domingo, outubro 31

No Reino da Hipocrisia

O deplorável espectáculo a que temos vindo assistir no balancé político entre o PS e o PSD, sob a batuta do Presidente da República, aviva-nos a memória sobre a qualidade dos políticos e das políticas a que o país tem estado exposto, nos últimos trinta anos.

Não deixa de ser lamentável o modo irresponsável como os “líderes” políticos se têm vindo a comportar. De um lado e do outro confrontamo-nos com o produto da “nova geração” de políticos, nascidos e criados nas “escolas” partidárias. No fundamental gente desqualificada, sem cultura, sem densidade técnica ou científica, sem experiência profissional apenas e só, talentosos gestores da palavra prometida, do espaço mediático e dos malabarismos comportamentais.

Para estes políticos o Estado representa a plataforma logística para o desenvolvimento dos respectivos projectos de ambição e de poder. Sobrevoando este universo emerge o único político, verdadeiramente, profissional que o país conheceu nas últimas décadas – Aníbal Cavaco Silva. O mesmo que evocando, insistentemente, a sua condição de professor de economia e finanças nunca foi capaz de compreender o país, de contribuir para a sua reforma e regeneração, incapaz que foi de repensar o respectivo modelo de desenvolvimento tendo, antes pelo contrário, contribuído decisivamente para o seu progressivo afundamento.

Com efeito foi com Cavaco Silva que se afirmou o modelo de investimento não reprodutivo, se transformou o país num enorme festim para os especuladores financeiros, imobiliários e para os abutres Estado-dependentes em matérias de obras públicas. Foi com Cavaco Silva que se iniciaram as pós-modernas e tão inovadoras experiências das PPP’s. Foi com Cavaco Silva que se criaram as bases do “monstro” da administração pública. Foi com Cavaco Silva que o BPN e o BPP floresceram enquanto os Portugueses eram lançados numa espiral suicidária de endividamento.

O bloqueamento do mercado de arrendamento empurrou milhões de famílias para o ilusório propósito de compra, através de financiamento bancário, de “casa própria. Esta terá sido uma das maiores armadilhas que conduziu as famílias a um sufoco previsível num país em que os prazos de pagamento chegaram aos quarenta anos, a cem por cento, com taxas variáveis e spreads usurários enquanto que, na maioria dos países da Europa os prazos médios não ultrapassavam os dezassete anos.

Cumpriu-se assim o eldorado magnífico dos interesses que sempre manietaram o poder político. O bloqueio do mercado de arrendamento, o crédito fácil, embora de natureza usurária, fez florescer a especulação financeira e imobiliária. Foi o tempo dos “patos bravos” com enriquecimento fácil e rápido e o engordamento das offshores. No entretanto, a troco de fundos estruturais para obras e pseudoformação, foi destruído o sector produtivo nacional. Foi com Cavaco Silva que tudo isto aconteceu.

Os governos seguintes, do PS e do PSD, fizeram o resto. Ainda hoje não se vê nenhuma iniciativa governamental contra os cartéis energéticos e das telecomunicações, nenhum incentivo à aquisição de bens, produtos e serviços feitos em Portugal preferindo-se, agravar todos os dias, o grave défice comercial. Do mesmo modo não se vislumbram nenhumas medidas de incentivo à poupança ou de limitação ao endividamento.

Na área da saúde convive-se há muitos anos com o despesismo e a falta de produtividade. Múltiplos sistemas de financiamento e de prestação, sobrepostos e geradores de despesa, deduções fiscais para subsidiar os mais ricos a utilizarem o sistema privado financiando-o, deste modo, indirectamente. Prometendo, legislatura após legislatura, medidas de racionalização do medicamento para logo abdicar ano após ano perante as pressões dos interesses corporativos e económicos envolvidos.

O tempo é de desilusão, de cansaço, de frustração. Precisamos de uma nova classe política e da urgente refundação do sistema político. Como fazê-lo? Talvez fazendo da abstenção o instrumento do protesto e de demonstração de desprezo que esta situação nos merece.

Orwell

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19 Comments:

Blogger PhysiaTriste said...

Excelente texto. Só não concordo com a última frase. Em vez da abstenção defenderia o voto em branco.Com pena que o sistema não permita acolher a sugestão de Campos e Cunha: aos votos em branco deveriam corresponder lugares vazios no Parlamento.
E, já agora, uma pergunta: não será possível exterminar as juventudes partidárias, de que fala Orwell(este que assina o texto, está bem de ver.

7:55 da tarde  
Blogger Joaopedro said...

