domingo, abril 8

Liberalização das Farmácias (3)

No Post Liberalização das Farmácias , de 02.04.2007, o Xavier informa-nos de que a proposta de lei 199/2007, sobre a liberalização da propriedade das farmácias, vai ser discutida na generalidade na AR no dia 12 de Abril e apresenta os tópicos mais relevantes nela contidos.

1. - A importância das farmácias é por demais evidente. “Sendo obviamente de enorme importância em termos de saúde pública, o mercado do medicamento tem também uma muito significativa importância económica. Em 2003, as vendas de medicamentos ultrapassaram, no nosso país, os 3,6 mil milhões de euros. … Do montante anterior, mais de 80%, cerca de 3,1 mil milhões de euros, correspondem a vendas das farmácias portuguesas” (refere o Relatório Final para a AdC apresentado pelo CEGEA, CRN, da Universidade Católica).

2. – Como se refere neste relatório, o actual enquadramento normativo da actividade das farmácias, obviamente da responsabilidade do Estado, é tão apertado que, praticamente, abrange todos os aspectos, entre eles os seguintes:
- a propriedade e a localização geográfica das farmácias (só farmacêuticos diplomados em Portugal e onde o Governo disser);
- a abertura que só pode ocorrer por iniciativa de entidades administrativas e nos locais que estas determinam;
- a fixação pelo Estado dos preços dos medicamentos sujeitos a receita médica, (constituem o principal negócio das farmácias), sob proposta do detentor da respectiva autorização de entrada no mercado,
- não sendo às farmácias permitido praticar descontos sobre os preços assim determinados;
- a interdição de selecção da gama de produtos que pretendem vender ou a busca da localização mais adequada e de minimizar custos fixos por não poderem acumular farmácias.

3. As farmácias não podem ser responsabilizadas pela rentabilidade supra-normal muito significativa de que disfrutam, e que não vi posta em dúvida por ninguém. “Os cerca de 85 mil euros que cada farmácia conseguiu, em média, de resultado líquido, em 2003, correspondem a uma taxa de rentabilidade das vendas de 6,8%”, enquanto que “entre as pequenas e médias empresas retalhistas registadas nos Quadros de Situação Sectoriais do Banco de Portugal, a rentabilidade média das vendas é de 1,2%, ou seja, um quinto da conseguida pelas farmácias”. Se estas afirmações estiverem certas, tudo isto será a resultante do enquadramento normativo da sua actividade, obviamente da responsabilidade do Estado porque ninguém acusa as farmácias de desrespeito da lei. As farmácias poderiam apenas ser acusadas de serem favorecidas pela distracção ou pelo esbanjamento do Estado, o que certamente ninguém estranharia que acontecesse mais uma vez.

4. Também por isso, “Portugal é, entre os países que estudamos, aquele que mais gasta em medicamentos, quer em percentagem das suas despesas de saúde, quer em percentagem do PIB” (Relatório citado). E, de longe, a maior parte da despesa com medicamentos é suportada pelo SNS que, como é sabido, enfrenta o problema da sua sustentabilidade financeira.

5. Se este quadro está correctamente desenhado, precisa realmente de ser alterado e, ao que me parece, abrem-se ao MS duas vias:
- actuar sobre a fixação da margem das farmácias, porventura gradativamente, mas com decisão, de forma a reduzir para uma expressão aceitável a taxa de rentabilidade das vendas (6,8% em 2003), sem prejuízo da alteração de alguma da regulamentação mais dissonante quer internamente quer no contexto da EU;
- apostar em que a correcção se fará num quadro concorrencial, como foi opção dos autores do Relatório para a AdC e, nesse caso, a P.L. n.º 199/2007 a discutir no próximo dia 12 será apenas a primeira de várias, se efectivamente houver o propósito de atingir os resultados desejáveis. Como, de resto, consta das recomendações do mesmo Relatório.

