SNS - Até quando?
Evidências
1. Na sua intervenção link , o político CC chamou pelo reputado economista da saúde, que foi e ainda é, para justificar e, implicitamente, enaltecer as decisões estratégicas que o CC político tomou e outras que se propõe tomar ou, pelo menos dinamizar. Diria que teve mais êxito como economista, enunciando muito bem, a meu ver, a pluralidade de factores ou de dependências que afectam as decisões de saúde, mostrando que as decisões raramente podem ser o que gostaríamos que fossem e que a evidência científica não está ela só nas motivações do decisor que, no entanto, a não pode ignorar nem esquecer, mas antes promover. E disse: “É, portanto, mais pragmático e mais útil falar em política de saúde alertada para a evidência (“evidence-aware policy”), uma formulação mais realista, mais do que a, ideal e abstracta, política assente na evidência (“evidence-based policy”)”. Igualmente muito bem, quando afirmou que “isto é válido ao nível das decisões políticas estratégicas, ao nível da gestão regional ou institucional e ao nível da prática clínica quotidiana”. Já não foi tão feliz no propósito de enaltecer a acção desenvolvida e as decisões estratégicas tomadas, ao colocar no mesmo plano medidas já implementadas, ou pelo menos com princípio de implementação, e outras que o cidadão desconhece e não pode conhecer porque não atingiram ainda o terreno. Mas não há por onde o negar: foi uma boa intervenção, consistente e, sobretudo hábil, do ponto de vista da sua afirmação pessoal e política. Como quem diz: é assim que entendo que deve ser; se não for, procurem os responsáveis, os tais lobies políticos (onde quer que se situem no espectro partidário), de interesses (profissionais ou outros), não clamem contra mim.
2. Muito consistente, como se esperaria, é também o texto de PKM, no DE link , do qual me parecem de relevar dois pontos:
i)-o reforço da opção defendida por CC (uma política de saúde alertada para a evidência (“evidence-aware policy”), aduzindo as razões que a justificam numa perspectiva europeia: “as preocupações com o crescimento descontrolado dos custos com os cuidados de Saúde, o crescente cepticismo do público acerca da eficácia dos sistemas de Saúde tradicionais (bem percebida pelo sector privado: vide debate de Sábado, 12.05, na RTP-N, reivindicando participar na contratualização anual da prestação de serviços), persistentes falhas na qualidade percepcionada dos serviços de Saúde e as ameaças globais de crises de Saúde pública …” Tudo coisas das quais também por aqui temos ouvido falar e que são sérias, e não apenas do mundo virtual, como o demonstra o recente inquérito em que 25% das respostas (se não estou em erro) vão no sentido de que o SNS deve tomar o SPS como incentivo para melhor a sua performance;
ii)- O evidenciar que “a Agenda de Lisboa adquiriu centralidade na geração de evidência para a decisão em políticas de Saúde”. O melhor é mesmo continuar a citar PKM: “A relação entre intervenções para a optimização do investimento nos sistemas de Saúde europeus e as intervenções de Saúde pública assume um papel central na distribuição de recursos e obriga a repensar os programas nacionais de Saúde e respectivas orientações e prioridades”.
3. É nesta sequência que vem a intervenção do É-Pá, ao qual é devida justa homenagem: incansável, sempre disponível e pronto a trazer-nos ensinamentos e opiniões, fazendo alarde de uma diversidade de cultura que o deixa à vontade, esteja o que estiver sobre a mesa da discussão, trazendo ao seu discurso muitas afirmações que, em si mesmas, estão certas e, por isso mesmo, são irrebatíveis a não ser pela pertinência lógica ou pelo alinhamento na temática que, em concreto, esteja em discussão e onde é suposto devam inserir-se.
