domingo, fevereiro 10

A reforma em curso


1. A reforma do SNS em curso ou em estado crítico?

Só o futuro dirá se a reforma do SNS continua em curso ou se ficou ferida de morte com a remodelação do MS e com a explicitada mensagem de abrandar que o PM lhe colou. A impressão que fica, bem evidenciada no comentário de Henrique Monteiro no Expresso (link), trazido ao Saudesa por Tambemquero – comentário que, para mim, é o mais lúcido de quantos li na apresentação das razões que levaram à substituição do MS –, é que, se o golpe não foi mortal, outro será vibrado se e quando se afigurar necessário à mão que desferiu o primeiro. Por quê? Porque é previsível que persistirão as razões acolhidas na decisão agora tomada e porque, estando aberto o caminho, o mais fácil será seguir por ele. JS esqueceu-se de que a maior parte do seu capital político (costumam chamar-lhe credibilidade) lhe vinha da imagem que transmitia, de firmeza derivada de fidelidade a princípios, da não cedência a oportunismos, e não do suporte(?) das forças às quais agora cedeu. Esqueceu-se também de que – há cerca de 15 anos – as legislativas foram ganhas com maioria absoluta por quem, na semana que precedeu o acto eleitoral, procedeu ao aumento do preço dos combustíveis, sendo que esse aumento poderia bem esperar mais dez ou quinze dias. Não queria ganhar? Só queria; mas apercebeu-se de que a mensagem que passava ao não adiar o aumento ajudaria mais no propósito que tinha do que a ameaça de um aumento temido como inevitável, embora ainda não consumado. Para manter a imagem que cultivara, (de fazer porque não havia alternativa e por isso tinha que ser feito, mesmo que com sofrimento), o dilema que se apresentava a JS era i) prosseguir na linha da razão ou, se a gravidade da situação o impusesse, mas nem sequer impunha, ii) apresentar a sua própria renúncia, não a do MS, que, a final, era apenas (não se conhecem reticências) o executor da política do Governo na área da Saúde. No uso dos seus poderes, o PM escolheu por onde entendeu, quando entendeu e com os gestos e as palavras que entendeu e que, salvaguardadas as proporções e as diferenças dos intervenientes, fazem lembrar as do Horto das Oliveiras: é este, levai-o. Tendo escolhido uma terceira via, a da facilidade – nos dilemas só há duas e ambas difíceis, por definição –, JS saiu pela tangente; poderá vir a entender a breve prazo que não fez a melhor decisão; oxalá as consequências dela não venham a sentir-se no SNS a prazo não muito longo. Judas dependurou-se quando se apercebeu do seu erro; o que fará JS? Reedita o pântano que não permite ir a lado nenhum e sai pelas poldras que nele ainda restarem?

Mas estas considerações, por mais óbvias que me pareçam, não são para mim que sempre fiz gala de as não entender e de pensar e agir como se a Saúde tivesse outras exigências e fosse bem outra coisa que os políticos – apesar de tudo necessários – deveriam deixar de fora dos jogos por que se rege a disputa do poder, embora saiba que nunca o farão. O que me preocupa não é A, B, C ou D, é a reforma do SNS tida como necessária, ou melhor dito, a forte probabilidade de, mais uma vez, se perder o caminho andado e todo o esforço feito para o percorrer e que, também mais uma vez, o SNS continue condenado às fragilidades com que sempre o conhecemos. Aqui creio que devemos perguntar a quem é que, objectivamente, essa imobilidade convém. É que todos os itens que integram a reforma continuam perfeitamente actuais e em cima da mesa, ou melhor, no terreno, aguardando implementação. Já chega de jogar fora; joguemos então em casa.

2. Os pontos fundamentais da reforma do SNS

O grande objectivo tem de ser melhor saúde para todos.
È para ele que são desenhadas as estratégias adequadas a superar as debilidades reconhecidas. Ora a estratégia global anunciada era uma estratégia de reforma, ou, se preferirmos, de reequilíbrio das áreas de intervenção do SNS. Os seus pontos fundamentais tocam em todo o sistema e são conhecidos:
- Resposta insuficiente dos CSP, não articulada com as restantes áreas, não assumindo adequadamente a função que lhes deve caber de porta de entrada nos CH e nos CSC -> afirmação e requalificação dos CSP, reforço da sua capacidade de intervenção, criação de USF e de atendimento em regime de consulta aberta, previsão de agrupamentos de CS, alargando a capacidade de intervenção e de autonomia dos MSF;
- Procura excessiva dos SU (dos HH e SAP), na maioria dos casos inapropriada, com afectação do trabalho programado, quer da CE dos HH quer da disponibilidade dos CG para atendimento em regime de consulta aberta, ao mesmo tempo que impossibilitam o atendimento em condições aceitáveis de tão elevado número de utentes nos SU -> reestruturação da rede de SU, com redefinição e requalificação dos pontos de urgência e da sua distribuição no território segundo critérios de segurança e de racionalidade, aumentando significativamente o seu número, com desenvolvimento da rede de urgência pré-hospitalar e das regras de referenciação dos doentes e acidentados;
- Resposta insatisfatória dos HH, desadequação de estatuto jurídico, deficientes condições de qualidade e segurança de intervenção em muitos casos, sub-produtividade e baixos níveis de eficiência -> generalização gradual do estatuto de EPE, ajustamentos pontuais da rede (ex.: maternidades), concentração de recursos (Centros Hospitalares), desconcentração (caso dos HCL) ou redução de lotações excessivas, diminuição dos tempos em lista de espera, promoção da CE, do HD e da CA, melhoria da produtividade e combate ao desperdício (ex.: medicamentos) e sobretudo generalização do processo de contratualização anual (da produção e dos financiamentos) a todos os HH em aplicação do previsto na lei de gestão hospitalar, implicando maior responsabilização dos gestores (embora não se tenha ainda atingido o ponto necessário); continuação do programa de HH-PPP, visando quer a modernização da rede quer a introdução de concorrência no âmbito do SNS;
- Falta de continuidade no processo de tratamento dos doentes, traduzida também em repetição de MCDT com promoção de desperdício, em internamentos desnecessários ou mais longos que os necessários, portanto inapropriados, para responder à situação dos doentes -> alargamento gradual da rede de CSC, há dois anos apenas anunciada e agora já com significativa concretização, insuficiente mas em crescimento.