6. Seja qual for a via escolhida pelo MS, do ponto de vista da economia de recursos a intervenção dirigida à prescrição medicamentosa, como diversas vezes foi referido aqui no Saudesa, afigura-se como susceptível de produzir resultados mais palpáveis e mais sustentáveis. Isto, claro, se o objectivo é reduzir a despesa do SNS, embora sem afectar a qualidade e segurança do tratamento a que todos temos direito.

7. Nada mais teria a acrescentar se (Post Liberalização das Farmácias (2) , de 03.04.2007), o Vladimiro Jorge Silva (VJS) não viesse afirmar: “Neste contexto, o mercado da Distribuição Farmacêutica tal como o conhecemos (que actualmente vive de margens estreitíssimas, que chegam a ser chocantes para analistas habituados a outros sectores de actividade) tenderá a colapsar, …” (o sublinhado é meu). É que não estamos perante uma divergência meramente pontual. Para mim que, confesso, não sou mais do que o sapateiro perante a estátua de Fídias, se aceitamos como boa esta afirmação de VJS, temos de deitar fora o Relatório acima referido. Isto é:

8. Que VJS me perdoe, mas é necessário explicar, pelo menos com igual consistência:
- se a taxa de rentabilidade das vendas das Farmácias foi de 6,8% em 2003 contra 1,2% para as pequenas e médias empresas retalhistas e, se estes dados estão errados, quais são e por quê os que se lhes devem contrapor;
- se os cerca de 85 mil euros de resultado líquido que cada farmácia conseguiu, em média, em 2003, correspondentes àquela taxa de rentabilidade das vendas, estão correctos e, qual a expressão dos factores (preços e quantidades) que geraram aquele resultado. Porque me habituei a considerar que as farmácias estão na linha da frente quando pensamos na qualidade da sua gestão e, consequentemente, na minimização dos respectivos custos fixos.

9. Não ignoro que as margens actuais da distribuição farmacêutica sofreram redução em 2006 e 2007. No entanto, é sabido que a cotação das farmácias continua em alta como se pode ver pelos montantes praticados no respectivo trespasse.

10. Também considero que as actuais imposições de serviço público que impendem sobre as farmácias devem ter um preço e que daí derive a justificação de uma taxa de rentabilidade mais elevada do que a das pequenas e médias empresas retalhistas; mas deverá haver uma medida para tudo.

11. Finalmente, fico com a impressão de que uma das preocupações dos intervenientes no Saudesa vem do receio de poder excessivo que a P.L. n.º 199/2007 possa provocar ao permitir que a mesma entidade possa deter mais que uma farmácia. Pergunto-me no entanto se esse receio de perda de clientela (ou de influência) será razoável, quando o limite é colocado em quatro farmácias, mesmo admitindo que nenhuma delas será a de Pinhel ou a de Freixo de Espada-à-Cinta. E muito mais quando, no quadro actual, nenhuma das farmácias intervém, directamente, em qualquer negociação, mas sim através da ANF que representa a totalidade das suas associadas.
AIDENÓS

6 Comments:

Blogger Farmaceutico de Oficina said...

Caro Aidenós,

Terei muito gosto em discutir detalhadamente a questão da percentagem da rentabilidade das vendas e muito importante, o ratio entre rentabilidade das vendas e percentagem Margem Bruta , no contexto:

Farmácias Portuguesas versus Grandes grupos de distribuição presentes no Relatório da AC.

Farmácias Portuguesas versus Farmácias Europeias cujos indicadores temos acesso (Cadeias de farmácias de grandes multinacionais com relatórios de contas publicados na Internet)

Farmácias Portuguesas versus Farmácias Francesas

Farmácias Portuguesas versus Pequenos Retalhistas (central de Balanços do BP)

Farmácias Portuguesas versus outras empresas Portuguesas.

Infelizmente temo não ter o tempo necessário porque sábado vou de férias e ainda tenho muitos assuntos a tratar. Para onde vou também não terei acesso à Internet, neste contexto gostaria com anuência do Xavier de caso seja oportuno voltar a debater o tema.

