"Potencialmente irregular"
«Aspectos fundamentais das auditorias realizadas: SISTEMA DE PRESCRIÇÃO E CONFERÊNCIA DE FACTURAÇÃO DE MEDICAMENTOS DO SNS.
i. A evolução global do sector dos medicamentos prescritos nos cuidados primários do SNS, no 1º Semestre de 2010, quando comparado com igual período de 2009, apresenta um acréscimo de quase 10% do custo para o SNS como decorre do quadro acima.
ii. Os principais indicadores da despesa com medicamentos, nas ARS, no mesmo período, apresentam as seguintes características:
Total da prescrição emitida: cerca de 33 milhões de receitas/1º semestre de 2010;
Distribuição da prescrição por locais: prescrição pública (centros de saúde, hospitais e outros locais), 79%; prescrição privada, 21%;
Custo médio do SNS por embalagem de medicamento: €11,9;
Encargo do SNS com os 20 medicamentos mais importantes: cerca de 15% da despesa global;
Peso relativo dos regimes especiais de comparticipação: cerca de 58%.
iii. Em matéria de prescrição de medicamentos, não existem formulários terapêuticos (guidelines), enquanto documentos orientadores da prescrição a nível dos cuidados primários. A sua adopção poderá contribuir, de forma simples e eficaz, para diminuir os desperdícios com medicamentos e, consequentemente, os custos com os mesmos. De resto, trata-se de uma prática corrente a nível internacional, em particular a nível Europeu, cuja adopção importará equacionar;
iv. A prescrição manual, ainda bastante utilizada pelos médicos, apresenta diversas fragilidades ao nível da sua segurança, uma vez que as vinhetas e as receitas utilizadas são susceptíveis de serem desviadas e utilizadas de forma indevida, dada a ausência de controlo sobre as mesmas. Por outro lado, as assinaturas dos médicos não estão sujeitas a qualquer validação quanto à sua autenticidade. O risco de controlo, nesta área é muito alto e, consequentemente, o de cometimento de fraudes;
v. A prescrição electrónica, embora aparentemente apresente menores vulnerabilidades que a manual, não irá, no entanto, resolver, designadamente, o problema essencial da validação (automática) da assinatura dos médicos, uma vez que estes continuam a proceder à assinatura manual das receitas impressas, pois a aplicação não dispõe de funcionalidades que permitam a sua validação.
vi. Quanto à conferência da facturação dos medicamentos, as bases de dados dos utentes (BDU) e dos prescritores (BDP) encontram-se desactualizadas. Deste modo, o Centro de Conferência de Facturas (CCF) não se encontra habilitado a efectuar uma correcta conferência da facturação mensal;
vii. Quanto ao controlo efectuado pelas ARS, apesar de disporem de uma aplicação informática (SIARS - Sistema de Informação para as Administrações Regionais de Saúde), com grande potencial, que poderia optimizar o controlo da prescrição e fornecimento dos medicamentos ao longo do respectivo circuito, não é exercida uma intervenção sistemática e permanente sobre a informação fornecida pelo referido sistema, o qual já custou ao Estado muitos milhões de euros e não está a ser devidamente rentabilizado. Deste modo, inúmeras fraudes que têm vindo a ser cometidas, com enormes prejuízos para o Estado, poderiam ser tempestivamente detectadas e resolvidas, o que paradoxalmente, face à inércia existente, não se verifica;
viii. Como corolário das insuficiências anteriormente referidas e a exemplo de anteriores relatórios e participações efectuadas pela IGF ao Ministério Público, foram, uma vez mais, detectadas diversas situações de prescrição e aviamento de medicamentos comparticipados pelo SNS, tendo-se apurado que para um valor de comparticipação do SNS de M€ 3, cerca de M€1,2 (40% daquele valor), foi identificado como potencialmente irregular.»
Relatório de Actividades da IGF referente a 2010 publicado em 20.06.11, paginas 28,29,30.