Um post notável.
Se pensarmoso que o único político, verdadeiramente, profissional que o país conheceu nas últimas décadas – Aníbal Cavaco Silva - com tudo o que de execrável ele personifica, está prestes a ser reeleito PR de Portugal, a esperança dos portugueses num futuro melhor é escassa. Certo é continuarmos neste mundo de hipocrisia que a corte do aníbal e da maria promovem.

9:49 da tarde  
Blogger tambemquero said...

Orçamento à Lapa

PS e PSD chegaram à acordo, como se sabia desde sempre. A encenação não enganou ninguém. A austeridade ficou apenas um pouco mais assimétrica. Os 390 milhões de euros para os injustos benefícios fiscais dirigidos às chamadas “classes médias” terão de ser compensados com mais cortes, provavelmente nas despesas sociais. No entanto, isto são detalhes. O que mais importa já era conhecido: um orçamento para cortar salários, directos e indirectos, um orçamento gerador de desemprego e de recessão. Uma desgraça. Um orçamento com assinatura na casa de Eduardo Catroga à Lapa, com direito a exibição em telemóvel, vincando, também simbolicamente, a submissão do PS aos interesses que contam.

João Rodrigues

9:56 da tarde  
Blogger tambemquero said...

«Ambas as delegações convergiram na necessidade de, a par da sustentabilidade das finanças públicas, reforçar e aprofundar as acções estruturais em curso para a melhoria contínua da produtividade e da competitividade, tendo em vista o aumento do potencial de crescimento da economia, na medida em que consideram ser esta a grande questão estratégica da economia portuguesa.» Termina assim o texto do acordo entre o PS e o PSD para viabilizar o orçamento.

Já nos vamos habituámos a ver os partidos do arco governamental e os economistas do regime jurarem que o problema da economia portuguesa está no seu potencial de crescimento. Esta é a grande questão, dizem, e é aí que devem centrar-se as atenções.

Mas alguém sabe o que pensam os principais partidos sobre o assunto e em que é que divergem? Por exemplo, será que convergem no diagnóstico sobre o peso relativo dos principais constrangimentos que impedem o crescimento da produtividade - qualificações de trabalhadores e empresários, níveis de investimento em inovação tecnológica ou em factores imateriais de competitividade, práticas organizacionais, posicionamento das empresas nacionais nas cadeias internacionais de valor, estrutura e dimensão de empresas, mercado de trabalho, níveis de fiscalidade, custos de bens e serviços intermédios de natureza transversal (e.g., energia, telecomunicações, gás), infraestruturas de transporte e de logística, ordenamento do território, etc.?

E será que concordam nas estratégias a prosseguir para ultrapassar esses constrangimentos - a título de exemplo, privilegiar o desenvolvimento das maiores empresas nacionais (EDP, Galp, PT, construtoras, etc.), mesmo que tal implique custos acrescidos de bens e serviços no tecido económico português? Apostar no desenvolvimento de sectores específicos (e.g., energias alternativas, tecnologias de informação, tecnologias da saúde) ou tentar que a presença do Estado seja tão neutra quanto possível? Continuar a investir no sistema científico e na formação de doutorados, ou fazer depender esse investimento da sua relevância para as empresas? Alargar a base territorial da competitividade da economia portuguesa, ou reforçar as dinâmicas de aglomeração?

E qual o papel que julgam ter os vários instrumentos de política pública na prossecução dos objectivos (e.g., benefícios fiscais, subsídios às empresas, compras públicas, regulação da concorrência)?

PS, PSD e economistas do regime falam do 'problema da produtividade' como se fossem óbvias para todos as origens do problema, as estratégias para o resolver e as medidas concretas a pôr em prática. Não o são. E a incapacidade que revelam na discussão específica destas questões são um dos sinais mais significativos da mediocridade do debate político-económico neste país.

João Paes Mamede

10:00 da tarde  
Blogger DrFeelGood said...

Metas do PSD

«Catroga diz que metas essenciais do PSD foram atingidas».
Com efeito, conseguiram o seu principal objectivo, que era limitar a redução nas deduções fiscais e impor mais cortes na despesa, pondo em causa a operacionalidade dos serviços públicos, obrigados a restrições adicionais. Dito isto, para quem desde Agosto protestava que nunca viabilizaria nenhum orçamento que passasse por qualquer aumento de impostos ou qualquer redução das deduções fiscais, é caso para dizer que baixou muito as suas metas...

Vital Moreira, Causa Nossa

10:35 da tarde  
Blogger Tavisto said...

