domingo, janeiro 12

Prontos para o debate


As notícias das últimas semanas são arrasadoras para o nosso Sistema de Saúde. Quando se olha do lado do doente, deparamo-nos com o flagelo e sofrimento dos que não têm alternativa ao SNS, traduzido em incontáveis tempos de espera para acesso e de permanência no Serviço de Urgência (várias horas, um dia, às vezes mais); inacessibilidade a meios complementares de diagnóstico mesmo em situações com indicação absoluta e prioritária (problema das colonoscopias, entre outros); acesso restrito a consultas hospitalares que, nalgumas especialidades e em vários hospitais, podem ser superiores a 1 ano; persistência de doentes sem médico de família ou que, apesar da reforma em curso, não conseguem aceder ao seu médico dentro das 24-48 horas recomendadas.
Quando olhamos para dentro do Sistema, confrontamo-nos com a parasitação do SNS pelo sector privado (Cruz Vermelha e agora o caso Sanfil, que longe de serem únicos são paradigmáticos); pelo próprio sector público (caso dos subsistemas públicos); por alguns profissionais (50 médicos a receberem entre 25 e 43 mil euros mensais ou a trabalharem em simultâneo em 5 unidades públicas de saúde). Com opacidades (ocultação de tempos de espera para cirurgias e consultas, produção adicional em horário normal) e baixa qualidade produtiva (taxas de infecção hospitalar de 10%); com um sistema ineficiente de controlo do trabalho (pontómetro); com o total desprezo pelas normas de incompatibilidades, com …………….
Sabíamos que, à semelhança do que se passou na Grécia, a política de austeridade a qualquer preço iria ter também entre nós consequências nos indicadores de saúde (alguns já conhecidos: como o aumento da mortalidade infantil ou a taxa de infecção por BK, outros o futuro revelará). Seria, porém, demagógico e pouco sério atribuir-se a este governo e a este ministro da saúde, a responsabilidade única pelo actual estado de coisas. Sabemos que muitas delas, em particular as que resultam da mais aviltante promiscuidade público/privada e, há que dizê-lo, público/público, não são de agora, embora emerjam nestes tempos de crise de forma aguda e irrefreável.
Poder-se-à admitir que muitas das notícias têm origem no próprio governo e visam denegrir num primeiro tempo para arrasar mais tarde o nosso modelo de saúde, em particular o SNS. É bem possível que assim seja, mas nem por isso o rei deixa de ir nu. Compete pois a todos nós individualmente e às organizações profissionais (Ordens, Sindicados, Associações) travar o mais profundo debate em torno destas questões, apresentar soluções e exigir ao poder político as reformas necessárias ao reforço do SNS. Só desta forma poderemos mostrar aos Portugueses que o nosso modelo não é o responsável das insuficiências vindas a público, mas é ele também vítima da ganância e venalidade de uns quantos. Que só podemos sair deste atoleiro com mais SNS, através de um melhor investimento em Saúde e da total clarificação das relações entre os diferentes prestadores.
Tavisto

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sábado, janeiro 5

Sustentabilidade da Saúde

Na pág. 60 do relatório da OCDE "The status of health in the european union: towards a healthier europe", coordenado por Vittorio Silano coadjuvado por Luciano Vittozzi, relativamente ao subtema Demands on healthcare services, uma perspectiva interessante (porque diferente) da (previsível) sobrecarga da oferta, derivada do envelhecimento da população (como sabem, é apontada como razão para maior crescimento futuro das despesas em saúde face aos respectivos PIB e invocada por razões de sustentabilidade do sistema): as gerações recentes (mais novas) são, em média, mais bem formadas (do ponto de vista de hábitos de promoção de comportamentos de vida saudável e prevenção) do que as gerações mais velhas. Estas são também igualmente, em média, mais saudáveis do que as que as precederam.
Deste modo, a sobrecarga da oferta (maiores riscos de comorbilidades, limitações de actividade física, doenças crónicas e saúde mental) pode ser parcialmente compensada por menores custos de entrada de novos doentes no sistema. Doentes mais «bem educados», por isso menos pesados justificam um investimento continuado e persistente em políticas de promoção da saúde e prevenção da doença. Os destinatários destas políticas não têm sexo nem idade.
Em países com NHS, como o nosso, não estamos sós. Temos uma estrutura de estado social de apoio à debilidade e à doença, com a perspectiva de rápido retorno à vida activa. Os governos destes países não têm desculpa para não investir nesta área; não é coerente com a necessidade de assegurar sustentabilidade futura.
Francisco cabral, facebook