4. Não quero repetir os três primeiros Comentários que, até este momento, a intervenção do É-Pá mereceu. A mim, pareceu-me uma intervenção nim, ou, se preferirem, do tipo “sim, mas talvez”. Nisso não há mal nenhum, porque é evidente que pode haver acordo na generalidade e discordâncias, até profundas, na especialidade. Ponto é que as discordâncias sejam bem precisadas e fundamentadas e que se contraponham alternativas caracterizadas pela exequibilidade, pelo menos com igual exequibilidade, perante o fundamental que esteja em jogo. Ora, será só insuficiência ou azar meu? Li muito atentamente a intervenção do princípio até ao fim e não foi o que encontrei.
5. CC e PKM falam de política de saúde alertada para a evidência (“evidence-aware policy”), uma formulação mais realista, mais do que a, ideal e abstracta, política assente na evidência (“evidence-based policy”)”? O É-Pá contrapõe que “As questões colocam-se ao nível das evidências científicas “disponíveis”, isto é, das metodologias utilizadas para a sua obtenção e, consequentemente, do seu valor e qualidade” e ”o conceito de “evidência científica” vai sendo paulatinamente qualificado” e eis que disserta sobre os vários entendimentos da evidência, mas sempre fazendo tábua rasa das preocupações em discussão;
6- Todos nós também sabemos, e nunca nos passou pela ideia sustentar o contrário, que a elaboração de protocolos terapêuticos ou guidelines não é uma tarefa simples, implica a consideração de muitos dos aspectos referidos pelo É-Pá e, porventura, ainda de outros, assim como sabemos que, na sua definição, os médicos devem ter participação dominante e decisiva. Mas será que teremos de aceitar levar a homenagem à tradicional liberdade de prescrição médica até ao colapso do SNS? Será que o juízo do médico isolado, sem necessidade de qualquer justificação perante a sua hierarquia (não perante os órgãos de gestão), deve prevalecer sobre o entendimento de outros médicos, escolhidos pelo seu perfil e competência para a definição dos protocolos a observar e das normas a seguir para que estes possam ser postergados? Onde é de presumir que está a maior e melhor evidência? Não será já o tempo de nos convencermos de que, se as medidas adequadas não forem tomadas, o risco não será o de chegarmos “a conhecer “listas de espera terapêuticas”, mas sim o de elas nos serem impostas porque a universalidade, a generalidade e a equidade de um SNS, incapaz de se regular e controlar, terão definhado e desaparecido perante o desafio do SPS, ele sim, capaz de se definir de acordo com as suas conveniências? A EU – a tal de cuja média do PIB nos só atingimos 70% - já se convenceu. E nós, queremos voltar à posição de orgulhosamente sós? Ficamos satisfeitos por participarmos no financiamento dos 6 biliões de Euros que a EU vai investir nos próximos 7 anos e que só aos outros aproveitariam?
AIDENÓS
Como diz o Xavier “Coincidência ou não, CC abordou, numa intervenção pública recente, a importância da evidência na decisão da política de saúde «a qual deve ser alertada para a evidência (-“evidence-aware policy")», enquanto PKM, no DE (10.05.07), retoma o mesmo tema defendendo a sua importância na fundamentação da política de saúde”. Depois, aparece a intervenção do É-Pá (Post Racionalização terapêutica de 12.05.2007).
