segunda-feira, junho 30

TE 1.ªs Consultas


Um dos “handicap” dos modelos de tipo Beveridge é precisamente o de tempo de espera para primeiras consultas. Pelos vistos os Ingleses têm sido melhor sucedidos do que nós na resolução deste problema que, em meu entender, é multifatorial. Se na Medicina Familiar se pode compreender, tendo em conta a falta de médicos desta área, nas especialidades hospitalares é bem mais difícil de entender, particularmente nos grandes centros urbanos onde o excesso de especialistas escandaliza.

Uma das principais razões para esta situação é a falta de articulação entre níveis de cuidados, tal faz com que os médicos de família não tenham linhas céleres de contacto com os colegas hospitalares e vice-versa. Daí resulta que não seja fácil marcar uma consulta num hospital como também é verdade o contrário, conseguir-se o seguimento por medicina familiar de um doente admitido num hospital. A informática poderia dar especial ajuda neste processo de integração mas, também aqui, parece que o negócio se tem sobreposto ao interesse público. Em vez de se ter apostado no desenvolvimento do SAM como sistema informático integrador, não senhor, optou-se pela solução Alert P1, programa que tem sido alvo de diversas críticas. Lamentavelmente, também nada se tem avançado com o desenvolvimento dos Sistemas Locais de Saúde, apesar dos apregoados bons resultados conseguidos em Vila da Feira e Matosinhos. Quem decide montou o modelo a título experimental, entretanto ninguém se deu ao cuidado de ver se provou e é para replicar ou, pelo contrário, se é para por de parte.

O que se passa ao nível da Convenção é também incompreensível. O valor irrisório de uma consulta de especialidade quando comparado com o que se paga por um meio complementar de diagnóstico, faz com que poucos especialistas aceitem convencionar-se em consultas. E, quando o fazem, é porque a consulta arrasta consigo os ditos exames. Como é que se entende que a observação e seguimento de um doente, com tudo o que isso implica de disponibilidade, possa valer menos que a execução e interpretação de uma técnica? É por isso que frequentemente nos chegam às mãos doentes com sacas de exames sem que tenham um médico de família ou um médico hospitalar como âncora.
Tudo isto parecem ser e são-no em grande medida, questões de lana caprina. Não tenho a pretensão de ter descoberto a pólvora seca, no entanto os ministros sucedem-se e os vícios do sistema permanecem. Não deixa de ter alguma razão o ochoa quando diz que “O sistema tem cuidado melhor dos seus profissionais do que dos doentes” mas a grande responsabilidade de tal suceder radica mais na incompetência de quem nos vem governando do que no nosso modelo de saúde.

Tá visto

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6 Comments:

Blogger Joaopedro said...

Segundo me parece o Alert P1 é um software destinado a assegurar o interface entre os Cuidados de Saúde Primáriose e as Consultas Hospitalares.
O SAM é um sofware de Gestão Clínica, destinado aos médicos dos CSP.
AletP1 e SAM poderiam em principio articular, caso o desenvolvimento do AlertP1 tivesse sido bem feito (o que infelizmente parece não ter acontecido).

Outro dos problemas diz respeito à dificuldade dos médicos hospitalares em relação à utilização de meios informáticos, o que levanta especiais dificuldades na implementação destas ferramentas de gestão.
Em relação a este ponto estamos no mínimo dez anos atrasados em relação a maioria dos países da EU.

Concordo inteiramente com o Tá Visto em relação ao valor pago aos médicos por consulta convencionada que é urgente rever.
Sem incentivos não é exequível mobilizar recursos para as prioridades.

6:25 da tarde  
Blogger Tá visto said...

Um esclarecimento, o SAM não é apenas destinado aos CSP pois é também utilizado nos hospitais do SNS. O papel desempenhado pelo Alert P1, que é de facto assegurar a interface entre os Cuidados de Saúde Primários e as Consultas Hospitalares, poderia ser obtido de forma idêntica através do SAM.
Mas qual foi a opção? Desactivar o IGIF e a sua equipa de programadores e passar a contratar software em "outsorcing". Com esta atitude, SAM e outros programas ali desenvolvidos deixam de poder sofrer transformações estando condenados à obsolescência.
É pelo menos isto que me é dado saber.

9:10 da tarde  
Blogger Clara said...

De acordo com a informação anterior (NHS INPATIENT AND OUTPATIENT WAITING TIMES), sobre os tempos de espera do NHS, os doentes esperam em média 2,2 semanas por uma primeira consulta e 4,2 semanas, em média, por uma cirurgia.
Ou seja, um doente, em média, mês e meio depois de diagnosticado em primeira consulta, tem acesso à cirurgia que lhe irá resolver o seu problema de saúde.

Quanto tempo e que meios, nos separam deste nível de cuidados?
Por mais vontade que tenham o primeiro ministro e a ministra da saúde, vão ser precisas muitas legislaturas para atingir-mos este objectivo.

10:26 da tarde  
Blogger DrFeelGood said...

Tem sido desenvolvido um apreciável esforço para recuperar algum do tempo perdido.