Importante, no entanto…
A entrada de novos doentes no sistema resulta directamente do estado de saúde dos cidadãos em função das determinantes da saúde prevalecentes na população dum determinado lugar (país) num determinado tempo.
Como sabemos, as determinantes da saúde são de diversa natureza como contexto  demográfico e social (cultura, política, género, factores socioeconómicos e capacidade comunitária), ambiente físico (condições de vida e de trabalho), dimensões individuais (legado genético e comportamentos) e acesso a serviços de saúde (kirch, 2008).
Não pondo em causa os avanços culturais da nova fornada de cidadãos os riscos ligados aos comportamentos permanecem muito elevados (álcool/drogas/hiv/sida).
Uma coisa é certa, no nosso país não vai haver dinheiro nem vontade política para investir nestas políticas nos próximos tempos (prevenção). Devemos contar que a grande machadada que este governo está a dar no financiamento da Saúde e rendimento dos portugueses determinará alterações profundas do estado de saúde da população e prejuízo grave da sustentabilidade do SNS.
"The status of health in the european union: towards a healthier europe" link

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terça-feira, dezembro 11

Sustentabilidade do SNS (2)

Financiamento da Saúde
O financiamento da Saúde faz-se desde sempre por recurso ao Orçamento do Estado: o Governo discute e decide a fatia desse bolo global que será atribuída à Saúde.
Uma vez que a Constituição estipula que cabe ao Estado a criação e gestão do SNS, criou-se a convicção generalizada que tem que ser o orçamento geral da Nação a suportar os custos.
Daí resultam incapacidades e ineficácias de gestão tremendas, como referi em post anterior: orçamentos baseados no histórico, variações inesperadas do total atribuído no ano, impossibilidade de previsões e programas plurianuais, impossibilidade de definição com rigor do custo dos atos produzidos, impossibilidade de dar a cada doente uma factura  personalizada ( não cobrável) dos custos causados por cada tratamento.
Muitas vezes já o Tribunal de Contas, auditando as contas se referiu a estas irracionalidades , sem qualquer resultado, embora com melhorias significativas que a longa  experiência vai permitindo.
Acresce ainda que esta forma de orçamentação faz com que o cidadão não faça ideia de qual é a sua contribuição para a saúde.
Apenas sabemos que uma enorme fatia ( de 7 a 10 mil milhões de euros, nos últimos anos) sai do orçamento, mas cada um de nós desconhece quanto efetivamemnte contribuiu para as despesas do sector.
Talvez por isso, muito frequente é ouvirmos pessoas afirmando os seus direitos porque pagam os seus impostos para a Segurança social.
Uma grande percentagem da população não sabe que a Segurança Social nada tem a ver com o financiamento da Saúde( e ,já agora, que não há Caixas há quarenta anos!).
Defendo , sem sucesso até agora, que a forma mais justa, mais equitativa, que nos colocaria a todos iguais no ato  da prestação de serviços e bem conhecedores de quanto pagamos, seria a criação de orçamento próprio para a Saúde, à semelhança do que sucede para a Segurança Social e em tantos países da U.E.
Tal como a Segurança Social que dispõe de orçamento próprio constituído pelas contribuições dos trabalhadores e patronato, também a Saúde teria o seu próprio financiamento feito por impostos consignados a esse fim.
Os vários milhares de milhões de euros seriam diminuídos dos nossos impostos gerais “aliviando” o orçamento geral e passaríamos a pagar, de acordo com a nossa capacidade económico, um imposto  consignado à Saúde.
Então, dado que cada um pagaria de acordo com a sua capacidade económica, estaríamos todos em igualdade de direitos no ato da prestação de cuidados, saberíamos com rigor a nossa contribuição e o sector teria uma visão clara da sua situação financeira.
Não sou a favor de um copagamento diferenciado pela riqueza de cada um na altura da utilização dos serviços, pela complicação burocrática que isso provocaria e pela denúncia da riqueza ou pobreza do cidadão que procura o serviço, introduzindo nefastas desigualdades no atendimento
Semelhante à “Assurance Maladie” francesa, este sistema, estudado e configurado em rede com as  regiões de saúde, pelos especialistas nestas matérias, traria  um enorme ganho à racionalização e escrutínio das despesas.
Atrevo-me mesmo a afirmar que um imposto consignado à saúde, do mesmo valor que o actualmente vindo do orçamento geral,  seria suficiente nos primeiros anos.
Será que o Dr. Paulo Macedo concorda?