1. Na sua intervenção link , o político CC chamou pelo reputado economista da saúde, que foi e ainda é, para justificar e, implicitamente, enaltecer as decisões estratégicas que o CC político tomou e outras que se propõe tomar ou, pelo menos dinamizar. Diria que teve mais êxito como economista, enunciando muito bem, a meu ver, a pluralidade de factores ou de dependências que afectam as decisões de saúde, mostrando que as decisões raramente podem ser o que gostaríamos que fossem e que a evidência científica não está ela só nas motivações do decisor que, no entanto, a não pode ignorar nem esquecer, mas antes promover. E disse: “É, portanto, mais pragmático e mais útil falar em política de saúde alertada para a evidência (“evidence-aware policy”), uma formulação mais realista, mais do que a, ideal e abstracta, política assente na evidência (“evidence-based policy”)”. Igualmente muito bem, quando afirmou que “isto é válido ao nível das decisões políticas estratégicas, ao nível da gestão regional ou institucional e ao nível da prática clínica quotidiana”. Já não foi tão feliz no propósito de enaltecer a acção desenvolvida e as decisões estratégicas tomadas, ao colocar no mesmo plano medidas já implementadas, ou pelo menos com princípio de implementação, e outras que o cidadão desconhece e não pode conhecer porque não atingiram ainda o terreno. Mas não há por onde o negar: foi uma boa intervenção, consistente e, sobretudo hábil, do ponto de vista da sua afirmação pessoal e política. Como quem diz: é assim que entendo que deve ser; se não for, procurem os responsáveis, os tais lobies políticos (onde quer que se situem no espectro partidário), de interesses (profissionais ou outros), não clamem contra mim.
2. Muito consistente, como se esperaria, é também o texto de PKM, no DE link , do qual me parecem de relevar dois pontos:
i)-o reforço da opção defendida por CC (uma política de saúde alertada para a evidência (“evidence-aware policy”), aduzindo as razões que a justificam numa perspectiva europeia: “as preocupações com o crescimento descontrolado dos custos com os cuidados de Saúde, o crescente cepticismo do público acerca da eficácia dos sistemas de Saúde tradicionais (bem percebida pelo sector privado: vide debate de Sábado, 12.05, na RTP-N, reivindicando participar na contratualização anual da prestação de serviços), persistentes falhas na qualidade percepcionada dos serviços de Saúde e as ameaças globais de crises de Saúde pública …” Tudo coisas das quais também por aqui temos ouvido falar e que são sérias, e não apenas do mundo virtual, como o demonstra o recente inquérito em que 25% das respostas (se não estou em erro) vão no sentido de que o SNS deve tomar o SPS como incentivo para melhor a sua performance;
ii)- O evidenciar que “a Agenda de Lisboa adquiriu centralidade na geração de evidência para a decisão em políticas de Saúde”. O melhor é mesmo continuar a citar PKM: “A relação entre intervenções para a optimização do investimento nos sistemas de Saúde europeus e as intervenções de Saúde pública assume um papel central na distribuição de recursos e obriga a repensar os programas nacionais de Saúde e respectivas orientações e prioridades”.
3. É nesta sequência que vem a intervenção do É-Pá, ao qual é devida justa homenagem: incansável, sempre disponível e pronto a trazer-nos ensinamentos e opiniões, fazendo alarde de uma diversidade de cultura que o deixa à vontade, esteja o que estiver sobre a mesa da discussão, trazendo ao seu discurso muitas afirmações que, em si mesmas, estão certas e, por isso mesmo, são irrebatíveis a não ser pela pertinência lógica ou pelo alinhamento na temática que, em concreto, esteja em discussão e onde é suposto devam inserir-se.
4. Não quero repetir os três primeiros Comentários que, até este momento, a intervenção do É-Pá mereceu. A mim, pareceu-me uma intervenção nim, ou, se preferirem, do tipo “sim, mas talvez”. Nisso não há mal nenhum, porque é evidente que pode haver acordo na generalidade e discordâncias, até profundas, na especialidade. Ponto é que as discordâncias sejam bem precisadas e fundamentadas e que se contraponham alternativas caracterizadas pela exequibilidade, pelo menos com igual exequibilidade, perante o fundamental que esteja em jogo. Ora, será só insuficiência ou azar meu? Li muito atentamente a intervenção do princípio até ao fim e não foi o que encontrei.