3. A falta de alternativas prévias para a mudança


É sintomático que não tenha aparecido ninguém a por concretamente em causa qualquer dos pontos da estratégia da reforma que estava em curso (estava, até que argumentos concretos provem que ainda está, porque palavras já não chegam). Pelo contrário, foram muitos os que apareceram a dizer (tardiamente?) que a reforma era necessária e também a reconhecer que episódios explorados como escandalosos – o escândalo é que vende! – e que sempre foram acontecendo em todos os tempos, nada tiveram a ver com as mudanças em curso. A título de exemplo:
“casos desgarrados e exemplificativos de... absolutamente coisa nenhuma” , como diz Henrique Monteiro.
Aquilo que ouvimos – estou a pensar mais nos que tinham e têm obrigação de melhor entendimento e capacidade de juízo – foi falar na falta de criação de alternativas prévias, que deviam estar no terreno antes da mudança.
Compreendo esta posição da parte da população em geral: defender o que se tem é a tendência natural, sobretudo quando se tem pouco e não se acredita que se virá a ter mais. Também aceito que, a tempo e horas, não se terá feito tudo (no conteúdo e principalmente na forma) para fazer ver as razões e, sobretudo, o faseamento necessário do processo e os objectivos da mudança, dando maior visibilidade ao que se pretendia no ponto de chegada.
Mas já a não compreendo da parte restante, a que apareceu como liderante (autarcas e médicos incluídos, alguns acumulando ambas as qualificações); da parte dos que, muito ou pouco, participam do estatuto de “fazedores de opinião”; da parte dos profissionais de saúde (que, em razão da área, são vistos como melhor informados). Todos estes tinham de saber que, num quadro de escassez de recursos – e os financeiros são indispensáveis mas não os mais importantes; o que sobreleva, na periferia, são os recursos humanos, muito principalmente a escassez de CG – a criação de alternativas no terreno nunca podia ser prévia, só podia ser gradual. Porque tem de se processar, em larga medida, com reafectação dos mesmos profissionais. É o que, no linguajar comum, se chama tratar a ferida com o pelo do próprio cão.
Admitam, porém, que havia disponibilidade dos recursos necessários para duplicar serviços: os actuais e os previstos na reforma, como defenderam. Contra que se levantariam os protestos quando os novos serviços e procedimentos tivessem sido testados no terreno e dados como bons, e então chegasse a hora de encerrar os que actualmente existem? Dispenso-me de responder. Todos têm as suas razões, mas volto a perguntar quem está interessado no imobilismo.

4.
E a decisão do PM?


De todo em todo, não me passaria pela ideia que o que venho a dizer passasse desapercebido ao PM. Por ele mesmo (emendar a mão mais de dois anos depois do início de uma reforma comporta uma confissão muito penosa); porque, fora de qualquer dúvida, a reforma lhe foi abertamente apresentada pelo MS; porque o seu Governo aprovou toda a estratégia; porque foi também o seu Governo que aprovou como ponto importante dessa estratégia o respeito dos limites consignados no OE; finalmente, porque a peça seria reposta em cena (previsivelmente, ainda com piores consequências) quando chegasse ao fim a moratória que anunciou na implementação da reforma. E, como já disse alguém, não se vê quando antes de 2010.
Por tudo isto, preciso de provas para acreditar que a reforma está em curso, ou que não foi pura e simplesmente posta de lado e deixada morrer por falta de oportunidade ou de conveniência política. Se olharmos para trás, sabemos que novo ministro, nova estratégia. O que talvez seja preferível do que ficar com uma estratégia paralisada, pois equivaleria a nenhuma estratégia.

5.
O que correu menos bem


Numerosas vezes manifestei discordâncias, apontei lacunas ou pontos em falta na estratégia para a reforma do SNS ou referi riscos que me parecia existirem. Quase sempre aspectos de natureza meramente instrumental em relação aos seus pontos fundamentais, acima referidos, como a excessiva concentração de competências na ACSS/IGIFS, a falta de revisão do sistema de informação de recolha obrigatório em todas as entidades prestadoras ou as debilidades da sua avaliação e controlo. Estaria, portanto, à vontade para os reeditar agora. Não o farei porque não teria qualquer utilidade. Mas é evidente que nem tudo correu bem, sobretudo em aspectos formais.
Último ponto que também não correu bem e que ficou sem o tratamento devido foi a conversa INEM Alijó/Favaios Não por ter transpirado e ter sido posta no ar perante o país inteiro. Pertença a que mundo pertencer, Alijó tem direito de existir e será mais vítima do que culpada das condições que tem. Mas não há dúvida de que a conversa foi demonstrativa do que podia e devia ter sido feito (aqui sim, previamente) e, claramente, não foi. Quem não fez o que devia ter feito? O INEM, a entidade que superintende nos Bombeiros ou ambas as Entidades? Como podem permanecer tranquilamente nos seus postos os respectivos responsáveis e deixar passar a suspeita de que, por detrás de tudo, persiste uma guerrilha entre entidades que têm de estar ao serviço do interesse geral?
Aidenos

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21 Comments:

Blogger e-pá! said...

Caro aidenós:

PODERÁ O RESSABIAMENTO "MATAR" A REFORMA EM CURSO...?

A reforma em curso (REC) poderá ter um roteiro muito mais simples do que as elucubrações biblicas que são equacionadas a esse respeito.
A "traição de Judas" - a eleita imagem para o exercício das competências de JS - tornou-se uma questão do tipo da "neurose obsessiva",i. e., um paradigma freudiano.

E a grande angústia gira à volta da Reforma da Saúde (a REC)será, por assim dizer, derivada de uma falha no período edipiano.

A famosa REC, tem de ter, para além de objectivos, meios, substractum, ... tempos! e calendários.
Ela começou ha quase 2 anos e só no dia 30 iriamos conhecer, pela boca de CC, os calendários.
Mas no entendimento dos que se agarram ao passado (...é uma frase prenhe de má conotação, mas é factual) os tempos , bem como os ritmos, são intangíveis, quiçá, imutáveis (mesmo face a alterações objectivas) e devem permanecer no segredo dos Deuses. Se não, tornam-se vulagres "banalidades".

A reforma da Saúde (CPS, Urgências e CCI) sofre, desde há algum tempo, de problemas de calendário, ritmo e equlilibrio.
O problema foi uma suave e discreta ataxia inicial (early onset) que a progressiva sujeição a critérios orçamentais (não das reforma - mas do imediatismo das suas consequências) tornou-se numa hipercinética ataxia do tipo (late onset) que paralisa e faz cair.
Conseguiram...!!!

O que foi, politicamente, prometido, conceptualizado, até agora, abarcará o suspeito "abrandamento" da Reforma.
Um crime de lesa-majestade nestas efemérides do regicícdio. Ou M Alegre transformado no Buíça...

O que não consigo perceber é como adoptando as considerações de Henrique Monteiro, relativamente ao indiscritível caso INEM/Favaios/ Alijó, se atribua (correctamente) as causas so sucedido ao atávico atraso educacional e se insista na reforma a todo o vapor.