1.º - Como era de esperar os títulos dos jornais dispararam:
DE: Fraude atinge 40% da despesa do Estado com medicamentos link
I: Detectada fraude em 40% da despesa do Estado com medicamentos link
TSF: Bastonário promete sanções duras para médicos envolvidos em fraude link
2.º - Sobre este verdadeiro acontecimento jornalistico acho oportuno deixar algumas notas:
a) O referido relatório refere irregularidades potenciais: «Como corolário das insuficiências anteriormente referidas e a exemplo de anteriores relatórios e participações efectuadas pela IGF ao Ministério Público, foram, uma vez mais, detectadas diversas situações de prescrição e aviamento de medicamentos comparticipados pelo SNS, tendo-se apurado que para um valor de comparticipação do SNS de M€ 3, cerca de M€1,2 (40% daquele valor), foi identificado como potencialmente irregular.»
b) É certo que existem inúmeros casos de fraude, no nosso país, relacionados com a prescrição e distribuição de medicamentos comparticipados, alguns em investigação, como, aliás, sempre existiram.
Atentemos, no entanto, ao seguinte: Se as irregularidades verificadas pela IGF não fossem potenciais, a fraude teria atingido no ano transacto 640 milhões de euros, uma vez que a despesa do SNS com medicamentos vendidos nas farmácias foi nesse ano de 1,6 mil milhões de euros. O que achamos de todo irrealista, tendo em atenção outros indicadores como o aumento da comparticipação do estado e do preço dos medicamentos, verificados em 2010. link
c) Acho importante a lista de dificuldades detectadas pela IGF em relação a esta matéria, constantes do referido Relatório, que é necessário ultrapassar rapidamente.
Nota: Achei as ilustrações do Relatório da IGF, assim um tanto, naives, para o meu gosto. link
drfeelgood
i. A evolução global do sector dos medicamentos prescritos nos cuidados primários do SNS, no 1º Semestre de 2010, quando comparado com igual período de 2009, apresenta um acréscimo de quase 10% do custo para o SNS como decorre do quadro acima.
ii. Os principais indicadores da despesa com medicamentos, nas ARS, no mesmo período, apresentam as seguintes características:
Total da prescrição emitida: cerca de 33 milhões de receitas/1º semestre de 2010;
Distribuição da prescrição por locais: prescrição pública (centros de saúde, hospitais e outros locais), 79%; prescrição privada, 21%;
Custo médio do SNS por embalagem de medicamento: €11,9;
Encargo do SNS com os 20 medicamentos mais importantes: cerca de 15% da despesa global;
Peso relativo dos regimes especiais de comparticipação: cerca de 58%.
iii. Em matéria de prescrição de medicamentos, não existem formulários terapêuticos (guidelines), enquanto documentos orientadores da prescrição a nível dos cuidados primários. A sua adopção poderá contribuir, de forma simples e eficaz, para diminuir os desperdícios com medicamentos e, consequentemente, os custos com os mesmos. De resto, trata-se de uma prática corrente a nível internacional, em particular a nível Europeu, cuja adopção importará equacionar;
iv. A prescrição manual, ainda bastante utilizada pelos médicos, apresenta diversas fragilidades ao nível da sua segurança, uma vez que as vinhetas e as receitas utilizadas são susceptíveis de serem desviadas e utilizadas de forma indevida, dada a ausência de controlo sobre as mesmas. Por outro lado, as assinaturas dos médicos não estão sujeitas a qualquer validação quanto à sua autenticidade. O risco de controlo, nesta área é muito alto e, consequentemente, o de cometimento de fraudes;
v. A prescrição electrónica, embora aparentemente apresente menores vulnerabilidades que a manual, não irá, no entanto, resolver, designadamente, o problema essencial da validação (automática) da assinatura dos médicos, uma vez que estes continuam a proceder à assinatura manual das receitas impressas, pois a aplicação não dispõe de funcionalidades que permitam a sua validação.
