segunda-feira, fevereiro 4

Filhos da puta !

O tal do Estado Social
O Senhor Santos tem 91 anos. Trabalhou desde os 9. Já aprendia o ofício de sapateiro quando fez o exame da quarta classe.
Nos dias de semana acordava às 6 da manhã e fazia quatro quilómetros a pé para ir trabalhar. Estivesse chuva, frio ou sol. Não sabia o que era tomar o pequeno almoço. Logo se via, durante a manhã, se conseguia comer um bocado de pão.
Aos fins-de-semana não descansava nem brincava como qualquer criança de nove anos. Ia para o campo, pois ao fim de semana não ia trabalhar para o sapateiro. Trabalhava sete dias por semana. 9 anos e muitos dentes de leite.
O Senhor Santos teve vários ofícios e profissões. Trabalhou a vida toda.
No ano passado, aos 90, ficou viúvo. Esmoreceu. Decidiu que, finalmente, ia deixar de trabalhar. Arrumou os livros e entregou as escritas que ainda fazia dos vendedores de fruta na praça ou dos cafés que só vendem bicas a um gabinete de escritas organizadas. Parou de trabalhar aos 90.
O Senhor Santos trabalhou dos 9 aos 90 anos. O Senhor Santos trabalhou 80 anos sem parar. Descontou para a reforma a vida toda. Tem uma reforma de miséria, como quase todos os velhos deste país.
Na semana passada o Senhor Santos teve um AVC. Foi de ambulância para o Hospital. Um hospital público, sem direito a regalias ou atenções especiais (no caso, o Hospital de São Bernardo, em Setúbal). Entrou, foi atendido e assistido. Umas horas depois foi mandado para casa com uma receita para aviar na farmácia, que mais parecia uma lista telefónica.
Além da receita passaram-lhe outro papel: uma conta para pagar.
O Senhor Santos teve um AVC e teve de pagar 90 euros no Hospital Público que ajudou a pagar a vida toda. 90 euros! Noventa euros, por extenso. Meia reforma para umas taxas de urgência e para uns exames complementares de diagnóstico. Azar, logo teve que fazer duas TAC’s. 90 euros. Quase toda a reforma de um velho a morrer… E a do mês seguinte para os comprimidos que não lhe deram no Hospital. Meses de reforma ao ar para pagar os cuidados básicos de saúde a que tinha direito. Mais que direito. Mais de 80 anos a trabalhar e a descontar para o Estado.
Filhos da Puta!
Matam quem os criou. Matam quem construiu este país. Matam quem lutou pela vossa democracia, que esta não é a dele. Esta está apodrecida, anémica, doente, moribunda.
Matem as vossas mães, filhos da puta! Matem os vossos pais, filhos da puta!
Desculpem o desabafo…
Sim, o Senhor Santos é meu avô. E sim, o Senhor Santos está um pouco melhor, obrigada.
Está a recuperar. Não havia vaga no Hospital para o internamento. Está a recuperar em casa dos meus pais, que estão a faltar ao trabalho para poderem assisti-lo. Está em casa, à custa dos meus pais que também pagam os seus impostos.
Mas ainda bem que voltámos aos mercados. O Senhor Santos também está feliz por isso. Talvez por essa boa notícia tenha tido o AVC, que está a pagar em prestações mensais.
03/02/2013 por Ana Catarina Santos
…………….
Uma pessoa abre o blogue “O Que Fica do que Passa para lá da espuma dos dias” link lê este texto e sente uma indignação imensa e um desejo irreprimível de gritar filhos da puta!
Tavisto

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5 Comments:

Blogger CPA said...

a taxa moderadora máxima é 50 euros. logo este texto é mentira...

12:52 da tarde  
Blogger CarLoS said...

Mas se matam humanos saudáveis antes do parto, por uma mera questão de oportunidade, ou "rastreio" de seleção eugénica, porque é que fariam excepção para os outros?!! Não estou a desculpar o método, estou a falar da coerência interna da sociedade, que chora baba e ranho por uns e ignora outros (tal como em tempos da escravatura, em que também os escravos eram humanos, mas "invisíveis").

2:35 da tarde  
Blogger AAA said...

É de facto muito triste o que aqui foi relatado.

Só gostava de saber se aos romenos e outros que tais, lhes está a ser cobrado o mesmo quando recorrem aos nossos serviços de saúde.

Para o senhor Santos os votos das rápidas melhoras.

9:52 da tarde  
Blogger Tavisto said...

Um esclarecimento

A taxa máxima a cobrar numa ida à urgência é efectivamente de 50 euros. Salienta-se, taxa máxima por episódio de urgência. Ora, nada no texto nos diz que o valor cobrado a este senhor correspondeu a apenas a uma ida ao SU. É bem possível que o senhor Santos tenha sido observado mais de uma vez antes de ser internado, situação comum nestas circunstâncias.

9:35 da tarde  
Blogger Clara said...

CPA, comentário sacana tipo liberal pacotilha.

10:59 da manhã  

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