Compreendo a indignação de “Orwell” quando verificamos que Cavaco Silva, um dos principais responsáveis pela situação a que chegaram as finanças públicas e a economia nacional, não só não sai chamuscado de toda esta crise como se recandidata à Presidência da República com a imagem de garante da estabilidade política e peça fundamental para a saída da crise. Se outra razão não houvesse para o político ser apeado do poder, bastaria a protecção que deu (continuará a dar?) a Dias Loureiro, mantendo-o, até ao limite do aceitável, a salvo da alçada judicial conferida pelo estatuto de conselheiro de estado, bem como a estreita proximidade a muitos outros envolvidos no processo de falência do BPN/Sociedade Lusa de Negócios.
Parece, porém, que a memória colectiva é curta e o eleitorado não vê além de quem no imediato lhe fustiga a pele. Assim, crendo nas sondagens, Cavaco Silva poderá vir a ser eleito à primeira passando do lema da cooperação estratégica ao da desacreditação sistemática do governo, conduzindo rapidamente o PSD ao poder com maioria absoluta.
Subscrevendo muitas das causas apontadas neste poster para explicar a situação de penúria financeira a que chegámos, há uma que me parece determinante e que aqui não é citada. Refiro-me ao procedimento que envolveu a nossa entrada no espaço comum europeu.
Para evitar que se discutisse o processo de adesão em todas as suas consequências e riscos, foi-nos dito pelos responsáveis políticos à altura que o futuro estava assegurado e que, brevemente, o nosso nível de vida seria nivelado pelo da média europeia. Lembro-me de, então, um colega satisfeito me ter dito, o imposto automóvel vai desaparecer vamos ter os Mercedes ao preço dos alemães. Não desapareceu mas, pelos carros com aquela valia que circulam nas nossas estradas, é como se assim fosse e melhor se percebe porque chegámos onde estamos.
Houve quem avisasse, usando a alegoria da “panela de barro/panela de ferro” que a rápida abertura de mercados e a fácil exposição externa da nossa débil economia, poderiam não ser compensadas a prazo pelos vultosos fundos comunitários a entrar no País. Os ventos da história não eram porém favoráveis a quem assim falava e deu-se-lhe o crédito que se dá aos profetas da desgraça, os avisos caíram em saco roto.
Com a queda do muro e a dissolução do decrépito bloco socialista, mais se reforçou a justeza da entrada do País para a CEE e menos importante se tornou discutir as suas consequências, muito menos ainda as resultantes da adopção do Euro como moeda nacional. Tão pouco se cuidou de saber por que outras economias mais fortes teimavam em preservar a sua divisa, Portugal estava dentro e quanto mais dentro melhor. Continuámos a gastar à tripa-forra mas a exportar cada vez menos, pois com uma moeda forte os nossos produtos (os tais bens transacionáveis) perderam poder competitivo num mundo cada vez mais desequilibrado pela globalização.
E agora! Que fazer “num tempo de cansaço, frustração e desilusão”? Ainda por cima com a direita a arreganhar os dentes e uma esquerda que teima em não se encontrar? Também não tenho respostas em definitivo. Sugiro, porém, a leitura do livro póstumo de Tony Judt “Ill fares the land” aqui trazido por Xavier, nele tenho encontrado algumas respostas para os problemas do tempo em que vivemos.

12:04 da manhã  
Blogger Tavisto said...