12:35 da manhã  
Blogger Farmaceutico de Oficina said...

O famoso estudo da AdC é medíocre... toda a gente “papagueou” os resultados “zurziu” nas farmácias e na ANF sem ter o cuidado de ir às fontes consultar os dados e analisar criticamente as conclusões

É curioso que de um lado o “estudo” da AdC agrega as cerca de 2700 Farmácias e compara-as com grandes grupos de distribuição. MC e JM..

Por outro lado comparam as farmácias com os chamados pequenos retalhistas constantes na central de balanços do Banco de Portugal.

Ora do meu ponto de vista as comparações realizadas foram a mesma coisa que comparar alhos com bugalhos, por várias ordens de razões:

1- No caso dos grupos de distribuição não se considerou o Impacto dos Juros do serviço da divida de ambos os grupos na erosão da % da rentabilidade das vendas (na altura a JM tinha uma dívida de 1,5 mil milhões de euros em 2000; 1,2 mil milhões de euros em 2001 ; 837 milhões em 2002; 715 milhões em 2003.

2- No caso da Modelo Continente não foi bem calculada a Margem Bruta das Vendas que foi apresentada como sendo 20,5% quando na realidade foi de 25,88%; por outro lado não foi considerada a erosão da % da rentabilidade das vendas resultante do pagamento das rendas à Sonae Sierra empresa do mesmo grupo que recebe as rendas dos Hipermercados;

Curiosamente se fosse com a venda das operações do Brasil no caso da JM o balanço está mais equilibrado e quer os lucros quer a percentagem da rentabilidade das vendas aproximam-se mais das Farmácias

As farmácias regra geral não apresentam grande endividamento resultante de políticas de expansão agressiva como tais como JM ou MC.
As farmácias não apresentam valores percentualmente significativos no pagamento de rendas imobiliárias. As farmácias normalmente não pagam rendas porque as lojas lhes pertencem, ou porque são rendas antigas ou ainda porque não ocupam sites prime,

Penso que também que não é honesto comparar-nos com os pequenos retalhistas em que sabemos a contabilidade regra geral não traduz o total de facturação, havendo como os dados da própria DGI o afirmam uma fuga ao fisco generalizado. A acreditar nos valores da Central de Balanços do Portugal deveremos acreditar que esses empresários trabalham para aquecer?

Alguém me disse (não tenho dados objectivos em relação a esta afirmação) que no distrito de Lisboa o conjunto de Farmácias pagou mais impostos IRC e IRS do que o conjunto de todo o pequeno comércio do Distrito...


Passo a transcrever alguns comentários da DGI sobre o termo de comparação

Mais de metade das empresas não pagou imposto sobre os rendimentos (IRC), declarando, na maioria, resultados nulos ou negativos em 2002. Os números mostram a "enorme evasão fiscal" registada em Portugal.
58% das empresas não pagou qualquer imposto sobre os rendimentos (estatísticas oficiais), pelo que o IRC apenas foi cobrado a 133 mil empresas, de um universo de 366 mil.
Prejuízos (37%) e resultados líquidos nulos (12%) foram os argumentos invocados pelas empresas para não pagarem IRC, depois de, em 2000 e 2001, a percentagem das empresas com lucros não ter ultrapassado os 51%.
Os dados da Direcção Geral de Contribuições e Impostos "comprovam uma vez mais a dimensão do fenómeno da fraude fiscal, já que não é crível que, em média, metade das empresas portuguesas operem, por três anos a fio, sem lucros".
Das empresas que efectivamente pagaram IRC em 2002, o imposto médio liquidado foi de 21,5 mil euros, mas a maioria apenas pagou um valor inferior a cinco mil euros.

No total, o IRC cobrado em 2002 elevou-se a 2.864 milhões de euros, menos 12,5% que em 2001.