Perante tal "espectáculo" o abrandamento é a única atitude política adequada.
Se não esvaziamos o objectivo político destas REC's.
Quando não nos desviamos da sua finalidade:
Elas (as REC's) servirão para testar a perícia ou imperícia dos seus fautores, dos génios da concepção, e não significam nada para o real destinatário - as populações.
Quando não o contrário: concitam desconfianças e geram inseguranças.
Não é inédito este procedimento na História, nomeadamente na peugada de vanguardas políticas, ditas revolucionárias.
Ele pode ser reproduzido (ou tentado) por hipotéticas "vanguardas técnicas".

Pelo que o anunciado "abrandamento da Reforma", é uma medida sensata, politicamente eficaz e será produtiva se não houver abdicação dos princípios gerais que a informam.
É necessário fazer o trabalho de casa, junto das populações (autarquias inclusivé).
É necessário conseguir a adesão dos profissionais;
Será necessário, sempre, evitar rupturas em pontos de rede (testar, simular soluções alternativas), fatais em Saúde.

Pelo que deverá nascer com a nova equipa ministerial, um novo ciclo, mais participativo dentro e fora do SNS, mais eclético em termos de agregar uma maior diversidade de conhecimentos.
Os novos passos não deverão ser subsidiários de conceitos económicos sobre saúde(... já todos sabemos que o dinheiro é finito), mas multidisciplinares, integrados e sustentáveis. Esta trilogia integra.

Será isso, para os "traídos", a dificuldade de compreensão do terrível "abrandamento da Reforma" (REC).

Lançar sobre a Reforma um Anátema:

Para os cristãos uma excomunhão, ao sua concepção vernácula (grega)uma "oferta votiva" ou um agradecimento a um evento que pode vir a revelar-se favorável.

A dialéctica história, ou a dialéctica política.

Finalmente, a minha imagem sobre o cataclísmo "abrandamento das Reformas":
Quando as pessoas são confrontadas com a dificuldade em prosseguir, algumas dão um orgulhoso passo em frente, outras dão um passo atrás para recuperar a segurança.

Estará aqui o nosso actual momento histórico.

Fora de qualquer ressabiamento, que já começou a despontar em relação a Ana Jorge, no seu amplo sentido figurado: desconfiado, espantadiço, farto de, saturado, desgostoso, melindrado,...há um caminho a percorrer.

O visível posicionamento dos desgostosos pela remodelação, não sendo demoníaco, não é saudável, nem justo.

A ver vamos...

11:29 da manhã  
Blogger tonitosa said...

Uf! Até falta a respiração!

3:29 da tarde  
Blogger tonitosa said...

Ontem o DN fez notícia de primeira página das remunerações dadas aos médicos na realização de transplantes.
Na verdade é matéria que merece reflexão. E há uma aspecto quanto a mim, nuclear em qualquer análise que se faça: o transplante será certamente das mais nobres intervenções cirúrgicas por aquilo que representa para os doentes.
Tal como uma cirurgia de remoção de um tumor que permite salvar o doente da morte! E não só.
Mas do que veio escrito destaco a seguinte passagem:
"O responsável pela ASST diz mesmo que o ex-ministro Correia de Campos lhe tinha dado indicações para repensar o modelo, tendo em conta que a fórmula varia de hospital para hospital. "Enviei em Junho de 2007 uma circular a todos os hospitais pedindo informações sobre o modo como são distribuídos os incentivos". As respostas ainda estão a chegar.

Sobre os 30 mil euros que recebeu só em Novembro, responde que também "sorriu" quando viu o recibo, mas garante que "o incentivo é igual ao do seu antecessor no Hospital. A questão é mas que antes era impensável chegar aos quatro transplantes por dia".

Sem dúvida que o modelo parece desajustado. Mas o que não se entende é que seis meses depois de ter solicitado informação aos HH, EB estaja ainda à espera das respostas.
Porque será? São coisas como esta - as capelinhas - que muitas vezes entravam os processos de mudança.

4:40 da tarde  
Blogger naoseiquenome usar said...

A propósito da "guerrilha" entre Entidades, seria bom (re)lembrar a responsabilidade que cabe, quanto a equipamentos e recursos, ao Ministério da Administração Interna.

7:57 da tarde  
Blogger PhysiaTriste said...

Partilho da opinião de Aidenós (excelente post) sobre o artigo de Henrique Monteiro, de que passo a transcrever um parágrafo:

“Depois, vieram as pressões do partido. Os pais fundadores do SNS, como Arnaut, as consciências de esquerda, como Alegre. Tudo gente estimável e acima de qualquer suspeita, mas convicta de que os recursos são inesgotáveis. Não lhes chegou o exemplo das reformas (que a geração deles recebe quase por inteiro, alguns desde a meia-idade, mas que a minha não receberá antes dos 66 ou 67 anos e cheia de descontos, e a geração das minhas filhas nem sabe se alguma coisa receberá).”

Sem querer abusar da vossa paciência, permitam-me que reproduza agora uma notícia do Portugal Diário, de 25 de Julho de 2006:

“Manuel Alegre vai receber uma reforma de 3.219,95 euros mensais pelo cargo de coordenador de programas de texto da Rádio Difusão Portuguesa que ocupou por alguns meses. A informação faz parte da lista dos aposentados e reformados divulgada pela Caixa Geral de Aposentações (CGA), citada pelo Correio da Manhã.

Em declarações ao jornal, Alegre garantiu que nem se lembraria da reforma, se não fosse a CGA a escrever-lhe uma carta. O deputado explicou que foi funcionário da RDP durante «pouco tempo», já que começou a trabalhar na rádio quando voltou do exílio, após o 25 de Abril, e saiu em 1975 quando foi eleito deputado, cargo que ocupou desde então. «Nunca mais lá trabalhei, mas descontei sempre», disse o deputado.

Alegre disse ainda ao Correio da Manhã que vai receber «um terço da reforma», já que a lei não lhe permite acumular o vencimento de deputado com uma reforma.

Quando questionado sobre se não lhe «parecia mal» receber uma pensão por ter trabalhado tão pouco tempo, o vice-presidente da Assembleia da República afirmou apenas que «é legal». E recordou o exemplo de outros políticos que também recebem pensões além do vencimento. «O Presidente da República também não recebe duas ou três reformas do Estado, além do vencimento? Mas eu nem questiono que ele é uma pessoa séria».”

Nessa altura dizia Vital Moreira no “causa nossa”:

“… se ele tivesse querido, ele poderia ter requerido a reforma logo que perfez as condições para isso, podendo portanto ter acumulado essa reforma e a remuneração de deputado durante vários anos. Em vez de ser louvado por não se ter prevalecido desse privilégio (como muita gente fez...), Manuel Alegre é injustamente acusado de uma imoralidade, sem nenhum fundamento.”