Apesar do passo em falso relativamente ao AlertP1, ( demasiados milhões para tão baixa performance e utilidade), algumas medidas positivas têm sido desenvolvidas no âmbito do projecto "Consulta a tempo e horas":
a) normalização dos exames que devem acompanhar os doentes enviados pelos CS às consultas hospitalares;

b) Serviço de rede rápido de forma a viabilizar o tráfego de informação em tempo e facilidade aceitáveis;;

c) triagem dos pedidos de consulta hospitalares,

d) constituição de uma base de dados que nos vai permitir conhecer os doentes em espera do ambulatório (outpatients wating times).

Subsistem, no entanto, alguns graves problemas ao desenvolvimento do sistema, como seja a escassez de tempos de consulta hospitalares (ou fraca rentabilização dos recursos humanos disponíveis).
Dificuldade dos médicos hospitalares adquirirem formação na utilização eficaz da aplicação do SAM (registo de dados clínicos).
Melhoria da qualidade do atendimento: foi definido como tempo adequado de consulta 20 minutos. Normalmente as consultas dos nossos hospitais demoram em média entre cinco e dez minutos. As salas de espera deixam muito a desejar em termos de conforto para tão longas esperas e falta de cortesia do pessoal administrativo e, por vezes, dos médicos assistentes.
As consultas estão longe de ser Resolutivas, uma vez que invariavelmente os nossos doentes não se livram de várias viagens, entre repetições de exames e marcação sessões de consultas, a maioria desnecessárias se o empenho e a qualidade da organização fosse outra.
Ainda por cima obrigados a pagar taxa.

E para terminar o desabafo do Xavier, que ele, talvez, não tenha querido deixar aqui:

«Mais grave é o elevado número de cidadãos que espera à porta do SNS por uma primeira consulta, num cenário de verdadeira falência da nossa rede pública de cuidados.»

11:10 da tarde  
Blogger tambemquero said...

Isto está embalado para um sistema de dois níveis de cuidados:

a) a rede pública para os pobres. Não será preciso desenvolver um grande esforço de melhoria de qualidade. Para quem é,serve.

b) rede de atendimento privada/convencionada, destinada aos utentes com rendimentos suficientes para adquisição de seguros de saúde.

Quanto ao resto é deixar actuar o mercado.Ou seja, tudo ao molho e fé em Deus.

O 25 de Abril deixará, desde então, de ser comemorado, para dar lugar ao renascido dia da raça, decretado em data escolhida pelo próximo presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa.

11:30 da tarde  
Blogger e-pá! said...

Não me parece que estejam disponíveis, nos tempos mais próximos, recursos humanos suficientes (para performances como as referidas pela Clara).

A situação "nas especialidades hospitalares é bem mais difícil de entender, particularmente nos grandes centros urbanos onde o excesso de especialistas escandaliza" tem um fundo de verdade mas poderá ter-se modificado nos últimos tempos devido ao grupos etários, que andarão por níveis muito altos, e avançaram cedo ou antecipadamente para aposentações.

Por isso, começou a caça aos médicos uruguaios, e as reclamações de equivalências automáticas dos médicos ucranianos.
Penso que esta será a nova estratégia do Ministério no que diz respeito a o recrutamento de médicos.
Porque, médicos da Europa ocidental, com uma formação mais próxima da ministrada em Portugal, foi chão que deu uvas.
E, com isto começou a queda da qualidade.
Poderá haver números. Melhor, poderão conseguir-se bons números.
Poderão muitos engalanar-se com resultados aparentemente satisfatórios. Os contratos individuais de trabalhos são capazes de produzem-los.
Mas só números. Porque gostaria de estar equivocado mas suspeito que os indicadores de saúde em Portugal vão, a médio prazo, sofrer alterações (em minha opinião negativas).
Estamos longe de nos aproximar-mos de uma medicina de qualidade, que não sei em que grau (ou medida) ainda temos, mas que já tivemos.

Por outro lado, toda a gente está de acordo em ultrapassar a celebre falta de articulação entre cuidados primários e hospitalares.
É uma reivindicação com "barbas".
Só queria chamar a atenção que essa (desejável) articulção, numa primeira fase, é um sorvedouro de tempos operacionais e de recursos humanos de ambos os lados. Os resultados são a médio prazo.
A grande questão é a inoperacionalidade e as dificuldades de uma rede de referenciação hospitalar, onde parece que se começou a trabalhar, mas cujos resultados, depois de ultrapassar diversos melindres (semelhantes aos que houve nos SAP's), também serão tardios.

Enfim, tudo parece adiado para médio prazo.
Aí, a "pesada" máquina do SNS, vai passar por dificuldades orçamentais, perder quadros e deixar cair áreas de excelência. O SNS vai passar pelas maiores dificuldades internas e vai mexer com a política social nacional. Manuela Ferreira Leite agarrou-se a este tema, de uma forma bizarra.

No Sector privado, subsidiário do grande capital, não terá reflexos negativos. Continuará a investir segundo estratégia de expansão(pouco clara), terá tempo de "afinar" e optimizar a utilização as inovações tecnológicas, prosseguirá na "pesca à linha" dos técnicos que necessita (não gastou um cêntimo a formá-los) e não têm problemas orçamentais.

Porque a curto prazo, dadas as circunstâncias políticas, nada de relevante se passará.

Depois, das duas uma:
ou será tarde?
ou será muito cara!

12:41 da manhã  

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