No seu conjunto as Farmácias Pagaram em 2003 – 108,5 Milhões de Euros do Impostos <> 3,7% do total do IRC nacional, apesar da sua margem bruta representar apenas 0,614% do PiB.

1:55 da manhã  
Blogger Clara said...

Mais uma análise inteligente e oportuna do Aidenós.
Votos de Boa Páscoa para um dos melhores colaboradores da saudesa.

9:32 da manhã  
Blogger Vladimiro Jorge Silva said...

Um pequeno esclarecimento ao Aidenós: quando me referi a "Distribuição Farmacêutica" estava a falar das empresas distribuidoras que vendem medicamentos às farmácias, cujo papel é decisivo no sistema, pois é proibida a aquisição directa de medicamentos pelas farmácias à indústria.
Estas empresas há muito que passaram grande parte da sua margem para as farmácias e actualmente vivem com margens ilíquidas de cerca de 1% ou menos. Ou seja, são empresas que vivem quase na corda bamba e por isso são extremamente vulneráveis a pequenas variações no número de clientes, nos prazos de pagamentos destes, etc.
Lembro-me que aqui há uns anos uma destas empresas, a Farbeira, era a quarta maior do distrito de Coimbra no ranking da facturação e não aparecia sequer na lista das 200 primeiras no top de resultados líquidos (e nesse ano não houve qualquer acontecimento extraordinário que eventualmente pudesse ter afectado o RL).
O possível colapso da distribuição tal como a conhecemos poderá levar ao aparecimento de situações como a que referi noutro comentário: neste momento, no Reino Unido, apenas as farmácias da Boots podem vender medicamentos da Pfizer.
A entrada de novos agentes no sector das farmácias levará inevitavelmente à criação de redes de farmácias, que podem surgir sob várias formas, com modelos semelhantes aos que hoje vemos nos franchisings existentes noutros sectores de actividade: uma empresa mãe que assegure o financiamento, gestão, decoração, arquitectura, etc. de cada farmácia poderá cobrar royalties sobre as vendas e desse modo condicionar fortemente a sua actuação, sem que com isso se viole o princípio das "4 farmácias".
Aliás, tenho a certeza de que o mercado saberá ser suficientemente imaginativo nesta matéria, pois a experiência mostra que este tipo de restrições são facilmente contornáveis (veja-se o exemplo das falsas propriedades que existem actualmente). Ironicamente, o principal potencial franchisador que surge no mercado é a própria ANF...:)
Em relação ao resto do texto do Aidenós, parece-me uma reflexão honesta e bem fundamentada. Deixo apenas mais uma nota: a margem legal das farmácias portuguesas (18,25%) neste momento é a mais baixa da Europa (e já o era antes de CC ter intervido). Se CC realmente pretendesse diminuir a "rentabilidade excessiva" das farmácias, bastaria que diminuísse a capitação (número de habitantes por farmácia) para valores próximos dos 2000 ou 2500. Aliás, é estranho que, perante tanto alarido, CC continue sem abrir uma única farmácia (Manuela Arcanjo, sem a décima parte do show-off, abriu mais de 200...) e mesmo a lei actual não esteja a ser aplicada (sem qualquer alteração legislativa seria possível um aumento imediato de mais de 10% no número de farmácias).
Ou seja, esta está longe de ser uma questão bem esclarecida pelo governo.

12:54 da tarde  
Blogger aidenós said...

Caro Vladimiro Jorge Silva:

Antes de mais, obrigado pelo seu Comentário e pelo esclarecimento do sentido restrito (e próprio) em que tinha utilizado a expressão “Distribuição Farmacêutica”: (empresas que vendem às farmácias). Destas empresas são as margens estreitíssimas; das farmácias, estamos de acordo, é a situação bem mais confortável que, consensualmente, lhes é reconhecida.

Quanto ao mais, (continuando a assumir que sou apenas sapateiro…) há dois pontos retomados no seu Comentário e em relação aos quais me parece que não teremos a mesma posição: i) o colapso, que quase anuncia, da distribuição e consequências que lhe atribui; ii) a criação de redes de farmácias, as várias formas que podem assumir e as vias (ou atalhos) para lá chegar.