5. CC e PKM falam de política de saúde alertada para a evidência (“evidence-aware policy”), uma formulação mais realista, mais do que a, ideal e abstracta, política assente na evidência (“evidence-based policy”)”? O É-Pá contrapõe que “As questões colocam-se ao nível das evidências científicas “disponíveis”, isto é, das metodologias utilizadas para a sua obtenção e, consequentemente, do seu valor e qualidade” e ”o conceito de “evidência científica” vai sendo paulatinamente qualificado” e eis que disserta sobre os vários entendimentos da evidência, mas sempre fazendo tábua rasa das preocupações em discussão;
CC afirma que “isto é válido ao nível das decisões políticas estratégicas, ao nível da gestão regional ou institucional e ao nível da prática clínica quotidiana”, na qual o diagnóstico e a prescrição são fundamentais? Lá vem o É-Pá que até parece concordante: “Este é um problema recorrente para os médicos. Quando se fala nos gastos com medicamentos “salta”, de imediato, para o ar, a necessidade de elaborar protocolos terapêuticos e guidelines como suporte para a obtenção de ganhos (benefícios, vantagens, tipo de utilização, custos) nesta área” mas, atenção: “Neste “mundo” (o da evidência disponível que deve firmar os protocolos terapêuticos ou guidelines) temos ainda mais gradientes, entre eles: a evidência científica “suficiente” e/ou “confiável”. Escrevo, “confiável” e não “fiável”, porque entendo que a fiabilidade, ou se quisermos a idoneidade, dessa evidência deve ser partilhada, por todos os intervenientes – do investigador (produtor) ao consumidor final (o doente). Ora, o investigador (produtor) é, no mínimo, suspeito: “Na realidade, verificamos que, na introdução no mercado de novos fármacos, a prática actualmente disseminada é, a própria empresa investigadora, muitas vezes coincidente com a empresa produtora, coordenar e orientar os ensaios clínicos (em todas as suas fases). Isto é eticamente insuportável (em termos de conflito de interesses) e possibilita a moldagem (adaptação) da “evidência científica”. Subordina, ou abre espaço para isso, à entorse da evidência sobrevalorizando, em detrimento da verificação, os critérios económicos.” Tudo correcto, mas o É-Pá sabe, muito melhor do que eu, que, a montante da investigação que se comporta nas finalidades dos HH, existe muita investigação básica inacessível para estes; sabe que (como diz O cavalinho da chuva “A maioria dos indivíduos com saberes suficientes para "guideliners" estão envolvidos com a Indústria Farmacêutica”); e sabe ainda que ”essa evidência partilhada, por todos os intervenientes – do investigador (produtor) ao consumidor final (o doente) é inatingível, por divergência de objectivos, ou, pelo menos, não é atingível em tempo útil.
6- Todos nós também sabemos, e nunca nos passou pela ideia sustentar o contrário, que a elaboração de protocolos terapêuticos ou guidelines não é uma tarefa simples, implica a consideração de muitos dos aspectos referidos pelo É-Pá e, porventura, ainda de outros, assim como sabemos que, na sua definição, os médicos devem ter participação dominante e decisiva. Mas será que teremos de aceitar levar a homenagem à tradicional liberdade de prescrição médica até ao colapso do SNS? Será que o juízo do médico isolado, sem necessidade de qualquer justificação perante a sua hierarquia (não perante os órgãos de gestão), deve prevalecer sobre o entendimento de outros médicos, escolhidos pelo seu perfil e competência para a definição dos protocolos a observar e das normas a seguir para que estes possam ser postergados? Onde é de presumir que está a maior e melhor evidência? Não será já o tempo de nos convencermos de que, se as medidas adequadas não forem tomadas, o risco não será o de chegarmos “a conhecer “listas de espera terapêuticas”, mas sim o de elas nos serem impostas porque a universalidade, a generalidade e a equidade de um SNS, incapaz de se regular e controlar, terão definhado e desaparecido perante o desafio do SPS, ele sim, capaz de se definir de acordo com as suas conveniências? A EU – a tal de cuja média do PIB nos só atingimos 70% - já se convenceu. E nós, queremos voltar à posição de orgulhosamente sós? Ficamos satisfeitos por participarmos no financiamento dos 6 biliões de Euros que a EU vai investir nos próximos 7 anos e que só aos outros aproveitariam?