vi. Quanto à conferência da facturação dos medicamentos, as bases de dados dos utentes (BDU) e dos prescritores (BDP) encontram-se desactualizadas. Deste modo, o Centro de Conferência de Facturas (CCF) não se encontra habilitado a efectuar uma correcta conferência da facturação mensal;
vii. Quanto ao controlo efectuado pelas ARS, apesar de disporem de uma aplicação informática (SIARS - Sistema de Informação para as Administrações Regionais de Saúde), com grande potencial, que poderia optimizar o controlo da prescrição e fornecimento dos medicamentos ao longo do respectivo circuito, não é exercida uma intervenção sistemática e permanente sobre a informação fornecida pelo referido sistema, o qual já custou ao Estado muitos milhões de euros e não está a ser devidamente rentabilizado. Deste modo, inúmeras fraudes que têm vindo a ser cometidas, com enormes prejuízos para o Estado, poderiam ser tempestivamente detectadas e resolvidas, o que paradoxalmente, face à inércia existente, não se verifica;
viii. Como corolário das insuficiências anteriormente referidas e a exemplo de anteriores relatórios e participações efectuadas pela IGF ao Ministério Público, foram, uma vez mais, detectadas diversas situações de prescrição e aviamento de medicamentos comparticipados pelo SNS, tendo-se apurado que para um valor de comparticipação do SNS de M€ 3, cerca de M€1,2 (40% daquele valor), foi identificado como potencialmente irregular.»
Relatório de Actividades da IGF referente a 2010 publicado em 20.06.11, paginas 28,29,30.
1.º - Como era de esperar os títulos dos jornais dispararam:
DE: Fraude atinge 40% da despesa do Estado com medicamentos link
I: Detectada fraude em 40% da despesa do Estado com medicamentos link
TSF: Bastonário promete sanções duras para médicos envolvidos em fraude link
2.º - Sobre este verdadeiro acontecimento jornalistico acho oportuno deixar algumas notas:
a) O referido relatório refere irregularidades potenciais: «Como corolário das insuficiências anteriormente referidas e a exemplo de anteriores relatórios e participações efectuadas pela IGF ao Ministério Público, foram, uma vez mais, detectadas diversas situações de prescrição e aviamento de medicamentos comparticipados pelo SNS, tendo-se apurado que para um valor de comparticipação do SNS de M€ 3, cerca de M€1,2 (40% daquele valor), foi identificado como potencialmente irregular.»
b) É certo que existem inúmeros casos de fraude, no nosso país, relacionados com a prescrição e distribuição de medicamentos comparticipados, alguns em investigação, como, aliás, sempre existiram.
Atentemos, no entanto, ao seguinte: Se as irregularidades verificadas pela IGF não fossem potenciais, a fraude teria atingido no ano transacto 640 milhões de euros, uma vez que a despesa do SNS com medicamentos vendidos nas farmácias foi nesse ano de 1,6 mil milhões de euros. O que achamos de todo irrealista, tendo em atenção outros indicadores como o aumento da comparticipação do estado e do preço dos medicamentos, verificados em 2010. link
c) Acho importante a lista de dificuldades detectadas pela IGF em relação a esta matéria, constantes do referido Relatório, que é necessário ultrapassar rapidamente.
Nota: Achei as ilustrações do Relatório da IGF, assim um tanto, naives, para o meu gosto. link
drfeelgood
Etiquetas: Medicamento, The day after
4 Comments:
IGF – chamem a polícia!...
Carecendo de formação jurídica, enquanto cidadão e contribuinte, impressionou-me a ligeireza de processos da IGF, bem como, o volúvel aproveitamento deste Relatório pela comunicação social.