É óbvio que a reforma de Alegre é perfeitamente legal. O que está aqui em causa nem sequer são problemas morais ou éticos. Recordo que há exemplos de pensões de reforma em Empresas Públicas verdadeiramente indecorosos!
A verdadeira questão é outra. O que temos de perguntar é: - Como foi possível tanta generosidade e, ao mesmo tempo, tanta iniquidade nos próprios Serviços do Estado.
Alegre trabalhou muito pouco tempo na RDP (alguns meses apenas) e tem uma reforma superior à de um Director Geral com trinta e seis anos de serviço!

Com as pensões de reforma da FP já sabemos o que sucedeu. A geração anterior reformou-se cedo, com reformas por inteiro (uns tantos até acumularam); a geração actual vai de ter de trabalhar mais tempo para ter pensões menores; as próximas gerações não sabem se terão reformas pagas.

Quanto ao SNS sabemos que entre 1980 e 2004 Portugal duplicou as despesas públicas em saúde (em 2004 a percentagem das despesas totais com a saúde -10% - era já superior à média da EU.)
Sabemos que os ritmos de crescimento da despesa em saúde criaram, na passada década, instabilidade nas transferências orçamentais para o SNS.
Sabemos ainda que “A manutenção dos ritmos históricos das últimas décadas configura uma situação de insustentabilidade financeira e, face às necessidades crescentes dos cuidados de saúde, exige uma adequada organização na captação de fundos.” (Relatório Final da Comissão de Sustentabilidade do SNS).

Aparentemente há na sociedade portuguesa um amplo consenso sobre o SNS.
Mas, se aprofundarmos um pouco a questão, veremos que, sob o manto diáfano desse consenso, se escondem concepções radicalmente diferentes de SNS.
Enquanto uns pretendem um SNS para os pobres e para os velhos (uma espécie de Medicaire e Medicaid), outros querem um SNS que dê tudo a todos, sem preocupações “economicistas”?

Economicismo não sei o que é. Sei sim o que é economia: “ estudo da forma como as sociedades utilizam recursos escassos para produzir bens com valor e de como os distribuem entre os vários indivíduos” (Samuelson).

O que é necessário acontecer para que desapareça o “preconceito, auto proclamado humanista e vestido de esquerda”, de que falava Daniel Bessa no Caderno Economia do Expresso?

3:16 da tarde  
Blogger aidenós said...

Caro É-Pá:

Não quero enfastiá-lo mais com um tema de que, tal como já disse, está cansado (e tem razão para estar porque nele interveio 17 vezes, se não errei na contagem!, levando clara dianteira a todos os demais).

O que eu afirmei, afirmei-o de forma muito clara, aduzindo razões que fundamentavam essas afirmações. Voltei a reler o que escrevi e a minha conclusão é que só não entendeu quem não quis entender. O seu Comentário, apesar de me ser endereçado, incide muito pouco sobre o meu texto, mas reconheço-lhe o direito de derivar como entender e pela forma que entender. Eu é que, a muitas vezes, fico sem a certeza de ter entendido o que o É-Pá quer dizer, mas aí … azar meu.

Por isso, limito-me a esclarecer que tudo quanto referi foi dito em defesa da reforma do SNS que estava em curso e que, pelas suas virtualidades, deveria prosseguir e não morrer em “stand by”. Esse é que foi o tema escolhido. Se alguém viu nele o início ou a inserção numa campanha antecipada para descredibilizar a nova MS “risque meu nome do seu caderno”. Tem direito a ser avaliada pelo que fizer, embora tenha uma directiva de não fazer coisa que se veja.

Finalmente e no mesmo tom de aliviar: o Tonitosa está com dificuldades respiratórias. Não haverá por aí quem possa disponibilizar-lhe um daqueles aparatos (não quero dizer bomba, que ele é bom rapaz!) auxiliares?

6:06 da tarde  
Blogger tonitosa said...

Caro Aidenós,
Você acusou o toque e ainda bem.
Dá-me ensejo a repetir o que já, pelo menos uma vez, disse.
Acho exagerados os textos longos que escreve.
Alguns com mérito e ideias novas, é certo, mas outros fazendo uma espécie de repositório de tudo já antes escrito, por si e por outros, sobre determinado tema.
E foi mais uma vez o caso. Tudo o que diz, com mais ou menos retórica, com mais vírgula menos vírgula, foi já escrito (é apenas uma opinião pessoal mas com o devido respeito a expresso) e acho que, se não "divagasse" por um longo texto, seria mais eficaz nos objectivos que pretendia atingir.
O diagnóstico sobre o SNS e a sua reforma está feito há muito. E todos o conhecemos. E consta mesmo em alguns "apontamentos" académicos, mais ou menos elaborados!
O Saúde SA, enquanto blogue de debate aberto, em minha opinião, não é o espaço propício à explanação de longas teses sobre Saúde.
E cansa. E olhe que não estou só nesta opinião. Há quem faça a mesma análise que eu.
Aceite o meu respeito e o reconhecimento da suas capacidades como interveniente no Saúde SA.

11:36 da tarde  
Blogger Joaopedro said...

A ANF já está a pensar no próximo Governo. No princípio de 2009, ou ainda este ano, esta entidade vai “apresentar um documento onde será feito o balanço da política de Saúde deste Governo e onde serão feitas sugestões sobre o que deve ser feito para melhorar a saúde dos doentes”.


O balanço nesta altura é fácil.
Daqui até lá é em velocidade de cruzeiro.
O que havia a fazer já foi feito.

1:01 da tarde  
Blogger aidenós said...

Quanto a sínteses, também gosto delas, mas, como sabe, cada um faz as de que é capaz. Para uma boa síntese, é indispensável um conhecimento aprofundado; só se consegue depois de longo trabalho de análise. Para ser convincente, deverá ser densa (parca de palavras), mas não sincopada; terá de preocupar-se em deixar perceptíveis as razões em que se apoia se não precedeu a sua apresentação. Caso contrário, poderá ser curta, até lapidar, mas … será gratuita, meramente opinativa, ou tendenciosa, dependendo do receptor. Não conquista, agrada aos conquistados. Mas isto é falar, porque conseguir a síntese é outra coisa.

No que respeita à originalidade de posições, como eu admiro os investigadores! Mas eu não sou e, se alguma coisa aprendi, foi mais com as exigências da vida do que com esforços voltados especificamente para a inovação. E também receio que, se só as descobertas viessem ao Saudesa, ficaria cá pouca gente. Pelo contrário, penso que a vivência de cada um acrescenta alguma coisa: além da experiência individual, há a experiência colectiva que acumula a de todos.