Paulo Mendo


Boa noite,
Acabo de ler a posição do Dr Ferreira do Amaral sobre o financiamento da Saúde.no post que publicou do Saudesa de hoje.
Há anos que venho dizendo e repetindo esta mesma proposta, sem que ninguém dela tome conta: nenhum economista, nenhum  grupo estudioso se interessou pelo assunto e continua a ser opinião generalizada que o financiamento tem que vir do Orçamento de Estado  porque a Constituição ( que se está  a tornar um velho  espartilho do Restelo) assim o exige..
Ora eu julgo que, não só, não exige, como nem é preciso tocar-lhe.
Na tentativa de mudar o sistema, apresentei publicamente, como Ministro da Saúde, em 1995, um estudo, elaborado pela equipa do Prof. Diogo Lucena, como texto  base  para discussão pública, que deve andar perdido ou escondido em alguma gaveta do Ministério e dos múltiplos órgãos de comunicação social a quem foi profusamente distribuído.
Foi por isso, com grande surpresa e alegria esperançosa que vi  a posição coincidente com a minha do Prof. Ferreira do Amaral.
Ainda há um mês,  em 10 de Novembro, publiquei no Blog “Portugal Contemporâneo”  um “post”, sobre o tema. Aqui o transcrevo (acima).

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segunda-feira, dezembro 10

Sustentabilidade do SNS


Para Ferreira do Amaral, o Serviço Nacional de Saúde (SNS)  deve ter um orçamento próprio, com financiamento consignado pelas receitas do Estado.
O professor universitário defende que uma parte do IRS seja consignado ao SNS, de modo a que a população saiba quanto estão a pagar e para introduzir transparência no processo.  “O facto de não haver orçamento próprio faz com que estas receitas venham competindo com as outras, o que levou à criação de uma bola de neve de dívida”.
JN 10.12.12

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terça-feira, outubro 2

SNS: racionamento ou racionalização?

