quinta-feira, junho 4

SNS: mudar de paradigma

SNS: mudar de paradigma (Parte I)
Por norma apenas passo os olhos, ao de leve, pelos artigos de opinião de Marques Mendes na Visão. O artigo desta semana, porém, interessou-me mais do que é habitual. Devo confessar que o li com atenção e que o considero o melhor artigo de opinião ali publicado por Marques Mendes.
O artigo, pretendendo fazer teoria sobre a sustentabilidade da Segurança Social acaba por fazer teoria geral útil para os demais setores do Estado, nomeadamente para o Serviço Nacional de Saúde.
É um bom documento, que pode servir de orientação estratégica, em especial para a oposição, particularmente para o Partido Socialista.
Anda este Partido a discutir e aprovar «bagatelas» no âmbito do seu projeto de programa eleitoral para remendar o SNS em vez de discutir soluções políticas para o reformar. As soluções até agora conhecidas e propostas no referido projeto «não representam qualquer mudança de modelo nem alteram o paradigma existente»
Ora, desde a sua criação, o SNS desenvolveu-se/tem-se desenvolvido em torno de dois paradigmas bem diferentes. O primeiro paradigma, que eu chamaria de gestão pública tradicional, de matriz claramente keynesiana, vigente de 1979 a 1990, e o segundo paradigma, iniciado com a Lei de Bases de 1990, que ainda perdura e não se sabe onde pode vir a parar (talvez na destruição do SNS), de matriz claramente neoliberal, que eu chamaria de paradigma da nova gestão pública (NGP).
A NGP (New Public Management) teve origem ideológica nos anos 90, na chamada Nova Direita inglesa (New Right), uma ideologia, portanto, reacionária (de reação contra o Estado Social, em primeiro lugar), com o fundamento explícito de modernizar a gestão pública, mas com o objetivo implícito («gato escondido com o rabo de fora») de destruir o Estado Social. Alguns partidos (o Partido Trabalhista inglês de Tony Blair e PS português) acreditaram no objetivo explícito e não viram claramente o objetivo implícito. Continuam a não ver, pelos vistos.
Tem sido este objetivo implícito, porem, aquele que tem orientado a governação da saúde nos últimos anos. Em particular a governação do PSD (e da direita em geral), mas também a do PS, que tem caído no logro da inevitabilidade, colaborando, compactuando com destruição do SNS. O PS tem-se limitado a fazer filhos em mulher alheia (na Lei de Bases de Saúde, do PSD) e, pelos vistos, não quer outra coisa, parecendo, embora, o contrário.
Parecendo ter-se dado conta do logro, o PS mais não faz, mas não pretende fazer do que remendos no SNS.
Impõe-se uma rutura, se é a rutura que dizem que querem, uma mudança de paradigma, se querem salvar o SNS. Mudar de paradigma é começar por discutir a atual Lei de Bases da Saúde e propor ao eleitorado, claramente, uma nova Lei de Bases que defina claramente qual é o paradigma de SNS que pretendem para o país.
«O caminho só pode ser o de mudar de modelo». Defendo que não deve ser nem o da gestão pública tradicional, nem o da nova gestão pública entendida como «fuga para o direito privado», «gestão empresarial privada», «privatização», «mercado, mercado, mercado». Um modelo intermédio entre a salvaguarda dos valores e princípios da gestão pública tradicional e os métodos e técnicas de gestão empresarial. Gestão empresarial não é sinónimo de gestão privada, nem de empresarialização.

Gregorio Nazianzo

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