Depois, e já termino, a linha editorial do Saúde SA não sou eu que a defino, como sabe. Mas admito que nem seja a mim que o Tonitosa dirige este ponto do seu Comentário. Por mim, fico de consciência tranquila porque nunca explanei qualquer longa tese sobre Saúde. Não está nas minhas ambições nem ao meu alcance.
Mas acho bem que quem as tiver as partilhe connosco; não se preocupe que o equilíbrio entre intervenções estabelece-se por si só.

Agradeço e considero o seu comentário, porventura excessivamente “simpático” na sua parte final. Procurarei melhorar.

5:00 da tarde  
Blogger tambemquero said...

Por detrás do pano

E pronto, está feita. Quando muitos já não a esperavam, depois de tantos «falsos alarmes», surgiu, de relâmpago, a remodelação. Correia de Campos caiu, subindo ao palco Ana Jorge. Bem ao jeito de José Sócrates, a mudança fez-se rapidamente, sem tempo para muitas especulações.

Falta saber se estamos a falar de uma remodelação a sério ou de uma mera operação de cosmética política. A nova ministra, oriunda da classe, servirá para adoçar a boca aos médicos, há muito em rota de colisão com o Ministério da Saúde. E com o seu jeito sereno, discreto e dialogante, também deverá conseguir acalmar os exaltados ânimos populares.
Mas o que acontecerá às políticas da Saúde? O primeiro-ministro disse que a nova dirigente vai dar seguimento às reformas em curso. Contudo, não se prevê que esse seja o caminho. É que, se da queda de Correia de Campos pouco ou nada se falava antes do acontecimento, há já algum tempo «corria» que a próxima leva de encerramentos não se iria concretizar, dada a hostilidade popular. Ana Jorge parece ser, pois, apenas o rosto que fica bem na nova política da Saúde — a do abrandamento —, imposta pela proximidade das eleições autárquicas, em Março de 2009.

Em suma, muitas dúvidas permanecem em relação aos meandros desta remodelação, mas uma coisa ficou clara — quem gere a política da Saúde é o primeiro-ministro, ao sabor das conveniências dos seus timings políticos.

TEMPO MEDICINA 1.º CADERNO de 2008.02.04

7:06 da tarde  
Blogger PhysiaTriste said...

Caro Aidenós:

Pois é. Sobre o SNS já se gastaram todas as palavras. Só falta mesmo é salvar o SNS.

Mas sosseguemos, porque às 18.20 horas de hoje já tinham assinado a petição para o salvar 5.500 pessoas, entre as quais o Dr. Arnault, Manuel Alegre, o Dr. João Semedo, o recém eleito Bastonário da OM, Dr. Pedro Nunes e o ex-Bastonário da Ordem dos Farmacêuticos, Dr. Aranda da Silva.

Não fui que escolhi os nomes, foi a Esquerda.Net, novo portal do Bloco de Esquerda.

Leio estes nomes e concluo, afinal, que está tudo por discutir. Gostava de ver os cinco sentados a uma mesa e chegar a acordo sobre dois pontos: que tipo de SNS querem e qual o caminho para lá chegar.

Por isso mesmo quero agradecer-lhe os seus textos. É por eles e pelos trabalhos do Hermes, Semmisericórdia, Elmapena … e de mais uns tantos, que sou leitor assíduo do Saudesa, gerido com mestria pelo Xavier.

Alguns desses trabalhos dão trabalho a ler. Mas não estão ao alcance de quem quer. São o fruto de muito estudo, muita experiência e muita reflexão.

Que se procurem conter, para dar lugar à conversa fiada, com o pretexto do Blog ser muito pesado é coisa que não compreendo.

A marca do Saudesa é a excepcional qualidade de alguns dos seus textos.

7:18 da tarde  
Blogger Pela livre abertura de farmácias said...

Diz o João Pedro que nas farmácias "O que havia a fazer já foi feito".
E a abertura de 350 a 500 novas farmácias? E as dos hospitais?

11:57 da tarde  
Blogger tambemquero said...

Se o Estado não tem dinheiro, os doentes é que pagam
O legado que Correia de Campos deixa à sua sucessora é positivo. A imagem pública é que não.

A análise feita nesta edição do Diário Económico mostra que o antigo ministro da Saúde deixa as contas do Ministério mais equilibradas do que quando lá entrou. Mais importante, deixa os indicadores de Saúde melhores do que quando lá entrou. Então, qual a razão de ter sido substituído? A imagem pública (má, no princípio, e péssima, no fim). Não se consegue reformar nada em Portugal sem uma dose industrial de paciência e bom senso, e a António Correia de Campos faltou-lhe um pouco das duas. Para os doentes, a análise é sempre negativa, porque os medicamentos não são baratos, os médicos são caros e os hospitais parecem sempre cheios a quem deles precisa. Todos querem um hospital à porta, uma urgência no prédio e um médico em cada esquina. Mas é por isso ser impossível (não há dinheiro, pura e simplesmente) que as escolhas económicas em saúde são tão debatidas. Por exemplo, no campo dos medicamentos. O Governo penalizou a indústria, as farmácias e, claro, os doentes, que pagaram mais 60 milhões em 2007 pelos medicamentos.
MB, DE 08.02.08

10:08 da manhã  
Blogger tonitosa said...

Isto está tão bom, tão bom que ainda ontem mais uma parturiente deu à luz numa ambulânia apenas assistida pelo motorista.
Isto passou-se na viagem de Carrazeda de Anciães para o H. de V. Real.
E como dizia o motorista, antes a viagem até Mirandela durava cerca de 25 minutos, agora para V. Real demora mais de uma hora.
Será que, querer aberta a maternidade de Mirandela é "querer" um hospital à porta?
Só falam assim aqueles que na verdade têm o conslutório, a clínica e o hospital ao virar da esquina! E aqueles que tem amigos e não vão para as listas de espera, os que trabalham nos hospitais e levam lá os pais, os primos, os filhos e os enteados sem ter que estar à espera. E aqueles que têm seguros e até nem precisam de ir aos hospitais públicos.
Os outros...aqueles ques vão para os Centros de Saúde às 4 ou 5 da manhã para marcar uma consulta, os que esperam meses e meses por uma CE ou uma cirurgia, os que têm que sair de casa manhã cedo e só podem regressar ao fim da tarde para ir ao Centro de Saúde, esses (os coitados) têm boas razões para lamentar a falta de acesso aos cuidados de saúde e de adequada assistência.
Alguma coisa tem sido feita para melhorar, mas muito mais podia ter sido feito e sobretudo poder-se-iam ter evitado cometer erros que só não vê quem não quer.

11:11 da manhã  
Blogger saudepe said...

O pessoal médico não gosta de economistas. E todas as oportunidades são boas para lançarem ferroadas.