Duas notas para frisar alguma informação que sendo pacífica está pouco difundida. 
Em saúde são inúmeros os exames, actos e tratamentos (cuidados) que apresentam benefícios superiores ao seu custo, muitas vezes extremamente elevado, pelo que nenhuma sociedade tem ou terá algum dia recursos suficientes para os financiar a todos. Daí a necessidade de adoptar critérios que permitam extrair os maiores benefícios globais em saúde para os recursos disponíveis na sociedade em causa. 
Se globalmente as decisões não merecem muita contestação, ao nível microeconómico, seja das especialidades, das doenças e dos doentes, ninguém parece perceber ou aceitar por que não há recursos para o tratamento daquele doente em particular. As opiniões do próprio doente, ou familiar, estão naturalmente marcadas pelo interesse próximo, pela situação de dependência e pela subjectividade. Por outro lado as posições do médico, agente do doente, deverão ser apoiadas em informação adequada e fundamentada, técnica e socialmente. 
Por isso cada sociedade deve decidir que tecnologias e cuidados financiar e deve fazê-lo transversalmente e de modo equitativo, sem discriminação de doentes e regiões. Tratando-se de um serviço público (SNS) a decisão terá ainda que obedecer aos requisitos de transparência, tornando pública a informação, fundamentando os motivos da decisão e permitindo que seja objecto de debate com os interessados e de intervenção dos reguladores. 
Neste debate dois conceitos são importantes, a racionalização e o racionamento. 
A racionalização tem em vista obter os maiores benefícios por euro gasto, sempre avaliando os custos e benefícios envolvidos. Nestes incluem-se os resultados em saúde, através por exemplo dos anos de vida ajustados pela qualidade, e também os benefícios da qualidade, clínica – eficácia dos actos, sua apropriação, grau de adesão a protocolos –, de tempo de espera e de aceitabilidade para o doente, como seja da satisfação com a relação e com as instalações. 
O racionamento corresponde a negar ou limitar o acesso a cuidados de saúde. 
O racionamento toma muitas formas, sendo porventura a mais radical o pagamento do preço, como quando o doente não tem qualquer tipo de cobertura. Num SNS o racionamento adopta as seguintes formas, vide artigo anexo: link 
Negar o financiamento, fixando um número limite de actos por ano ou excluindo outros, sejam eles estéticos ou de baixa eficácia clínica. 
Seleccionar os doentes, exigindo exames acrescidos ou requerendo critérios adicionais para acesso, como sejam, a idade, não ser fumador ou obeso. 
Diferir no tempo os cuidados através de listas de espera. 
Transferir o doente para outras instituições, como sejam sociais, ou sujeitar o doente ao pagamento dos actos e produtos necessários. 
Diluir o serviço prestado, reduzindo os recursos, assim afectando a qualidade e limitando o acesso aos cuidados. Assim, para reduzir o internamento cirúrgico bastará limitar o número de horas da consulta de cirurgia ou do bloco operatório. 
Caso queiramos ir além do coro dos que se limitam a defender a todo o custo o status quo e a exigir o “tudo para todos já”, teremos de referir três pontos essenciais. 
O primeiro é a necessidade de preservar, se possível ainda melhorar, a confiança do doente no médico e nas suas decisões, como seu agente orientado por uma óptica de saúde embora apoiada em informação que, como já se disse, se quer transparente, fundamentada e sujeita a regulação. 
Depois devemos antecipar alguns efeitos indesejáveis ou porventura mesmo perversos. Pode acontecer que um determinado fornecedor explore a posição (exclusiva) ganha numa tecnologia seleccionada, como seja subir o preço ou aviltar a qualidade, ou que haja limitações quanto à inovação futura. 
Finalmente haverá que garantir que a eficácia dos cuidados esteja suficientemente provada, o que pode estar ainda longe de acontecer, vide anexo. link 
Assim, tudo isto assegurado, a abordagem deveria começar por análise custo-benefício às tecnologias e cuidados mais dispendiosos, dentro dos que provaram ser clinicamente eficazes. Esta análise deveria ser apoiada e validada por clínicos, representantes dos doentes e da população. 
Esta abordagem pode ser concretizada através da criação de um organismo tipo NICE do NHS ou, talvez melhor, pela adopção dos critérios do NICE, adaptando-os à realidade portuguesa através de um grupo de peritos com a composição referida e dentro de acordo-quadro ao nível do SNS. 

A Dias Alves

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segunda-feira, fevereiro 28

O Modelo da Engenheira

No dia 24.2.2011, foi feito o lançamento do 1º número dos “Cadernos Saúde e Sociedade”, uma revista coordenada pelo Dr. Adalberto Fernandes e aberta a várias correntes de opinião, que procura promover o debate objectivo sobre os problemas da saúde em Portugal em que estivemos presentes. Para essa sessão foi convidada como conferencista a engª Isabel Vaz, presidente do grupo Espírito Santo Saúde, que aproveitou a ocasião para apresentar o seu “modelo” para a saúde em Portugal que, segundo ela, garantiria a sustentabilidade do SNS. link

De uma forma sintética podemos apresentar esse “modelo” da seguinte forma. Actualmente gasta-se em Portugal com a saúde dos portugueses o correspondente a cerca de 10% do PIB, sendo 7% (70%) pago por fundos públicos e os restantes 3% (30%) suportados directamente pelos portugueses. E a proposta da presidente do ES Saúde resume-se no seguinte: os 3% do PIB suportados directamente pelos portugueses passariam a ser utilizados, na sua totalidade, em adquirir seguros de saúde, com os quais os portugueses teriam a liberdade de ir depois adquirir aos prestadores de serviços de saúde, públicos ou privados, esses serviços, pagando depois o Estado o resto (com os 70% de fundos públicos gastos actualmente com a saúde dos portugueses). As companhias de seguros e eventualmente as ADS´s fariam contratos com os prestadores de serviços de saúde (públicos e privados), e assim os portugueses ficariam com liberdade de escolher. Como era natural que os 3% do PIB gastos directamente pelos portugueses não fossem suficientes para adquirir os seguros de saúde, o Estado financiaria aqueles que não tivessem meios suficientes, para eles também terem liberdade de escolha entre serviços públicos e privados. É um “modelo” simples que certamente ampliaria o mercado dos grupos privados de saúde embora com custos imprevisíveis para o Estado e para os cidadãos.