- i) A Distribuição Farmacêutica: não conheço a regulamentação que o M.S. terá pensada para o sector do medicamento, mas o que me ocorre perguntar é se esta será uma intermediação imprescindível, ou seja, se as farmácias terão de continuar proibidas de comprar directamente à indústria farmacêutica ou se a respectiva margem, ainda que baixa, poderá ser abatida no preço final que os clientes terão de pagar. Se a intermediação tiver de ser mantida, porque é importante a função de central de compras que desempenha para as farmácias, os seus receios parecem-me excessivos – se não fossem, como se compreenderia que a ANF estivesse nesta área com cerca de 50% do total? – e deverão ser avaliados. Mas, se é importante e lhe interessa, por que há-de a ANF deixar que entre em colapso? O normal será que, sem prejuízo da liberdade contratual, os custos da função compra sejam assumidos por quem vende ao público.

- ii) A criação de redes de farmácias, as várias formas que podem assumir e as vias (ou atalhos) para lá chegar. Também aqui me parece que o VJS está a assumir uma posição preventiva, embora reconheça razão para o seu alerta: se acontece noutras latitudes, será de recear que possa acontecer aqui, se os interesses são os mesmos e se o quadro legal tiver pontos de fuga. Mas pode não ter, ou seja, o quadro legal e regulamentar deve dificultar, a acção inspectiva deve dissuadir, a AdC tem uma função a cumprir, a própria ANF, que, evidentemente, tem uma ética de colaboração no interesse público a respeitar, pode, também aqui, desempenhar um papel importante. E, se, como se diz, há já vários casos em que a proibição de acumular farmácias foi contornada, sabemos que isso resultou das elevadas estimativas de lucro que oferecem e da menos compreensível permissividade do sistema que não funciona como devia e tanto como devia.

De qualquer modo, obrigado pelo Comentário.

Caro Eduardo Faustino (EF):

Obrigado pelos seus Comentários, afinal, apenas separados um do outro por 12 horas. Não tenho a certeza, mas admito que o segundo tente cumprir a promessa do primeiro. E faço votos que não tenha prejudicado a sua agenda de trabalho e, muito menos, as suas férias que desejo sejam boas.

Registo que não contesta “Os cerca de 85 mil euros que cada farmácia conseguiu, em média, de resultado líquido, em 2003” nem a taxa de rentabilidade correspondente de 6,8%, referida no Relatório para a AdC. O que contesta é que: - i) a taxa de rentabilidade das pequenas e médias empresas de distribuição tenha sido de 1,2%, em 2003; e que: - ii) o resultado líquido das farmácias possa ser comparado com o dos grandes grupos de distribuição. Vejamos.

- i) No primeiro ponto a razão que invoca é a evasão fiscal das pequenas e médias empresas de distribuição. A afirmação estará, infelizmente, correcta; já quanto à conclusão, não tenho a certeza porque não sei em que medida é um exclusivo das pequenas e médias empresas de distribuição e parece que a própria DGCI também não tem, pois que, indiciado o fenómeno, não adopta as medidas adequadas. De qualquer modo, as estatísticas do Banco de Portugal são as que temos.

- ii) O Relatório para a AdC afirma que “o volume de negócios agregado das farmácias é ligeiramente inferior ao de empresas como a Modelo Continente SGPS ou a Jerónimo Martins SGPS. No entanto, o resultado líquido agregado das farmácias excede em 37% o lucro conjunto daquelas duas empresas.”

EF rejeita esta comparação porque: estas empresas têm políticas agressivas que geram recurso ao crédito e portanto juros, o que não acontece nas farmácias. Porém, não distingue entre juros de capital e juros correntes. Ora só estes oneram os resultados do exercício. A dívida de 715 milhões em 2003, que EF refere como a de JM, é claramente uma dívida de capital, cujas condições de amortização desconhecemos, mas que só pelos juros correntes vão influir na taxa de rentabilidade.