AIDENÓS
Etiquetas: Aidenós
11 Comments:
ONDE ESTÁ A EVIDÊNCIA ?
Isto da decisão tomada com base na evidência tem muito que se diga.
A testemunhá-lo os escandalosos fracassos ocorridos com substâncias aprovadas depois de submetidas a "rigorosos" ensaios clínicos.
Os falhanços por vezes são estronsosos despoletadores de autenticas epidemias - taladomida e mais recentemente os pain pills como o Vioxx.
Só nos EUA estima-se que por ano morram cerca de 60 000 doentes por erro na administração de medicamentos.
Por vezes, a informação é insuficiente ou incompleta levando os responsáveis a decidir com base em falsas evidências.
É o que tem acontecido com CC, cujo profundo conhecimento cientifico lhe permite dominar determinadas áreas do conhecimento.
Mas quando se trata de implementar medidas, a maioria das quais acertadas, esbarra com a sua quase inaptidão no domínio da praxis política.
Vários dificuldades de perfil fazem com que o nosso ministro acabe por tomar decisões e assumir comportamentos, que sob o ponto de vista político são verdadeiros desastres.
Caro(a) Cotovia:
A política é que se tem revelado um desastre de per se.
A técnica (tout-court) também.
Há pois que apelar ao bom-senso e a quem, profundo conhecedor do terreno, sem ligações político-partidárias, possa opinar.
(ou seja: ao qause impossível)
E agora para o "Avicena":
De que têm valido as políticas da Saúde, nomeadamente as que deveriam ser implementadas pela DGS?! Veja-se o relatório preliminar da ERS sobre "cesarianas" (e não só no sector privado e privado não lucrativo).
O que fez a DGS até agora?
De acordo com o D.L. 13/93 de 15.01 e do D.R. 63/94, é á DGS que cabe licenciar, fiscalizar e encerrar se fôr caso disso.
Estamos em 2007!!!!!!!!!!!!!!!
Política?????!!!
Mais engodos?
Deixe-se disso.
Já percebemos que é bom retórico.
Agora deswça do pedestal. Vá oa terreno. Tenha como missão, solucionar os problemas....
E ... depois.... diga-me.
O que o É-Pá terá querido dizer, relativamente ao medicamento, será a necessidade de encontrar um equilíbrio entre a via economicista de controlo das novas substâncias e a necessidade de não privar os doentes das novas tecnologias .
E o equilibrio só se obterá através de um extremo bom senso.
Veremos depois deste processo de cura de eficiência o que restará do nosso SNS.
Se o processo se fizer de forma equilibrada procurando reinvestir as poupanças geradas em inovação e tecnologias adequadas, teremos um SNS produtor de ganhos de saúde e portanto ganhador.
Se a ânsia de reduzir nas gorduras nos cegar levando-nos a cortar o músculo até ao osso, teremos um SNS cada vez mais empobrecido e residual para atendimento dos utentes mais pobres sem alternativa.
Requiem pelo SNS
SNS, até quando?
O diagnóstico é antigo.
A intervenção profunda é recente com o LFP e CC.
E o dilema com que se confronta o SNS é deveras terrível:
Se SNS não for tratado morre da doença. Com os tratamentos a que temos assistido corre-se o risco de vermos igualmente sucumbir o SNS, vítima de efeitos adversos.
Principalmente da estocada do sector privado que finalmente se apetrechou para a prestação da medicina pesada e ameaça ultrapassar o sector público em qualidade e preços.
Restar-nos-à, então, a solução de comprar o nosso seguro de doença (quem não puder está lixado) e desejarmos paz à sua alma.