Boas novas em uma só notícia!

Se é sofredor, leia esta crónica
Os portugueses são, em regra, sorumbáticos ou pouco risonhos. Talvez a excepção sejam os políticos...
Não é, longe disso, um problema novo, nem nenhuma consequência de «Abril», sosseguem-se os espíritos mais revolucionários.
Por outro lado, Umberto Eco escrevia, em O Nome da Rosa, que «o riso é a fraqueza, a corrupção, a insipidez da nossa carne». Já Eça se queixava e lamentava de sermos um povo triste e Eco não é lusitano...
Os portugueses são, ao mesmo tempo, conhecidos campeões de doenças cardiovasculares, com a hipertensão arterial (HTA) à frente; com gostos duvidosos em relação a muitas coisas — chamados hábitos de vida e, também, gostos duvidosos relativamente a muitas das suas opções ao longo da vida —, incluindo as políticas.
Como quer que seja, a HTA será provavelmente a patologia que mais nos assusta, pelo menos em teoria, uma vez que o fumar, o beber excessivamente, o comer em demasia, o não fazer exercício físico devidamente, o andar sempre mal consigo e com os outros, são características quase rácicas e incorrigíveis!
Lamentavelmente, a HTA, por si só, não chega para conceder a tão desejada «reforma» ou «aposentação», esse sonho de tantos cidadãos que anseiam por essa fase da vida em que, bem vistas as coisas, até conseguem fazer menos e ganhar porventura mais...
Talvez por esta combinação infeliz, a da falta de alegria e doença, os portugueses se sintam em paz, maravilhados por um fado que lhes canta os desgostos e as desgraças, por uma fé que tudo suporta com humildade e espírito de sacrifício, e por um desporto-rei estupidificante e, diria, pouco edificante à luz do que se vai vendo (e nem falarei do que se não vê, por supostamente se passar à noite...).
Mas isto não são, obviamente, as boas novas de que vos quero falar.

As boas notícias, naturalmente, chegam de fora!

Vêm do Reino Unido, onde a Universidade de Warwick concluiu um estudo científico com base numa análise de 15 000 respostas de cidadãos europeus a um inquérito do Eurobarómetro.
Estou já a falar a sério! O estudo procurou avaliar o impacte na vida dos europeus de um conjunto de variáveis que incluíram o estudo da satisfação com as suas vidas/existências, história pessoal de doença mental ou psiquiátrica e diagnóstico de HTA.
A primeira notícia — boa — é exactamente esta, a de que ainda há na Europa quem se preocupe em estudar os índices de felicidade dos cidadãos!
A segunda — não boa, mas excelente — é a de que a Universidade de Warwick confiou esta investigação aos seus melhores economistas, o que vale por afirmar que um estudo confiado a economistas garante uma credibilidade inatacável!
Vamos ter mais boas notícias.

Calma!

A investigação conduzida pelos economistas britânicos (não venham dizer que não prestam porque ainda estão com as libras e não com os euros...) poderia levar-nos a três conclusões possíveis:
1) A Europa estaria feliz;
2) A Europa estaria infeliz;
3) A Europa ainda vá, agora os europeus que paguem mais para poderem ser felizes.
Mas não, o estudo foi desta feita mais sério. Não leva ninguém a pagar mais pelo mesmo. E conclui até que a análise da correlação «das taxas de felicidade com as da hipertensão» prova que quanto menor for a primeira, maior a segunda, e vice-versa!
Por outras palavras, quanto mais felizes, menos hipertensos!
Eis a terceira boa notícia!
Mas o prometido é devido, ou não fosse eu não-político. O estudo inglês avançou mais e produziu uma importantíssima conclusão: a relação inversa entre «felicidade» e «hipertensão» é independente do PIB!
Não é uma extraordinária boa novidade?
Os autores dão por isso a prova provada desta função: no top HTA-infelicidade estão a Alemanha, a Finlândia e Portugal!
E rematam que, no futuro, será de esperar que o índice da pressão arterial possa vir a substituir o valor do PIB enquanto ferramenta ou instrumento de medição do sucesso de um país.
Ora, com tantas boas notícias, corro o risco de ficar por aqui e me perturbar no raciocínio, que quero lógico e coerente...
Com esforço, por isso, pretendo ainda sublinhar tais notas de reflexão final.

Não leia as conclusões se é economista!

A primeira, como português e europeu.
Todos sabemos que a felicidade não depende apenas do que se tem ou do que se é...
Antes mesmo dos economistas de Warwick, já a sabedoria popular nos ensinava a distinguir o trigo do joio. Certo é que, com tamanho saber, não soubemos, enquanto povo, nem ser mais felizes, nem mais saudáveis... Mas também não estamos a conversar sobre a inteligência!
A segunda conclusão, como europeu e português.
Sosseguem os nossos governantes, os sacrifícios materiais em nome do equilíbrio orçamental ou de qualquer outra coisa de que venham a lembrar-se a seguir, não nos deve nem maçar, nem incomodar. É que além de nos poder fazer subir mais a pressão arterial, ficou demonstrado que a felicidade é mais anti-hipertensiva do que o dinheiro e o PIB.
A terceira e derradeira conclusão, como homem e médico!
Este estudo encerrou a melhor das boas notícias para mim. Anuncia de modo brilhante o fim dos economistas na Saúde, na política e na vida!
Podemos, enfim, livrar-nos deles, estejam onde estiverem, nos bancos, nos parlamentos, nas universidade, na Entidade Reguladora da Saúde... Não são precisos. Nem para avaliar a taxa de sucesso de uma nação!
E, finalmente, competirá aos médicos trabalhar na concepção e desenvolvimento das políticas económicas e no bem-estar e felicidade dos concidadãos!

Rui Cernadas

TEMPO MEDICINA 1.º CADERNO de 2008.02.04

Não tem muita piada, mas que se há-de fazer...
Sempre é melhor que a história daquele médico a lamentar-se sobre a máquina do dedo.

Deixá-los aliviar a ver se não ficam doentes.

1:13 da tarde  
Blogger Clara said...

Que é feito do é-pá?
Espantou-se para a clique do Manuel Alegre?
Ou será que ficou melindrado por ter sido reconhecido como elemento infiltrado da "Grande Corporação"?
Caro é-pá, não ligue.
Nós aqui tratamo-nos mal, mas somos amigos. Como uma família. Talvez por isso mesmo.

Não tem o direito de nos privar das suas prosas excitantes.
O que isto precisa é de agitação.
Sem si corremos o risco de ficarmos murcões.

Um abraço.

1:45 da tarde  
Blogger tambemquero said...

É vê-los, agora, tentar aparecer.