O que poderemos dizer é que:

- o montante da facturação agregada das farmácias em 2003 foi inferior quer ao de JM quer ao do MC; o lucro conjunto destas empresas, também em 2003, continua claramente inferior ao resultado líquido agregado das farmácias, mesmo se (só para conceder, porque nada o justifica) na despesa de JM+MC deduzirmos juros, à taxa de 3% (21,450 milhões), correspondentes à dívida de JM naquele ano. Teríamos então resultados líquidos de 210,8 milhões (Farmácias) contra cerca de 175,318 milhões (JM+MC) o que daria uma razão, não de 1,37, mas ainda de 1,23%. A força da argumentação do Relatório para a AdC não sai anulada: menos de metade do volume de vendas produz resultados líquidos significativamente maiores que os de JM+MC;

- recorrer ou não a capitais alheios é decisão dos investidores. Ignoro se os proprietários das farmácias recorrem ou não, mas qual seria a instituição bancária a recusar crédito para remodelação ou aquisição de uma farmácia, quando é consensual que o risco do negócio é mínimo e a rentabilidade é muito elevada?

- cabe igualmente aos proprietários das farmácias a decisão de utilizar instalações próprias ou arrendadas e, nos casos em que as instalações são também propriedade sua, surpreender-me-ia que a respectiva renda não fosse considerada do lado da despesa da farmácia.

Cara Clara:

Agradeço e retribuo os votos de Boa Páscoa!

11:05 da tarde  
Blogger Vladimiro Jorge Silva said...

Caro Aidenós: porque é que acha que a ANF comprou a Alliance Unichem? Obviamente, para se poder constituir como a principal rede de farmácias a operar em território nacional! E quem foi o MS que abriu a porta? Naturalmente, António Correia de Campos, a quem João Cordeiro um dia disse "que ainda haveria de agradecer"!
É óbvio que a ANF não entrou no negócio da distribuição inocentemente. Aliás, seguramente muito melhor do que eu, a ANF sabe o que espera as empresas da distribuição farmacêutica tradicional, que dificilmente sobreviverão ao aparecimento das cadeias de farmácias. É uma questão de aritmética e pura sobrevivência!
Não me parece que, com uma legislação que não limite a propriedade de farmácias (ou que, de alguma forma, a ligue à Direcção-Técnica), seja possível evitar o aparecimento de redes de farmácias.
Por outro lado, um cenário de compras directas à indústria por parte das farmácias individualmente poderia ser ainda mais caótico (quem conhece minimamente a distribuição farmacêutica sabe de que é que eu estou a falar - se mesmo os pequenos armazéns têm dificuldades em viver com a ditadura da IF, o que dizer das pequenas farmácias...).
Cada um dos laboratórios da IF actua como um verdadeiro monopolista: só a Merck é que vende produtos da Merck, só a Sandoz vende produtos da Sandoz, só a Pfizer vende Pfizer, etc. E quem não quiser cumprir as regras impostas pela IF... não compra à IF. É por isso que no Reino Unido os produtos da Pfizer só se vendem na Boots e há neste momento um movimento global no sentido de gerar novos acordos do género. No limite, poderemos ver-nos num cenário em que se o médico nos prescrever medicamentos de 4 laboratórios diferentes, poderemos ter que ir a 4 redes de farmácias diferentes... o que é que isto faz à concorrência e à livre escolha do prescritor?
O crónico atraso em que Portugal vive tem pelo menos a vantagem de nos permitir ver o que é que aconteceu nos países que, antes de nós, seguiram uma determinada via. Como diz o povo, "para onde CC vai, já outros de lá vêm". E, pelo que se vê em outros países, seguramente que não iremos para melhor!
(oportunamente comentarei a sua resposta ao EF - que está de férias, provavelmente a rir-se de nós todos entre um mojito e uma piña colada!)

12:53 da manhã  

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