Durante a sessão coloquei a Isabel Vaz, entre as múltiplas questões que tal “modelo” levanta, apenas uma, que foi a seguinte. É sabido que no sector da saúde os investimentos são muito caros, e os custos crescem muito rapidamente. Como é que se garantiria a sustentabilidade do SNS desta forma, duplicando os prestadores (públicos e privados) que concorreriam entre si em pé de igualdade mas sendo assegurado o seu financiamento pelo Estado? Como é que se garantiria que muitos serviços, incluindo hospitais, não ficassem subutilizados por falta de “clientes” determinando para o País custos acrescidos? Como que o Estado sendo obrigado a financiar de igual forma os serviços privados e serviços públicos, tudo dependendo da escolha (procura) aleatória dos utentes (e sabe-se que os grupos privados são exímios na utilização do marketing para captar clientes, muitas vezes até de forma enganosa) não corria o risco de, para além de ter de financiar os privados, ter ainda de suportar os custos de muitos serviços de saúde públicos que ficariam “às moscas”? . Perante estas questões incómodas, e não estando preparada ou não querendo responder, a presidente do ES Saúde apenas soube dizer que esta visão era “estalinista” (o frágil “verniz democrático” da presidente do ES Saúde estalou rapidamente) e que o “mercado” (mais uma vez os “mercados” cujas consequências o País e os portugueses já conhecem bem) resolveria o problema, determinando o fecho daquelas unidades de saúde que não tivessem “clientes” suficientes.

No entanto, o “modelo” defendido pela presidente do ES Saúde merece que nos debrucemos sobre ele até para que fiquem claras outras facetas. Em primeiro lugar, o facto do acesso à saúde em Portugal passar a depender de se ter um seguro de saúde, e sendo este fundamentalmente fornecido por grandes grupos económicos, para além de ser já um grande negócio para as seguradoras destes grupos, iria depois também permitir a estes condicionar a escolha dos portugueses na preferência por este ou aquele prestador de serviços de saúde. E isto até porque essas seguradoras iriam estabelecer contratos com alguns dos prestadores, preferencialmente os pertencentes ao respectivo grupo económico. Basta lembrar o que sucede actualmente com os bancos que concedem um empréstimo e procuram condicionar o seguro de vida que exigem para que seja feito no companhia de seguros do grupo.

Em segundo lugar, embora a presidente do ES Saúde tenha apresentado o seu “modelo” como aquele que garantiria a sustentabilidade do SNS não apresentou um único dado que provasse essa afirmação. Ela não possui quaisquer estimativa de custos quer para o Estado quer para os portugueses. A experiencia de outros países, como é o caso dos Estados Unidos que tem um modelo que assenta em seguros de saúde, revela que é um modelo extremamente caro (os EUA gastam com a saúde da população o correspondente a 15% do PIB, portanto mais 50% do que média europeia), e provoca uma elevada exclusão (nos E.U.A. existem mais de 50 milhões de americanos sem acesso à saúde, precisamente por não poderem pagar um seguro de saúde, que o actual presidente está a procurar resolver, mas que enfrenta forte oposição de importantes “lobbies”). O que diferencia o modelo americano da proposta de Isabel Vaz, é que no primeiro caso os seguros de saúde são financiados pelas empresas e pelos próprios, enquanto em Portugal seriam financiados pelo Estado e pelos portugueses.

Em terceiro lugar, a liberdade escolha assente em seguros de saúde controlados fundamentalmente por grupos privados, embora a presidente do ES Saúde tenha dito que o Ministério da Saúde, através das ARS´s também poderia concorrer neste mercado com privados, o certo é que levantaria problemas graves à sustentabilidade de muitas unidades de saúde pública. Com a redução de utentes e, consequentemente, do seu financiamento seriam levadas a fechar. E com a progressiva redução do sector público de saúde, e sem a concorrência deste, os grupos privados rapidamente dominariam o mercado da saúde em Portugal, e certamente aproveitariam esse domínio para impor as suas condições. Veja-se o que acontece em mercados como é da energia, onde dominam. Desta forma também o acesso de todos a serviços de saúde como estabelece a Constituição da República não ficaria garantido, pois só teriam acesso a eles os que pudessem pagar o valor fixado. É certamente por esta razão que o PSD está tão interessado em alterar a Constituição precisamente neste ponto.