7,5 milhões de euros para salários de 46 gestores


Desde ajudas ao arrendamento de 55 mil euros ao aluguer de carros por 40 mil euros, há gastos para todos os gostos. Leia alguns exemplos
2009 ficou marcado pela recessão, mas nem por isso os gestores das companhias públicas de transporte, da EP - Estradas de Portugal e dos CTT, uma das maiores empresas do Estado, deixaram de usufruir de regalias.
Só no ano passado, os gastos (salários e despesas) com 46 administradores de nove companhias tuteladas pelo Estado - ANA, STCP, EP, CTT, REFER, CP, ML, CARRIS E TAP - ascenderam aos 7,46 milhões de euros, ou seja, uma média de 162,2 mil euros mensais por gestor, segundo cálculos do SOL baseados nas contas anuais das empresas. Contas feiras, os gestores receberam seis vezes mais do que os trabalhadores das suas empresas, que auferiram 28 mil euros anuais.
Os gastos da administração TAP, liderada por Fernando Pinto - que recebeu 420 mil euros anuais de salário-base - representam um terço do total (ver tabela): cada um dos seis elementos da administração representou uma despesa média de 412 mil euros.
A contribuir para este valor estiveram as ajudas ao arrendamento de habitação de quatro administradores, no valor de 55,4 mil euros. Os gestores da TAP gastaram igualmente cerca de 74 mil euros no renting de viaturas e em combustível.
40 mil euros pelo aluguer de um carro
Os CTT, a segunda no ranking das administrações que mais gastaram em 2009, distribuiu um prémio de gestão de 213,8 mil euros aos seus cinco administradores. O presidente, Estanislau Costa - que circula num veículo de 84 mil euros adquirido pela empresa em 2004 - pagou, no ano passado, 42,5 mil euros para alugar quatro automóveis para os seus colegas de conselho.
As quatro linhas do metropolitano de Lisboa parecem não ser suficientemente utilizadas pelos administradores da empresa, que bateram o recorde de gastos com o aluguer de carros. A antigo administração de Joaquim Reis - agora presidente da Parpública - despendeu 85 mil euros no renting de carros, entre os quais se contam 40,3 mil euros para a viatura do vogal Miguel Roquette, durante nove meses.
Antes de abandonar a empresa, Joaquim Reis decidiu deixar ao seu sucessor um carro novo no valor de 30 mil euros.
Também o presidente da Carris, José Silva Rodrigues gastou 4.142 euros em combustível, no espaço de um ano.
E os administradores da empresa pública com o maior passivo de todas (15,8 mil milhões de euros), a Estradas de Portugal, não se coibiram de gastar 48 mil euros no aluguer de carros e combustível.
Passivo duplica
A aparente fartura do dia-a-dia destes gestores contrasta com a situação das suas empresas. Nos últimos quatro anos, o passivo (ver gráfico) destas nove companhias mais do que duplicou, de 13,3 mil milhões de euros em 2006 para 31,1 mil milhões de euros no final de 2009.
Confrontado com estes números, o Governo pediu, na semana passada, um corte de 15% nos custos das empresas do sector empresarial do Estado. O SOL contactou as empresas de transporte para apurar os seus planos de poupança, mas todos disseram «não ser oportuno falar deste assunto neste momento».
frederico.pinheiro@sol.pt

………..


Como pode o governo de um partido que se reclama da social-democracia consentir numa escandaleira destas? Perante os factos, compreende-se que até de partidos como o CDS e PSD possa hoje receber lições de democracia social. Lições hipócritas dirão; pois que o sejam mas são justificadas.

12:43 da manhã  
Blogger e-pá! said...

REFUNDAÇÃO ou REBELIÃO?

“O tempo é de desilusão, de cansaço, de frustração. Precisamos de uma nova classe política e da urgente refundação do sistema político. Como fazê-lo?...”

Esta pungente interrogação é justa e pertinente. É, também, um salutar convite ao aproveitamento dos momentos de impasse [adiamento] que o País vive para uma reflexão política - um bom exercício democrático.

O sistema político é o condicionador [o modelador] da actual classe política. E o sistema político determina o modelo social e económico. Refundá-lo supõe a existência de uma nova classe política e vice-versa. O círculo vicioso que alimenta e perpetua o status quo.
Dificilmente, a tal “nova classe política” surgirá de geração espontânea, quando os erros, que remontam a tempos tão recuados, permanecem inalterados.

Entramos na revolução industrial tarde e as más horas, tímida e discretamente e, hoje, obrigados ao convívio com uma nova etapa de desenvolvimento, não conseguimos desconstruir as ilusões do ultrapassado modelo industrial, que desenvolveu o Norte e o Centro da Europa, mas empobreceu o Sul [onde incluímos Portugal].

Hoje, as sociedades já não gravitam à volta de modelos de acumulação que foram o cuore da “civilização” industrial. Tornaram-se sociedades programadas, geracionalmente estruturadas e controladas.
Nestas sociedades emergentes, os tecnocratas, em aliança com os burocratas, assaltaram a direcção dos sectores políticos. Utilizam processos pouco transparentes. Assentam o seu poder num complexo sistema de meios técnicos e humanos, tornam-se vendedores de miragens de progesso social, controlam com regras de produtividade os ritmos dos impactos económicos e sociais da produção, tornatam-se obcecados pelo controlo dos mercados [o novo cuore do modelo económico neoliberal] sendo o seu objectivo último manipulá-los…

Fazer política, em Portugal, tornou-se um rentável modo de vida. Os meios sobrepuseram-se às finalidades e no aparelho de Estado e sectores estratégicos da macroeconomia construíram-se sólidos nichos de interesses grupais [partidários, associativos, familiares, etc.] cimentados por altos salários e faraónicas benesses, protegidos pela transmissão amiguista e/ou hereditária de competências e cargos e, finalmente, esvaziados de qualquer tipo cultura democráticas, politicamente diferenciável.
Criaram e alimentam o “Centrão”, não por convicção ou moderação política mas por necessidade de perpetuação da espécie. Essa centralidade permite uma perene adaptação [quer à Esquerda quer à Direita] e uma longa replicação de permanência e domínio do Poder.

