveria ser “44 semanas” mas sim “Nº de horas (efectivamente) trabalhadas”. Por outro lado poder-se-ia acrescentar um indicador de eficiência que teria como denominador o “Nº horas previstas”;
· Pensamos que os indicadores relativos às doenças crónicas não se deveriam limitar a doentes diabéticos e hipertensos;
· O indicador “Custo médio do medicamento por consulta” deveria ser desagregado por tipo de consulta. O mesmo se passa com o indicador “Custo médio do medicamento por utilizador” que deveria ser desagregado por grupos relevantes de utilizadores;
· O indicador “Taxa de prescrição de quinolonas” apresenta um numerador idêntico ao denominador pelo que estará certamente mal identificado;
· Por fim, o indicador “Avaliação anual do grau de satisfação dos utilizadores da USF, de acordo com áreas a definir” deveria ter uma unidade de observação ao nível do médico e não apenas ao nível do sector profissional e da USF.

4. Recomendações
· Para tornar os indicadores mais claros era fundamental a existência de um glossário de conceitos já que alguns conceitos usados nos indicadores são geradores de confusão e dificultam a sua compreensão (o que se entende por contactos indirectos? O que são
atendimentos / contactos / tratamentos / intervenções de enfermagem?.....)
· Parece-nos que a estrutura dos indicadores poderia ser reformulada designadamente, a clarificação de cada uma das dimensões objecto de avaliação e descrição dos respectivos indicadores. Por outro lado, para determinadas áreas de avaliação poderia efectuar-se uma decomposição do indicador em global e específico. Por exemplo a análise da percentagem de consultas programadas poderia ser feita da seguinte forma: % de consultas programadas no total de consultas (indicador global); % de consultas programadas por grupo profissional (médicos/ enfermeiros), por ETC, por tipo de doentes (jovens/adultos/ idosos, crónicos) (indicadores específicos). A mesma desagregação (global/especifico) justificar-se-ia relativamente ao indicador de % de intervenções de enfermagem (global e por tipo de intervenção). Seria interessante que para cada indicador fosse criado o seu “boletim de identidade”, considerando-se, para além, da designação, fórmula, unidade de observação (âmbito) e periodicidade, a dimensão destinatários, explicação do seu racional.
· Ao conjunto de indicadores descritos poder-se-ia acrescentar outros indicadores nomeadamente em áreas pouco exploradas no documento, como seja a qualidade e continuidade. No que respeita à qualidade seria interessante a pontuação no “moniquor”, a definição de politicas e sua especificação em procedimentos, bem como a criação de indicadores como % de processos clínicos completos, % de concordância com normas existentes, % de cumprimento de directivas. Quanto à continuidade poderiam considerar como indicadores a % de altas comunicadas que tiveram seguimento nas UFS, % de hospitais e meios de diagnóstico com acordos escritos (referenciação, cooperação, …), protocolos existentes e a funcionar nas (USF e protocolos conjuntos com o SNS).
· A eficácia não aparece tratada pelo que seria importante considerar indicadores do tipo % de consultas realizadas face às programadas; % dos resultados face aos objectivos; % de falecidos; % de morbilidade; % de acamados, % de pessoas que compreendem e seguem as mensagens. No que respeita à análise de custos unitários seria relevante a consideração de um indicador global - custo de pessoal por consulta – e a sua decomposição por grupo profissional – médicos ( ETC), Enfermeiros (ETC), e outro pessoal (ETC).
Os Elmapena

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13 Comments:

Blogger helena said...

Parabéns aos Elmapena
Trata-se efectivamente de um trabalho de elevado nível só acessível a gestores seniores.
Do ponto de vista da profundidade da análise a fazer lembrar os trabalhos do SemMisericórdia.

São trabalhos desta qualidade que dão prestígio aos AH.

9:55 da tarde  
Blogger ricardo said...

Os autores de trabalhos desta qualidade mereciam ser conhecidos por todos os bloggers e profissionais da Saúde.

9:25 da manhã  
Blogger Xico do Canto said...