Com o aumento da esperança de vida aos 65 anos e, consequente, envelhecimento da população, e com o aparecimento continuo de novos medicamentos e de novos equipamentos que permitem prolongar a vida humana com um mínimo de qualidade, os custos da saúde tendem continuamente a aumentar. O desperdício nesta área determinada por duplicações de prestadores, de equipamentos, só poderá ser mais caro para o País e para os portugueses. Mais que qualquer outra área, já que o bem saúde é um bem diferente de todos os outros bens, pois o que está em causa é a vida humana, e por isso deve ser garantido a todos os portugueses, para que isso seja possível é necessário evitar o desperdício, as duplicações de serviços que são extremamente caros. Por isso a intervenção do Estado neste sector é fundamental, e o domínio do mercado como defende Isabel Vaz só poderá determinar uma situação em que este bem vital fique acessível apenas aos que têm dinheiro, até porque os recursos do Estado são escassos.

Eugénio Rosa, economista

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quinta-feira, outubro 14

Sustentabilidade do SNS

Luís Filipe Pereira link
"É preciso perceber a nossa capacidade para continuar a financiar o SNS, a 100%. É importante também lembrar que a sociedade portuguesa não consegue crescer há dez, onze anos. Ora, sem crescimento, é impossível manter a situação actual. Dou um exemplo; desde 1995 e até ao ano de 2010, os custos do SNS subiram de 3,1 biliões de euros para 10 biliões de euros, ao mesmo tempo que o crescimento do país estagnou. As pessoas devem ter estes factos bem presentes".

António Correia de Campos
link
"O problema da sustentabilidade financeira põe-se em relação ao SNS como em relação aos sistemas mais liberais do mundo. Os EUA apostaram num modelo ultra-liberal que provou ser insustentável, já que consumia 15% a 16% do PIB. Se olharmos para França, por exemplo, onde a Segurança Social paga parte substancial das despesas com saúde, encontramos dificuldades financeiras para acompanhar o aumento das necessidades da população, as transformações verificadas ao nível das patologias e a evolução tecnológica".
Não se deve encarar o aumento de custos como uma fatalidade, irremediável. "A análise comparada dos países da OCDE mostra que as nações mais desenvolvidas cresceram muito na sua despesa com Saúde, nas décadas de 70 e 80, mas que desaceleraram na década de 90 e daí em diante. Se, no início, estes países cresciam entre 5% a 7% ao ano, hoje crescem a 2,5%, ou 3%. Portugal, até 2005, cresceu em matéria de despesas de saúde a uma taxa anual nunca inferior a 5%. Contudo, desde esse ano a subida foi sempre menor. Ou seja, o sistema chegou a um ponto de maturidade, deixou de precisar de tantos novos serviços, unidades e hospitais. Temos, hoje, a clara noção de que é possível conter a despesa .

JMF, 24-09-2010

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sexta-feira, agosto 24

Sustentabilidade do SNS


Como vai a discussão pública do relatório?

1.- Uma publicação conturbada
Após largas semanas de cativeiro, CC decidiu, finalmente, libertar o Relatório no Portal da Saúde. Entretanto publicado no blogue de um conhecido jornalista (1).

«No dia em que Izmailov (que, entretanto, já marcou um golaço ao Porto) chegou a Lisboa para assinar pelo Sporting, CC libertou o Relatório da Comissão para a Sustentabilidade do Financiamento do Serviço Nacional de Saúde...»
link

CC, confirmou, na altura: «estando controlada a execução orçamental no SNS, não haverá lugar, no presente mandato, à alteração do actual modelo de financiamento do sistema de saúde estando pois excluídas a criação de qualquer novo imposto, e alterações ao sistema de isenções das actuais taxas moderadoras.»

Para o é-pá o destino a dar ao relatório era claro: «Em minha opinião o relatório deve ser publicamente discutido, apesar da "suspensão" ditada pelo MS.»
link
E, adiante, acrescentava: «o "actual destino" do relatório é uma questão de oportunidade. Resta saber se será, também, uma questão de oportunismo. E tal qual uma mitológica Fénix poderá renascer das cinzas, na próxima legislatura.»