Caro aidenós:
"Ponto é que as discordâncias sejam bem precisadas e fundamentadas e que se contraponham alternativas caracterizadas pela exequibilidade, pelo menos com igual exequibilidade, perante o fundamental que esteja em jogo. Ora, será só insuficiência ou azar meu? "
Nem insuficiência, nem azar… é o timming!
Quando teci considerações sobre a racionalização terapêutica (o fundamental em jogo) insinuei a minha preferência pelas “Normas de Orientação Clínica” NOC’s (a alternativa), um pouco em contraponto, aos protocolos ou guidelines. A minha preferência não é inocente. Julgo que a simples criação de protocolos ou guidelines conduz, na lógica empresarial, à elaboração e gestão de pacotes (“packages”), por grupos nosológicos. Logo de seguida, o “mercado” imporá esquemas de contratualização (desses pacotes), entre serviços públicos e privados. O sector público habituado a um “estilo de vida” hegemónico, não se preparou para este tipo de concorrência. Não vamos (falo numa perspectiva de defesa do SNS) “entregar o ouro ao bandido…”. Temos, portanto, de coordenar a racionalização terapêutica com as estratégias emergentes do mercado na Saúde…
Se não o fizermos, empurramos o SNS para, as já denunciadas, funções residuais…
Sobre a exequibilidade prática sugeria, por exemplo, uma análise expedita e prática do Dec—Lei sobre as USF’s que, no seu artº. 29, se refere às “actividades específicas de vigilância a utentes vulneráveis e de risco…” e, mais adiante, especifica, entre outros itens, a vigilância de diabéticos e hipertensos.
Não seria uma oportunidade soberana – aproveitando a “onda de inovação” das USF’s - para incentivar a construção de NOC’s, nestas duas áreas clínico-terapêuticas (diabetes e hipertensão)?
Isto é, começar pelos alicerces do SNS.
Mas, em minha opinião, temos ainda um longo caminho a percorrer sobre metodologias e meios a utilizar que, como é evidente, não é – apesar das ameaças que impendem sobre o SNS - (ainda) consensual.
E o tempo urge...
Parabéns ao AIDENOS por mais este trabalho.
Teorizar sobre a evidênia, que deve servir de suporte às decisões políticas, é relativamente fácil face aos problemas que a prática política nos levanta.
Temos repetido aqui que política é a arte do possível.
Os estudos que CC tem encomendado para servir de suporte a várias decisões políticas constituem apenas uma parte (por vezes muito restrita) da realidade sobre a qual é preciso decidir.
Por outro lado a actuação política requer uma técnica e perfil adequado.
O povo tem sempre razão. O povo tem que confiar sempre nos líderes políticos, mesmo quando sabe que eles lhes contam mentiras.
O erro de CC parece ´reside em ter suposto que bastaria ter uns estudos mais ou menos alinhavados para poder decidir e por em andamento as medidas que acha justas.
Em política este comportamento é óptimo mas não chega. Como se tem provado pela necessidade deintervenção do primeiro ministro engenheiro.
É incontornável trazer o tema ao debate: em inglaterra o National Institute for Clinical Excelence há muito que iniciou (e com um êxito assinalável) a batalha das guidelines baseadas na evidência. Os trabalhos entretanto produzidos estão disponíveis na net para download gratuito. Eu próprio já saquei vários :)
Tudo isto para dizer que felizmente que há quem já tenha começado este trabalho por nós e por isso quando aceitarmos politicamente que chegou a hora, nos primeiros tempos apenas teremos que saber traduzir textos a partir do inglês. No entanto, isto não vai ser sempre assim, até porque a agenda do NICE não tem necessariamente que ser a que mais interessa a Portugal.
Sim, eu sei que tudo isto é uma utopia. No entanto, quanto mais depressa se começar a partir pedra, mais rapidamente se iniciará o inevitável caminho.