Derrubar esta gananciosa rede de interesses e de manipulação política e criar uma nova classe política poderia ser a oportunidade [soberana] da actual crise. Não será.
Fomos empurrados para uma titânica luta [individual e de classe] pela sobrevivência social e económica enquanto os actuais políticos asseguram a permanência nos centros de decisão.
Os “novos” políticos – mesmo os anunciados para Maio, maduro Maio, Quem te pintou, Quem te quebrou o encanto, Nunca te amou, Raiava o Sol já no Sul... - são clones dos actuais, dos de há uma década, de há duas décadas , etc.

Não nascerá tão cedo uma “nova classe” política. A clonagem da actual está em franco progresso. A não ser que uma importante mutação do tecido social [político] permita um salto qualitativo, isto é, a rebelião.

A anunciada greve geral de 24 de Novembro que, não contestando directamente o poder instituído mas as suas políticas [próprias ou concertadas], poderá ser mais importante para a consciencialização social [da mudança] do que muitas das nossas [legitimas] indignações individuais ou interrogações pertinentes…

12:09 da tarde  
Blogger Clara said...

Com menos 500 milhões de euros de receita, o Governo vai ter de decidir onde vai fazer cortes adicionas na despesa, de valor equivalente, já que o PSD se recusou a indicar onde poderia haver essa compensação.
Resta saber, porém, o seguinte: deu o PSD garantias de que respeitará as opções do Governo nesse ponto, e as deixará passar na votação do orçamento? Ou será que se ainda se reserva um poder de veto também sobre isso?

Vital Moreira, causa nossa

Alguém tem dúvidas onde vão ser feitos os cortes adicionais?
Quanto a este PSD já deu mostras do que é capaz. Com a troupe de PPC vale tudo. E tudo farão para comprometer ainda mais o Governo PS.

12:53 da tarde  
Blogger Clara said...

Porque será que quando se fala de Cavaco Silva um grande número de cidadãos portugueses sente receio de expressar o que pensa sobre a austera figura que preside em Belém?
Cavaco Silva não infunde respeito na sociedade portuguesa mas sim receio, receio resultante de suspeita em relação ao que poderá ser a sua "magistratura de influência" com escutas à mistura e outras manigâncias obscuras.
Como refere DO : Ele (Cavaco), que é a política portuguesa em tudo que ela tem de pequeno: os amigos nos negócios, os truques palacianos, o Estado perdulário. Ele, que tão mal se dá com o que na política vale a pena: o confronto de ideias, a coragem de correr riscos, a ética republicana.

1:59 da tarde  
Blogger saudepe said...

«Há uma interrogação que com honestidade cada um deve fazer: Em que situação se encontraria o país sem a acção intensa e ponderada, muitas vezes discreta que desenvolvi ao longo do meu mandato», questionou cavaco. «O que teria acontecido sem os alertas e apelos que lancei na devida altura, sem os compromissos que estimulei, sem os caminhos de futuro que apontei, sem a defesa dos interesses nacionais que tenho incansavelmente promovido junto de entidades estrangeiras?»

Cavaco Silva, anúncio de candidatura

Cavaco Silva também é adepto fervoroso dos Apelos...
Então não é verdade que Cavaco é também co-responsável pela política desenvolvida por este Governo PS?!...
O que Cavaco Silva tem demonstrado durante toda a sua carreira política é não ser parceiro de confiança.
O PPC que se cuide.

2:11 da tarde  
Blogger ochoa said...

A paisagem que temos agora pela frente é de derrota - do país, do Governo, das oposições, mas também do Presidente da República.
Na sua declaração de recandidatura, Cavaco Silva interrogou-se sobre o que teria acontecido sem os «avisos» e os «alertas» que foi fazendo acerca da situação dramática do país. O actual Presidente pretendia enaltecer o seu papel de «árbitro», «moderador» e «amortecedor» das crises políticas, enquanto pai protector e derradeira instância de recurso para evitar a queda no abismo da insolvência nacional. Só que, menos de 24 horas depois, veio a resposta, fulminante: acabou mesmo por acontecer o pior.