Os Elpamena deste País terão de ter paciência com estas novas vagas de "missionários", alguns "missionários e paraquedistas", que julgam ter descoberto a pólvora seca.
Deixá-los poisar, que acabam por bater à porta de quem dá provas do seu saber. Por vezes demora.
Para quem tem a humildade e necessidade de continuar a aprender (quando não se sabe pergunta-se)e sobre a conceptologia denunciada sugiro, à falta de melhor, duas fontes informativas:
a) - Glossário da DGS - contacto Dr J. Giria - jgiria@dgsaude.min-saude.pt;
b)- INE - www.conceitos.ine.pt, onde se encontram 271 conceitos de saúde.
E a caravana passa....

9:39 da manhã  
Blogger ABS said...

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10:45 da manhã  
Blogger ABS said...

Aos Elmapena: muito obrigado pelos comentários. Já estão na MCSP e vão ser usados extensivamente. Só uma nota: o factor 100 no denominador foi evidentemente uma daquelas gralhas de tal tamanho que passou debaixo do nariz de todos!

Ao Xico do Canto: a "nova vaga de pára-quedistas" de que fala têm um nome, um currículo e provas dadas. Têm ainda a cara, o e-mail e o telefone de cada um deles no sítio da Missão. E colocaram os documentos em discussão pública porque têm a consciência de não serem detentores de nenhuma verdade e considerarem que todos os contributos são bem vindos. Portanto, meu caro Xico, antes de cuspir para ar use um pouco da humildade que propõe, e que subscrevo, e informe-se primeiro.

Armando Brito de Sá
Membro da MCSP

10:55 da manhã  
Blogger Xico do Canto said...

A carapuça só serve a quem a usa e não será,certamente, ao Prof. Doutor Armando Silva Brito a quem peço que não se sinta ofendido, tal como à sua equipa.
A "boca" aparece no contexto bloguista e tem mais a ver com práticas passadas.
Bom sucesso para o vosso trabalho.

11:42 da manhã  
Blogger xavier said...

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12:01 da tarde  
Blogger Clara said...

Este comentário foi removido por um gestor do blogue.

10:05 da tarde  
Blogger tonitosa said...

Li, logo no dia em que foi colocado no blog, o trabalho d'os Elmapena. Gostei e cheguei a escrever um breve comentário mas, por falta de convicção forte naquilo que tinha escrito, não cheguei a colocá-lo.
E surpreenderam-me alguns erros assinalados que "ou eram de ignorância" ou eram "meros lapsos". Erros esses reconhecidos por ABS e tidos como gralhas.
Só hoje (agora já dia 17) voltei ao assunto. Um pouco mais disponível para reler o trabalho dos Elmapena e depois de ter percorrido o Painel de Indicadores posto à discussão pela UMCSP.
Acho que qualquer trabalho de avaliação do desempenho das USF deve ter presente que se pretende, antes de mais, que aquela unidades se contituam como "núcleos autónomos" agregando profissionais que terão a seu cargo um determinado grupo de indivíduos e famílias, no âmbito da prestação de cuidados de saúde primários. Como dizem os Elmapena: "uma USF estrá inserida num determinado Centro de Saúde...; estabelecerá uma relação contratual com uma Agência de Contratualização".
Resulta claro que a primeira questão que se coloca é a de uma adequada definição dos termos e condições contratuais e do cumprimento do respoectivo contrato.
Esse contrato deve ser enquadrado nos objectivos do SNS e ter especial atenção a melhoria da qualidade dos serviços. Deve obrigar os profissionias envolvidos a observarem critérios de eficácia e eficiência sob pena de não cumprirem o respectivo contrato. E se o contrato contemplar uma remuneração (RRE) que engloba "incentivos individuais" deverá também prever "penalizações" para o eventual não cumprimento de objectivos por razões imputáveis à USF.
Tudo se situará no âmbito contratual e na sua monitorização.
Aliás os Elmapena fazem de modo perfeito este enquadramento.
E deverão os objectivos ser ajustados em função dos resultados e de novos parâmetros a ter em consideração. A envolvente interna e externa de cada USF não permitirá por outro lado um "padrão único" no tempo e no espaço, exigindo uma permanente avalição crítica dos resultados com a participação dos respectivos responsáveis.
Dito isto, e subscrevendo as referências positivas ao trabalho dos Elmapena, deixo aqui as seguintes observações:
Não me parece adequada uma intervenção desmesurada na USF no que se refere à sua organização, regras e métodos de trabalho. Devem os profissionais envolvidos ter autonomia bastante para, em cada momento, tomarem as decisões que julguem mais adequadas. O seu trabalho deve ser avaliado em função dos resultados alcançados face aos objectivos contratualmente estabelecidos.
E como é claro, essa avaliação passa por aplicação de indicadores como a generalidade dos que são apresentados.
Fico com a ideia de que alguns indicadores são focados no desempenho individual e parece-me que "essa avaliação" é muito mais um "problema da "equipa" e de quem a dirige (se uns fazem menos, alguém vai ter que fazer o seu trabalho e o dos outros) e cabe aos dirigentes (coordenadores da equipa) propor ou tomas medidas adequadas, como por exemplo, a saíde do grupo de determinado elemento.
Os indicadores que visam medir o custo com medicamentos por consulta ou por utilizador podem ser enganadores. Custos mais elevados com medicamentos por consulta ou por utilizador não significam, por si, só maior despesa em saúde. A eficácia terá aqui uma palavra a dizer. E às vezes as "experimentações" têm custos elevados.
Há também alguns indicadores sugeridos que ou não se aplicam ou terão pouco a ver com a USF como serão os casos: "% de morbilidade", "% de falecidos" e "% de acamados".
E a valiação da USF não pode ser feita sem ter presente o desempenho dos HH para onde os utentes são encaminhados.
Tal como noutros momentos tenho referido, julgo deve ser seleccionada a informação importante para que possa ser útil. De nada vale ter muita informação se não formos capazes de dela fazer o adquado uso.