2. - Discussão pública, ponto de situação : Zero…
Segundo o DE (23.08.07), zero foi este o número de contributos que o ministro da saúde recebeu para a discussão pública do relatório que apresentou propostas para garantir a sustentabilidade do modelo actual de financiamento do SNS.
O portal da Saúde é o meio mais utilizado e aí não foi contabilizado nenhuma contribuição para a discussão pública.

A dúvida persiste: chegará CC a decidir a implementação de algumas das propostas da comissão? Ou, na próxima legislatura, renovada a maioria absoluta (?), CC terá condições para mudar de agulha?

(1) Nota: Não temos conhecimento que CC tenha ordenado qualquer inquérito a esta situação. Como é possível que um relatório, pago pelo OE, seja divulgado em primeira mão por um particular? Os cidadãos contribuintes têm direito a ser esclarecidos sobre estas frequentes fugas de informação. E quem são os responsáveis.

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segunda-feira, julho 16

O destino do Relatório

Em minha opinião o relatório deve ser publicamente discutido, apesar da "suspensão" ditada pelo MS.link
Todos se lembram da condicionante inclusa na nota de divulgação - "por ora!"
Depois, pelo respeito que nos deve merecer o trabalho da Comissão, independentemente, das legitimas discordâncias e reservas que nos colocam as análises e as recomendações, aí contidas.
Se embarcarmos no seu (politicamente) cómodo arquivamento (no fundo da gaveta), estamos a alinhar com o desprestígio - e a declarar a inutilidade - de todas as futuras comissões que se venham a constituir na área da saúde para estudo de situações concretas e relevantes.
O expedito arquivamento deste relatório, não é (não foi) politicamente fundamentado. O que foi dito sobre o SNS é mais ou menos isto: está insolvente, mas ainda não faliu!
Baseia-se na inoportunidade política que por sua vez está amarrada ao ciclo político governamental (segunda metade da legislatura).
Portanto, o "actual destino" do relatório é uma questão de oportunidade. Resta saber se será, também, uma questão de oportunismo.

E tal qual uma mitológica Fénix poderá renascer das cinzas, na próxima legislatura.
É-Pá

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terça-feira, junho 26

SNS, sustentabilidade financeira

"A sustentabilidade financeira de qualquer serviço nacional de Saúde é o que os cidadãos do país quiserem que seja".

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segunda-feira, junho 25

Finalmente!

O Relatório da Comissão para a Sustentabilidade do Financiamento do Serviço Nacional de Saúde saiu da gaveta. link


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sexta-feira, novembro 24

Sustentabilidade do SNS








Acabo de ver CC no “ Negócios da Semana” (SIC Notícias).

Sobre o trabalho da Comissão para a "Sustentabilidade do Financiamento do Serviço Nacional de Saúde", CC aceita tudo menos uma proposta para a implementação de um sistema de co-pagamentos no ponto de encontro das prestações (por comprometer o acesso dos utentes).

Depois de ter justificado as "taxas de utilização" (estas não comprometem o acesso dos utentes, porque CC, assim, decretou) com os argumentos moralizadores do costume, o ministro referiu que as “medidas duras” previstas no OE/2007 (redução generalizada de 6% do preço dos medicamentos, taxas de utilização, actualização das taxas moderadoras, redução do encargo com medicamentos hospitalares a negociar com a Indústria) garantirão o cumprimento do orçamento da Saúde do próximo ano.
Para 2008, com o crescimento previsto da economia, é de prever um aumento significativo do financiamento do Estado para a Saúde.
Com mais algumas medidas da Comissão (competentíssima) há-de ser encontrado o almejado equilíbrio financeiro para o SNS. Deus assim queira.

Quanto às Parcerias da Saúde prevê-se o arranque da primeira concessão, o Centro Hospitalar de Cascais, para o primeiro semestre do próximo ano (O JAS assim espera).
Quanto à 2.ª vaga, CC promete um cocktail PPP (com e sem prestação de cuidados).

Amanhã (daqui a algumas horas) temos CC na Conferência Internacional sobre o Financiamento da Saúde, onde serão apresentadas e discutidas várias alternativas para a Sustentabilidade do Financiamento do SNS. Assim esperamos.

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