Os avisos e alertas de Cavaco não serviram finalmente para nada, apesar de, nas negociações entre o PS e o PSD sobre o Orçamento do Estado (OE), a delegação social-democrata ser chefiada por um antigo e fidelíssimo ministro seu, Eduardo Catroga (que, por sintomática ironia, fazia parte da já vasta coligação de abstencionistas do PSD na votação do OE).

Independentemente das declarações feitas ou propósitos entretanto anunciados por responsáveis do Governo e do PSD, a forma como decorreu a ruptura das negociações confirma a degradação vertiginosa não apenas dos hábitos e costumes políticos domésticos - e do próprio sentido de compromisso que é consubstancial à ideia de democracia, sobretudo em momentos de crise nacional - mas também do carácter dos actores políticos, a sua credibilidade enquanto pessoas e a nobreza da sua palavra.

Que dois cavalheiros respeitáveis, como Teixeira dos Santos e Eduardo Catroga, se acusem mutuamente de mentirosos e trapaceiros - embora recorrendo a termos mais suaves e hipócritas - é, desde logo, uma manifestação inesperada dessa degradação, apesar de estarmos longamente familiarizados com a baixeza dos comportamentos políticos.

Ora, esses dois homens prestaram-se a representar uma farsa mandatada por outros, José Sócrates e Passos Coelho, cujos mesquinhos cálculos partidários e protagonismos pessoais atingiram um grau tão rasteiro que deveria retirar-lhes o que, porventura, ainda lhes resta de dignidade como líderes políticos e estadistas.

Estadistas? Nunca em Portugal, nos últimos trinta anos, essa palavra se terá aproximado tanto, como agora, de uma caricatura grotesca. A mediocridade generalizada das elites dirigentes - no Governo e nas oposições - atingiu de facto o ponto de ruptura, e isso talvez explique, numa altura em que Portugal se encontra ameaçado de bancarrota, a total falta de sentido de Estado que demonstram os mais destacados chefes políticos, a sua irresponsabilidade suicidária face ao risco de uma humilhante servidão do país perante os credores internacionais. Por outro lado, a ruptura das lideranças impulsiona (e reflecte) a ruptura do próprio Estado.

Quando a um péssimo Orçamento do Estado suceder uma receita ainda mais intragável de aumento de impostos ou cortes nos salários e despesas sociais, administrada cegamente pelo FMI, veremos qual será a capacidade de reacção - por actos consequentes e não apenas por protestos palavrosos - dos representantes das forças que se dizem mais ciosas de preservar a soberania nacional.

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Vicente Jorge Silva

2:29 da tarde  
Blogger ochoa said...

.../
A propósito, não deixa de ser significativo que os principais responsáveis sindicais - da UGT e da própria CGTP, imagine-se! -, apesar da greve geral anunciada contra as injustiças do OE, já manifestem preocupação com a eventualidade de o mesmo OE ser chumbado no Parlamento. Como é que se protesta contra algo que, no fundo, se deseja, em desespero de causa, ver aprovado? Eis um dos paradoxos insustentáveis a que chegámos.

O Orçamento para 2011 resulta em grande parte da deriva de um Governo troca-tintas e troca-contas, fugindo sistematicamente a prevenir factos há longo tempo anunciados e, finalmente, constrangido a um apressado e tosco exercício contabilístico, já sem margem de ponderação dos seus tremendos custos sociais e económicos (incluindo o da inevitabilidade de uma recessão que a doutrina oficial insiste pateticamente em recusar).

Face a isto, que nos resta? Submetermo-nos a tremendas arbitrariedades e injustiças que, em larga medida, atingem duramente os mais pobres e ameaçam comprometer, pelo menos, o futuro imediato do país?

A trágica resposta é que parece ser tarde demais - porque chegámos ao ponto a que chegámos - para encontrar alternativas substancialmente melhores ou que, pelo menos, sejam aceitáveis pelos nossos credores externos. E as outras alternativas viáveis ameaçam ser, como a do FMI, ainda mais arrepiantes - embora haja já quem acredite que esse custo talvez fosse preferível a ver o país definhar por tempo indefinido, nas mãos de incompetentes e irresponsáveis.

Uma terapia radical, porque não, ainda que com sacrifício transitório da soberania, da coesão social e do desenvolvimento económico? Só que há um problema: por muito racional que fosse porventura essa alternativa , ela representa hoje um caminho sem regresso.

Não vale a pena iludirmo-nos: a paisagem que temos agora pela frente é de derrota - do país, do Governo, das oposições, mas também do Presidente da República que se recandidata.