1:29 da manhã  
Blogger saudepe said...

Parabéns aos Elmapena pela qualidade e oportunidade do trabalho postado na SaudeSA.

Desde e doutros trabalhos aqui postado retira-se a conclusão sobre a qualidade do trabalho dos Administradores Hospitalares e a mais valia que eles representam para o nosso Sistema de Saúde.

9:37 da manhã  
Blogger Peliteiro said...

Nunca tive dúvidas que temos AH de grande competência.
Admiro-os desde há muito.
Admiro-os ainda mais pela paciência que necessitam para aturar controleiros políticos armados em gestores.


PS- Clara esqueceu-se dos Farmacêuticos :-)

1:12 da tarde  
Blogger tonitosa said...

"Quando a esmola é grande o pobre desconfia".
Já escrevi isto n vezes no contexto de outros temas colocados no blog. E tem aqui cabimento repeti-lo.
Que diabo, tantos elogios e auto-elogios acho que é exagero.
O trabalho dos Elmapena, e outros que aqui foram apresentados, merecem o nosso apreço mas daí até aos elogios generalizados, (do género: SOMOS OS MAIORES) é capaz de ser exagero.
Há bons e menos bons técnicos e todos os participantes no blog mercem a nossa admiração e o nosso respeito (mesmo quando estejamois em frontal desacordo) mas ... "presunção e água benta cada um toma a que quer".
Sinceramente o digo: faço este comentário para que quem acede ao Saude SA, e lê o que aqui se escreve, não pense que estamos aqui para nos pormos em bicos-de-pés pretendendo ser melhores do que os outros.
O Saude SA é (deve ser) tudo menos isso.
Tenho a certeza de que a maioria de nós tem opiniões válidas (uma mais outras menos) sobre os problemas que se colocam na área da saúde (e não só) e isso me basta. Se entrarmos no elogio permanente talvez percamos alguma credibilidade.
Desculpem a frontalidade.
Um abraço a todos

11:39 da tarde  
Blogger Clara said...

O MSP tem toda a razão:

Excelente trabalho. Parabéns ao Elmapena.
Mais uma prova da grande qualidade dos Administradores Hospitalares.
Este país tem profissionais de grande qualidade.
Na Saúde temos do melhor que há na UE: Médicos, Farmacêuticos, Enfermeiros, Técnicos, Administradores Hospitalares.

1:24 da manhã  

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