Concordo com a requalificação [da Urgências] mas, tal como referi relativamente às maternidades, é preciso mostrar à população que há alternativas e fazer educação para a saúde nos centros de saúde, esclarecendo quais os sinais e sintomas que significam gravidade
Maria do Céu Machado, alta-comissária da Saúde
Notícias Magazine, 03/02/08

1:52 da manhã  
Blogger lisboa dakar said...

E voltamos ao mesmo:
Já alguém fez contas que provem que as USF são, de facto e sem demagogia, melhores que o que havia, e gastam menos ou, pelo menos, o mesmo???

11:51 da manhã  
Blogger tambemquero said...

Excelente contributo

Reforma da rede de Urgências: os equívocos

Na actual polémica pública acerca do encerramento de serviços de Urgência, o ruído que resulta do esgrimir de argumentos políticos muito deixa por dizer. Baseando-se no parecer da comissão técnica que estabeleceu uma nova rede de Urgências, o Ministério da Saúde iniciou um processo de reforma que, por enquanto, se traduziu apenas em encerramentos. Mais: quem recentemente assistiu ao programa Prós e Contras, da RTP1, ficou a saber que amiúde se invocam pareceres técnicos quando isso interessa para fundamentar as decisões, mas já se justifica com decisão política para não abrir uma Urgência prevista no plano proposto pela comissão técnica (no caso, o serviço de Urgência básica de São Pedro do Sul).

O relatório da comissão técnica criou um plano para dar resposta às situações de urgência e emergência, mas apenas isso; é um plano intrinsecamente coerente mas que não teve em conta, nem teria de ter, outros factores externos; já a sua aplicação prática deve ter em conta não apenas o âmbito restrito da rede de Urgências, mas o contexto global do Serviço Nacional de Saúde, ao qual deve ser condicionada.

A comissão técnica que definiu a NRU teve por objectivo estabelecer um plano que assegure uma cobertura aceitável, em todo o País, das situações de urgência e emergência. O plano elaborado poderá consegui-lo, embora, como tem sido repetidamente dito e escrito, sejam discutíveis alguns dos seus pressupostos. Por exemplo, considerar, entre os critérios para manter aberto um serviço de Urgência, uma afluência diária superior a 150 utentes/dia é exagerado e fere a sensibilidade de quem, como eu, durante muitos anos ouviu grandes mestres da Medicina opinar que um verdadeiro serviço de Urgência não deveria ter mais de 40 a 50 utilizadores por dia. Mais, ao estabelecer esse patamar e depois considerar apenas limites mínimos de recursos médicos num serviço de Urgência básica de dois médicos por equipa, está-se a assumir que cada médico poderá ter de observar, num período de 24 horas, no mínimo, 75 doentes, o que é uma enormidade.
É do conhecimento de todos que existe em Portugal uma «urgencialização» dos cuidados de saúde, isto é, frequentemente se recorre aos serviços de Urgência em situações de doença que deveriam ser resolvidas noutros locais do sistema. Mas essa situação indesejável não termina por decreto. A sua modificação exige duas condições: a melhoria global da capacidade de resposta eficaz e atempada do SNS, a começar pelos cuidados primários de saúde e a terminar nas consultas das especialidades hospitalares, e uma alteração radical de mentalidades na população.

Ao iniciar a aplicação no terreno do plano definido pela comissão técnica, o Ministério da Saúde assumiu que:
— As situações de Urgência e emergência teriam resposta nos serviços de urgência que se mantêm ou a criar;
— Para compensar o aumento da distância de algumas populações ao serviço de Urgência, em consequência do encerramento daquele que ficava mais próximo, reforçaria a cobertura da emergência pré-hospitalar, nomeadamente através da implementação das viaturas de suporte imediato de vida (SIV);
— Para dar resposta às situações de doença aguda não grave, a nova organização dos cuidados de saúde primários em unidades de saúde familiar (USF), sempre que já implementada, seria a solução; em alternativa, nalguns locais seriam criadas as chamadas consultas abertas.

Factores subavaliados

Só que o Ministério da Saúde subavaliou, entre outros, os seguintes factores:

1.º — O maior factor de sobrecarga dos serviços de Urgência no nosso país não são os doentes emergentes e urgentes (uma minoria, mas que justifica que os serviços de Urgência existam e que foi o alvo da comissão técnica), mas os restantes que congestionam as instalações, consomem recursos e ocupam os profissionais!

Os serviços de Urgência existentes estão repletos de doentes, muitos deles com patologia não urgente (certamente bem mais de 50% das admissões). Ao encerrar alguns deles, seria de prever maior sobrecarga dos que se mantêm, com maior número global de utentes e com a admissão de mais alguns casos de pequena e média gravidade que antes recorriam aos serviços entretanto encerrados. Só que não foi avaliada a capacidade dos serviços que se mantêm para suportar um aumento, qualitativo e/ou quantitativo, da procura, nem foi implementado nenhum reforço, em termos de espaço físico, de quantidade de recursos técnicos e de recursos humanos, dos mesmos. Também pouco foi feito junto dos utentes para diminuir o recurso aos serviços de Urgência em casos que o não justificam: as USF entretanto criadas nem sequer compensam como alternativa em caso de doença aguda não grave os serviços de atendimento permanente (SAP) entretanto encerrados; mesmo algumas tentativas implementadas no passado para esclarecer as populações no sentido de evitar recorrer aos serviços de Urgência em casos banais não têm na actualidade qualquer réplica (e algumas tiradas infelizes, como a célebre declaração do ministro da Saúde de que nunca recorreria a um SAP, só poderão ter o efeito contrário). Com estas medidas, o Ministério da Saúde conseguiu agravar ainda mais as condições já caóticas existentes na maior parte dos serviços de Urgência do País.

Na maioria dos casos, um doente urgente sujeita-se a ser recebido num serviço sobrelotado, onde poderá ser difícil ser atendido dentro do período de tempo aceitável para o seu caso e onde poderá ser observado por uma equipa médica exausta.

De facto, o congestionamento da generalidade dos serviços de Urgência do País é uma dolorosa realidade desde há muitos anos e tende a agravar-se. Além de razões relacionadas com mentalidades, resulta da falta de alternativas de fácil acesso dentro do sistema para o cidadão com doença aguda não grave, da complexidade crescente de muitos doentes, portadores de múltiplas patologias com elevado risco de descompensação e de doença intercorrente que, num sistema desorganizado, são frequentemente compelidos a recorrer ao serviço de Urgência, e do envelhecimento da população, com elevado número de doentes dependentes e acamados, cujo único contacto com o sistema de Saúde é o serviço de Urgência, a que recorrem repetidamente.