Apontamento "marginal" ao post:
O Agostinho de Almeida Santos, (que , dizem alguns, não é flor que se cheire,) demitiu-se dos HUC por insuficiencia de meios; entretanto hoje aos microfones da TSF, o Fernando Regateiro disse que consegiu arranjar nos 23 dias de mandato que leva, as verbas que faltavam! É imoral, é desonesto e releva sobretudo má fé! Ou CC deu o dinheiro por baixo da mesa, ou o Regateiro tinha o dinheiro enquanto Presidente da ARSCentro e sonegou-o de propósito ao anterior para vir a assumir o cargo (era ele que liderava o processo, há que relembrar).
Cara Cotovia, Caro Ochoa:
Na generalidade, os vossos Comentários têm a minha concordância. Fracassos, ou erros, são uma possibilidade que sempre haverá que admitir na intervenção humana. Há que lamentá-los e tentar evitá-los, mas tem que se continuar a intervir.
Os desastres, de que a Cotovia fala e que, até agora, não teriam justificado o transporte para uma SUP – embora tal recurso tenha sido sugerido, e, quem sabe? estas coisas às vezes deixam sequelas que só mais tarde se revelam… – tiveram a sua causa no facto de CC se ter esquecido do que agora veio defender: ”Na Saúde, a decisão política é, goste-se ou não, influenciada por múltiplos factores, e a evidência científica é apenas um deles. A ideologia, as questões éticas e as questões religiosas, os recursos financeiros limitados, a pressão da opinião pública e das associações de doentes, e a pressão dos lobbies, quer privados (indústria farmacêutica, fabricantes de equipamento, prestadores privados,..), quer os lobbies ligados ao sector público (sindicatos, grupos de profissionais, “burocratas”, poder regional e poder local..), são factores que condicionam, influenciam e moldam as decisões políticas na Saúde, a par com a evidência científica disponível relativamente à matéria em decisão. (V. 1º Link do texto comentado).
Como diz o Ochoa “o dilema com que se confronta o SNS é deveras terrível” e só com LFP e CC (sem prejuízo das críticas que a um e outro possam ser dirigidas) se começou a agir em profundidade, mas ainda não o bastante, na minha opinião, porque falta abrir o capítulo da revisão e adequação do estatuto dos profissionais da saúde, designadamente atacar a questão central que é promiscuidade do exercício profissional, sem o que será muito difícil eliminar a sub-produtividade actual que é o problema principal do SNS (e não só do SNS). Mas não sou tão pessimista como o Ochoa: ainda é cedo para o Requiem pelo SNS. A não ser que esteja a pensar no SNS que temos e que só pode interessar aos acomodados que dele retiram vantagens. Só ”se não for tratado é que morre da doença” e a estocada do sector privado pode ser levada em conta na terapêutica necessária. Mas é indispensável continuar a intervir. Por mim, assim o espero.
Caro Hospitaisepe:
Estou de acordo com o seu comentário.
Não defendo a via economicista de controlo das novas substâncias ou que os doentes sejam privados do acesso às novas tecnologias de que possamos dispor. O que defendo é que esse acesso seja, em ambos os casos, racionalizado (não racionado) por protocolos, guidelines, ou normas de orientação clínica, suportados/as pela evidência disponível e não pela que há-de vir, e que, nos casos em que o médico entenda haver razões para decidir diferentemente, deva apresentar perante a sua hierarquia justificação fundamentada.
Também nada me parece de opor ao “investimento de poupanças geradas“ (ou mesmo a gerar) ”em inovação e tecnologias adequadas”, o que não põe em risco a sustentabilidade do SNS e poderá contribuir para termos “um SNS produtor de ganhos de saúde“
Caro e-pá!...
Obrigado pelo seu Comentário que me absolve da suspeita de insuficiência e dos malefícios do azar que, confesso, já começavam a perseguir-me! Fico mais tranquilo e, sobretudo, mais seguro do que afirmei sobre a justiça da homenagem que lhe é devida e que, pessoalmente, lhe renovo.