O tacticismo dos cálculos eleitorais sobrepôs-se ao interesse nacional e dinamitou quer os compromissos entre as forças políticas quer a vontade e determinação do Presidente da República para agir, enquanto dispunha de instrumentos constitucionais para fazê-lo (até 9 de Setembro, quando ainda era possível dissolver o Parlamento e relegitimar a representação parlamentar).

O fracasso das negociações entre o PS e o PSD é também um fracasso de Cavaco Silva - e ele não soube prevê-lo e avaliá-lo a tempo e horas, deixando que essa sombra afectasse irremediavelmente o anúncio da sua recandidatura.

Nem Sócrates nem Passos Coelho merecem a confiança dos portugueses. Mas Cavaco, apesar da autocelebração a que se dedicou no CCB, também não mostrou a estatura necessária para merecê-la.

2:31 da tarde  
Blogger helena said...

No Reino da Hipocrisia

Este país está um nojo.
Não há nenhum político que mereça a nossa consideração.
Cavaco Silva criou uma corte à sua semelhança.

6:26 da tarde  
Blogger tambemquero said...

Num almoço com militantes na Chamusca, Francisco Louçã disse que a negociação do OE foi uma “enorme encenação de uma semana de encontros e desencontros, de amuos e de namoro”, acrescentando que “serviu milimetricamente a agenda da campanha presidencial de Cavaco Silva”.link

“Toda a cronologia foi subordinada pelo emissário de Cavaco Silva nas negociações, o doutor Catroga”, acusou o líder do BE, frisando que, na sua opinião, o Orçamento foi “assinado à socapa porque [PS e PSD] têm vergonha do acordo que fizeram”.

Segundo Francisco Louçã, “o país não aceita ser um palco para uma jogatana como a do actual Presidente”, referindo também que “este acordo [entre] José Sócrates, Pedro Passos Coelho e Cavaco Silva tem uma receita contra as pessoas, contra o emprego, contra o desenvolvimento, contra a democracia com responsabilidade”.

“Este acordo já provocou um novo buraco de 500 milhões e não nos dizem como resolvem o problema, é um tabu”, disse Louçã, acusando o PS e o PSD de quererem “esconder a resposta aos problemas que as suas soluções já estão a criar”.

JP 31.10.10

6:32 da tarde  
Blogger cotovia said...

O orçamento servia para acalmar os mercados, não era?

Hoje de manhã os juros da dívida soberana portuguesa estavam a baixar. O Jornal de Negócios garantia que isso era consequência do acordo PS-PSD. Agora estão a subir passando a barreira dos 6%. O Jornal de Negócios garante que “a subida dos ‘yelds’ está ser acompanhada de um aumento da percepção de risco sobre o país”. link Em que ficamos, o orçamento cria confiança ou aumenta a percepção de risco e … os juros?

José Castro Caldas

7:09 da tarde  
Blogger e-pá! said...

REFUNDAÇÃO ou REBELIÃO? [I]

“O tempo é de desilusão, de cansaço, de frustração. Precisamos de uma nova classe política e da urgente refundação do sistema político. Como fazê-lo?...”

Esta pungente interrogação é justa e pertinente. É, também, um salutar convite ao aproveitamento dos momentos de impasse [adiamento] que o País vive para uma reflexão política - um bom exercício democrático.
O sistema político é o condicionador [o modelador] da actual classe política. E, serão os sistemas políticos determinantes para os modelos sociais e económicos das sociedades. Refundá-lo supõe a existência de uma nova classe política e vice-versa. Um círculo vicioso que alimenta e perpetua o status quo.
Dificilmente, a tal “nova classe política” surgirá de geração espontânea, quando os enviesamentos e as derivas democráticas, que remontam a tempos tão recuados, permanecem inalterados.

Entramos na revolução industrial tarde e a más horas, tímida e discretamente e, hoje, obrigados ao convívio com uma nova etapa de desenvolvimento, não conseguimos “desconstruir” a canga do ultrapassado modelo industrial, que desenvolveu o Norte e o Centro da Europa, mas empobreceu o Sul [onde incluímos Portugal].

Hoje, as sociedades já não gravitam à volta de modelos de acumulação que foram o cuore da “civilização” industrial. Tornaram-se sociedades programadas, estruturadas e, pasme-se, geracionalmente controladas.
Nestas sociedades emergentes, os tecnocratas, em aliança com os burocratas, assaltaram a direcção dos diferentes sectores políticos. Utilizam processos pouco transparentes, mas expeditos. Assentam o seu poder num complexo sistema de meios técnicos e humanos, tornam-se vendedores de inexistentes de mutações sociais, controlam com regras de produtividade os ritmos dos impactos económicos da produção, tornaram-se obcecados pelo controlo dos mercados [o novo cuore do modelo económico neoliberal] sendo o seu objectivo último manipulá-los…

12:15 da manhã  
Blogger e-pá! said...