Contribui, também, para o congestionamento de muitos serviços de Urgência a recente reforma da rede hospitalar que encerrou alguns dos poucos hospitais de retaguarda que ainda restavam, embora criando, nos mesmos e noutros locais, novas camas para cuidados continuados. Só que as camas dessas unidades deixaram de estar disponíveis para o encaminhamento directo de doentes a partir dos serviços de Urgência, que assim vêem aumentada a dificuldade em se descongestionarem, por falta de camas para internamento dos doentes que dele necessitam (já que as enfermarias de alguns grandes hospitais frequentemente estão repletas e até com doentes nos corredores!). A recém-criada rede de cuidados continuados integrados não é, por agora, alternativa para este problema, por ter uma gestão da admissão de doentes burocratizada e morosa (e não o simples contacto telefónico entre médicos, a que nos habituámos!) e por rapidamente ter ficado congestionada (resultado das pressões dos familiares, como recentemente foi denunciado?).

2.º — O reforço da emergência pré-hospitalar, fundamental para dar resposta às situações de grande urgência, não substitui outro tipo de resposta que um serviço de atendimento de proximidade poderá dar numa maioria de outras situações de doença aguda. Ao contrário do que o ministro afirmou, um médico com estetoscópio, meia dúzia de fármacos e alguma formação poderá tratar, ou pelo menos estabilizar, a grande maioria desses doentes. Já não poderá, na realidade, responder às situações de grande urgência e emergência, e estas devem ser rapidamente encaminhadas para os locais habilitados a tratá-las. Só que o encerramento precipitado de alguns dos serviços não contemplados na nova rede de Urgências delineada pela comissão técnica pôs a nu as debilidades da rede de emergência pré-hospitalar e os casos aí estão na praça pública. É pena, porque poderá deitar por terra aquilo que mais sentido faz na proposta de nova rede de Urgências.

3.º — A organização dos cuidados de saúde primários em USF é ainda um processo em início de implementação. Muitos cidadãos continuam a não ter médico de família e muitos mais não conseguem aceder-lhe quando mais precisam. O Ministério da Saúde padece de inabilidade política quando fecha um serviço de Urgência e abre ao lado uma «consulta aberta»: bastaria manter o primeiro, mudar-lhe até a designação para outro nome qualquer (mesmo «consulta aberta»!), desviar daí para os serviços com capacidade para os tratar os casos de maior urgência e, progressivamente, veria implementada a sua reforma, com a compreensão das populações locais, que a entenderiam como um reforço da sua saúde e não como uma perda.

É preciso serenidade

O actual estado de coisas é preocupante. Muitas populações sentem-se inseguras: o encerramento de serviços, a constatação de que não estavam asseguradas no terreno as alternativas mínimas necessárias e o aproveitamento político e mediático de alguns casos de desenlace fatal, que ocorreriam em qualquer circunstância, justificam este sentimento.
Serenidade precisa-se. Da nova ministra da Saúde, para adoptar uma postura mais sensata e dialogante; dos responsáveis locais, para descortinarem para além dos interesses das suas paróquias; e de todos os políticos em geral, para não fazerem demagogia. Não se pode passar para as pessoas a ideia de que se deve recorrer ao 112 em casos banais, sob pena de entupir o sistema. Não se pode divulgar que as SIV e as VMER são os substitutos das Urgências que fecham; se assim for, não estarão disponíveis para os casos que verdadeiramente delas necessitam. Não se pode continuar a fomentar este clima de «caça às bruxas» sempre que algo corre mal dentro do sistema de Saúde: os profissionais deixarão de ter condições para, em cada caso, decidirem de modo sensato e ponderado.

Arsénio Santos, médico especialista de Medicina Interna

TEMPO MEDICINA 1.º CADERNO de 2008.02.11

3:47 da tarde  
Blogger aidenós said...

O Texto de Arsénio Santos (médico especialista de Medicina Interna) no T.M., trazido ao Saudesa por Tambemquero, é mais um exemplo de que o que foi objecto de crítica foi a não criação de alternativas prévias. Sobre isto, que é o mais importante, nada mais a acrescentar: o que tinha a dizer foi referido no texto inicial (A reforma em curso).

Como Arsénio Santos refere “Os serviços de Urgência existentes estão repletos de doentes, muitos deles com patologia não urgente (certamente bem mais de 50% das admissões)”. De facto, bem mais, mesmo muito mais, com patologia não urgente, se a análise considerar apenas SAP e SUB. Mesmo que apenas 10% (ou seja 15 doentes/dia, no caso da afluência mínima exigida pela Comissão das Urgências) fossem doentes de gravidade média ou pesada, teríamos de considerar que nenhum SAP e nenhuma SUB deveria subsistir ou ser criada porque, com os recursos que neles existem ou estão previstos, a sua existência como pontos de rede de SU iria apenas retardar os cuidados necessários e aumentar o risco de falência do sistema. Isto é, os “grandes mestres da Medicina” que Arsénio Santos ouviu (“um verdadeiro serviço de Urgência não deveria ter mais de 40 a 50 utilizadores por dia”), não pensavam em SAP nem em SUB, que ao tempo não existiriam, nem nos doentes que SAP e SUB são capazes de atender, mas em verdadeiros serviços de Urgência, (SUMC ou SUP) e nos doentes que nestes devem ser atendidos. Ora o próprio Arsénio Santos refere que não são estes a sobrelotar os SU. Se nenhuma das situações mediatizadas pode ser imputada às mudanças em curso, qual seria o clamor se estivéssemos a falar de 15 transferências/dia por cada SAP ou SUB – porque em todas haverá algum risco, sejam quais forem os recursos –? Isto é: não é para estes pontos que as situações de urgência devem ser encaminhadas.

Também refere que “Na maioria dos casos, um doente urgente sujeita-se a ser recebido num serviço sobrelotado, onde poderá ser difícil ser atendido dentro do período de tempo aceitável para o seu caso e onde poderá ser observado por uma equipa médica exausta.” Não é assim, porque os SU dispõem de triagem prévia dos utentes e porque existem, e existirão cada vez mais, comunicações fáceis permitindo o contacto dos transportes com o SU de destino. Mas admitamos que é: durante quanto mais tempo queremos que os doentes sejam ”observado(s) por uma equipa médica exausta” com o atendimento de doentes não urgentes?

12:45 da manhã  
Blogger e-pá! said...

Cara Clara:

Como já deve ter notado continuo vivo e, de vez em quanto, "pico", aqui e acolá!
"Picar" é diferente de infiltrar. É mais epidérmico.

Entretanto, para acalmar a mente, combater o frenesim e deixar que a poeira pouse, tenho ouvido, tranquila e repetidamente - Tania Libertad em "Sin la Luna".
http://www.youtube.com/watch?v=YDfXH1x6_4I

a elected appointment...

No lugar da reforma - as formas em curso. Em livre curso!

5:46 da tarde  

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