Considerava protocolos, guidelines ou normas de orientação clínica” (NOC’s) como simples designações alternativas, portanto, com conteúdo idêntico. Vejo agora as razões da sua preferência pela última e, embora não esteja a ver donde deriva a imunidade aos efeitos que imputa às restantes, nada tenho a contrapor. Chamemos-lhe então NOC.
Sobre a sua sugestão, relativa às “actividades específicas de vigilância a utentes vulneráveis e de risco…” e, mais especificamente, à vigilância de diabéticos e hipertensos, sem dúvida que é uma sugestão perspicaz. Só não sei se não suscitaria uma questão de “timming”. Agora sou eu que digo: entrar na definição de uma NOC quando as USF estão apenas a ser criadas? Com que lógica só para essas duas situações e não também para outros utentes vulneráveis e de risco? As NOC, que devem suportar-se na evidência clínica disponível que, felizmente, varia de tempo para tempo, devem ser tão rígidas que seja a lei a defini-las?
Noutro ponto tem, como costuma dizer-se, carradas de razão: o tempo urge... que o doente (SNS não pode esperar muito) pela terapêutica.
Obrigado a todos pelos vossos comentários.
Caro aidenós:
Obrigado pelas suas palavras de estímulo à participação nestas infindáveis, mas agradáveis, trocas de opiniões ...
Não pretendi apresentar qualquer modelo de solução. Apenas “levantar a lebre”.
O “timming” encaixa-se, exactamente, no facto de as USF’s estarem, neste momento, a ser criadas. Será, em minha opinião, mais fácil as adaptações das metodologias de trabalho (neste caso clínico-terapêutico) num “ambiente de renovação”…
Existem, como é óbvio, questões prévias. Vou apresentar, por que o tempo urge, apenas quatro (há muitas mais!)
A primeira será promover a SENSIBILIZAÇÃO de médicos organizados em pequenos núcleos (as USF’s, p. exº.) para as inadiáveis tarefas de racionalização terapêutica;
De seguida, incentivar a ACEITAÇÃO, problema que considero não ser pacífico já que se liga a uma questão mais lata: os julgamentos (médicos) sobre as melhores intervenções (no doente) são dispares e, frequentemente, baseados no empirismo.
Depois, a facilitar MUDANÇA, fundamentalmente da prática clínica, isto é, a necessidade de clarificar a situação clínica sempre em função dos problemas do doente que está na sua presença.
Finalmente, auxiliar a IMPLEMENTAÇÃO, dos instrumentos disponíveis (baseados na evidência científica), na prática clínica.
Faltam, também, outros instrumentos. É necessário ajudar os médicos a “bem fundamentar”, as suas decisões ou intervenções. Estou a lembrar-me, p. exº., da dificuldade ou da facilidade de acesso nos postos de trabalho à “Cochrane database”… . Enfim, o eterno problema dos sistemas de informação na Saúde.
De resto, penso que o hábito de uma frequente utilização do "Cochrane", por si só, fará sentir a necessidade de, pelo menos, importar (e validar para Portugal) NOC ou guidelines...
Porque sugeri começar pelos doentes com hipertensão e diabetes?
É óbvio que não me move qualquer instinto discriminatório de doentes. Citei estes dois exemplos porque, estas 2 situações, estão incluídas no previsto regime de “incentivos” das USF’s (pontuações) e serem, em minha opinião, áreas onde as “dispersão terapêutica” será abundante, o que se poderá traduzir em “desvantagens” para os doentes e, como será previsível, elevar os custos dos tratamentos a instituir.
Por outro lado, não creio que existam condições para arrancar em grande estilo.
“step by step”.
Mas este é um “exemplo de oportunidade”, no meu entender, com uma grande virtude – a capacidade de contaminar a rede hospitalar onde, naturalmente, residirão os problemas mais prementes… e mais difíceis.
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