REFUNDAÇÃO ou REBELIÃO? [II]

Fazer política, em Portugal, tornou-se um rentável modo de vida. Os meios sobrepuseram-se às finalidades e no aparelho de Estado e sectores estratégicos da macroeconomia construíram-se sólidos nichos de interesses “grupais” [partidários, associativos, familiares, etc.] cimentados por altos salários e faraónicas benesses, protegidos pela transmissão “amiguista” e/ou hereditária de competências [e cargos] e, finalmente, esvaziados de qualquer tipo cultura democrática, politicamente indiferenciáveis.

Criaram e alimentam o “Centrão”, não por convicção ou moderação política [a virtude está no meio…] mas por necessidade de perpetuação dos espécimes. Essa centralidade permite constantes adaptações e acomodações [quer à Esquerda quer à Direita] e uma longa replicação de detenção do Poder.
Derrubar esta rede de interesses e de manipulação que se apropriou da política e criar uma nova classe política poderia ser uma das oportunidades da actual crise. Não será. Fomos empurrados para a luta pela sobrevivência social e económica enquanto os actuais políticos tratam de assegurar a sua permanência nos centros de decisão.

Os “novos” políticos – mesmo os anunciados para Maio, maduro Maio… - são clones dos actuais, dos de há uma décadas, de há duas décadas , etc.

Não nascerá tão cedo uma “nova classe” política. A clonagem da actual está a desenvolver-se num excelente meio de cultura – o neoliberalismo.
A não ser que uma importante mutação do tecido social [político], ou a repentina pujança do conceito de cidadania, permita um salto qualitativo, isto é, que inopinadamente chegue a hora da rebelião.

A anunciada greve geral de 24 de Novembro que, não contestando directamente o poder instituído imerso num poço de especulação e dificuldades, mas tão somente as suas soluções políticas [próprias ou acordadas] com base na sobrevivência económico-financeira, poderá ser mais importante para a consciencialização social [para a mudança], e ao mesmo tempo, a parteira do “novo” político, do que muitas das nossas [legitimas] indignações individuais ou interrogações pertinentes…

12:16 da manhã  
Blogger e-pá! said...

REFUNDAÇÃO ou REBELIÃO? [II]


Fazer política, em Portugal, tornou-se um rentável modo de vida. Os meios sobrepuseram-se às finalidades e no aparelho de Estado e sectores estratégicos da macroeconomia construíram-se sólidos nichos de interesses “grupais” [partidários, associativos, familiares, etc.] cimentados por altos salários e faraónicas benesses, protegidos pela transmissão “amiguista” e/ou hereditária de competências [e cargos] e, finalmente, esvaziados de qualquer tipo cultura democrática, politicamente indiferenciáveis.

Criaram e alimentam o “Centrão”, não por convicção ou moderação política [a virtude está no meio…] mas por necessidade de perpetuação dos espécimes. Essa centralidade permite constantes adaptações e acomodações [quer à Esquerda quer à Direita] e uma longa replicação de detenção do Poder.
Derrubar esta rede de interesses e de manipulação que se apropriou da política e criar uma nova classe política poderia ser uma das oportunidades da actual crise. Não será. Fomos empurrados para a luta pela sobrevivência social e económica enquanto os actuais políticos tratam de assegurar a sua permanência nos centros de decisão.

Os “novos” políticos – mesmo os anunciados para Maio, maduro Maio… - são clones dos actuais, dos de há uma décadas, de há duas décadas , etc.

Não nascerá tão cedo uma “nova classe” política. A clonagem da actual está a desenvolver-se num excelente meio de cultura – o neoliberalismo.
A não ser que uma importante mutação do tecido social [político], ou a repentina pujança do conceito de cidadania, permita um salto qualitativo, isto é, que inopinadamente chegue a hora da rebelião.

A anunciada greve geral de 24 de Novembro que, não contestando directamente o poder instituído imerso num poço de especulação e dificuldades, mas tão somente as suas soluções políticas [próprias ou acordadas] com base na sobrevivência económico-financeira, poderá ser mais importante para a consciencialização social [para a mudança], e ao mesmo tempo, a parteira do “novo” político, do que muitas das nossas [legitimas] indignações individuais ou interrogações pertinentes…

12:18 da manhã  

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