domingo, janeiro 12

Prontos para o debate


As notícias das últimas semanas são arrasadoras para o nosso Sistema de Saúde. Quando se olha do lado do doente, deparamo-nos com o flagelo e sofrimento dos que não têm alternativa ao SNS, traduzido em incontáveis tempos de espera para acesso e de permanência no Serviço de Urgência (várias horas, um dia, às vezes mais); inacessibilidade a meios complementares de diagnóstico mesmo em situações com indicação absoluta e prioritária (problema das colonoscopias, entre outros); acesso restrito a consultas hospitalares que, nalgumas especialidades e em vários hospitais, podem ser superiores a 1 ano; persistência de doentes sem médico de família ou que, apesar da reforma em curso, não conseguem aceder ao seu médico dentro das 24-48 horas recomendadas.
Quando olhamos para dentro do Sistema, confrontamo-nos com a parasitação do SNS pelo sector privado (Cruz Vermelha e agora o caso Sanfil, que longe de serem únicos são paradigmáticos); pelo próprio sector público (caso dos subsistemas públicos); por alguns profissionais (50 médicos a receberem entre 25 e 43 mil euros mensais ou a trabalharem em simultâneo em 5 unidades públicas de saúde). Com opacidades (ocultação de tempos de espera para cirurgias e consultas, produção adicional em horário normal) e baixa qualidade produtiva (taxas de infecção hospitalar de 10%); com um sistema ineficiente de controlo do trabalho (pontómetro); com o total desprezo pelas normas de incompatibilidades, com …………….
Sabíamos que, à semelhança do que se passou na Grécia, a política de austeridade a qualquer preço iria ter também entre nós consequências nos indicadores de saúde (alguns já conhecidos: como o aumento da mortalidade infantil ou a taxa de infecção por BK, outros o futuro revelará). Seria, porém, demagógico e pouco sério atribuir-se a este governo e a este ministro da saúde, a responsabilidade única pelo actual estado de coisas. Sabemos que muitas delas, em particular as que resultam da mais aviltante promiscuidade público/privada e, há que dizê-lo, público/público, não são de agora, embora emerjam nestes tempos de crise de forma aguda e irrefreável.
Poder-se-à admitir que muitas das notícias têm origem no próprio governo e visam denegrir num primeiro tempo para arrasar mais tarde o nosso modelo de saúde, em particular o SNS. É bem possível que assim seja, mas nem por isso o rei deixa de ir nu. Compete pois a todos nós individualmente e às organizações profissionais (Ordens, Sindicados, Associações) travar o mais profundo debate em torno destas questões, apresentar soluções e exigir ao poder político as reformas necessárias ao reforço do SNS. Só desta forma poderemos mostrar aos Portugueses que o nosso modelo não é o responsável das insuficiências vindas a público, mas é ele também vítima da ganância e venalidade de uns quantos. Que só podemos sair deste atoleiro com mais SNS, através de um melhor investimento em Saúde e da total clarificação das relações entre os diferentes prestadores.
Tavisto

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