"Irregularidades potenciais" dizem respeito, como é licito deduzir, a suspeitas. A IGF face a eventuais suspeitas tem o estrito dever de investigar ou, na impossibilidade técnica de o fazer, endereçá-las para o MP. Só que nesta segunda hipótese deverá fundamentar a suspeição investigando-a previamente e, enquanto durar a investigação manter a suspeição sob reserva, para não prejudicar uma eventual futura acusação e para protecção dos “potenciais” prevaricadores (a qualquer nível do circuito do medicamento) que à partida devem ser considerados inocentes…
É natural que perante um circuito do medicamento complexo que, como sabemos, envolve prescritores, fornecedores, utentes, bem como regimes gerais e especiais de comparticipações públicas, em termos potenciais, podem – em termos de probabilidades - existir “irregularidades”. Mas este “sentimento” genérico de suspeição não pode servir de suporte a insinuações (ainda não investigadas) e precocemente divulgadas em relatório que é publicitado.
Não pode, também, a IGF pretender mostrar serviço “levantando lebres”, i. e., apresentando insinuações baseadas em ambíguos “conceitos de potencialidade” porque, se enveredar por esse caminho, perde completamente a objectividade, podendo inclusive levantar sobre “a qualidade técnica do produto” (de inspecção ou de auditoria) um incidente de suspeição - que fere a sua missão inspectiva.
Concluindo: um relatório técnico ambíguo miscigenado com o fim de um ciclo político, que nada tem a ver com rigor e...“exigências no contexto da actual crise da dívida pública”…
Enfim, se objectividade é “isto”, chamem a polícia!
Aliás de repente um frenesim inusitado parece ter assaltado as entidades responsáveis pelas mais diversas acções inspectivasdo nosso país .
Dois exemplos:
1.º - «Má gestão dos dinheiros públicos» no acordo com a CVP
O Tribunal de Contas (TC) considera que houve «má gestão dos dinheiros públicos» na execução do acordo de cooperação entre a Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo (ARSLVT) e a Cruz Vermelha Portuguesa (CVP), entre 1998 e 2008. Em 10 anos, a ARSLVT pagou pelos serviços prestados a utentes do Serviço Nacional de Saúde (SNS) preços superiores aos que acordava com outras entidades públicas e privadas.
Na auditoria, realizada em 2009 e publicada no site do TC (http://www.tcontas.pt/), este organismo recomenda à ministra da Saúde a necessidade de «alertar as ARS e demais entidades que os recursos financeiros para a Saúde não são só escassos, como finitos, e que a única forma de introduzir esta restrição é a análise custo-benefício». Recomenda também que seja reavaliado o acordo de cooperação, «face à capacidade instalada nos hospitais do SNS», e ainda que os beneficiários dos cuidados de saúde no âmbito desde acordo com a CVP «procedam ao pagamento de taxas moderadoras em moldes idênticos aos utentes do SNS».
O TC deixa igualmente várias advertências ao conselho directivo da ARLVT, entre as quais o cuidado para que na celebração de futuros acordos se tenha em vista a «sustentabilidade do SNS»; seja garantido «o respeito pelos princípios da equidade, imparcialidade e universalidade relativamente à referenciação dos utentes pelo Hospital de Curry Cabral»; se proceda a «diligências, junto das entidades referenciadoras, no sentido de melhorar o controlo sobre o encaminhamento e a referenciação dos utentes, de forma a evitar a assunção de custos quando exista capacidade instalada no SNS», e seja assegurado «um acompanhamento mais eficiente, de forma a evitar a prestação de cuidados de saúde, pela CVP, a utentes excluídos do âmbito de referenciação do acordo».
Em suma, o relatório diz que é necessário «reavaliar», face à capacidade instalada nos hospitais do SNS, o actual acordo de cooperação com a CVP.
TEMPO MEDICINA ONLINE, 2011.06.20
2.º - ...«Em 42 hospitais auditados pela Inspecção-Geral das Actividades de Saúde, apenas 18 aplicam planos de prevenção de riscos de corrupção. link
A conclusão é de uma auditoria da Inspecção Geral das Actividades em Saúde, que analisou 42 hospitais-empresa (EPE). A auditoria "traduz uma crescente preocupação com o controlo das actividades de gestão e administração de dinheiros, valores ou património públicos", pode ler-se no documento a que o Diário Económico teve acesso. E ganha dimensão depois da Inspecção Geral das Finanças ter identificado que a fraude na despesa do Estado com medicamentos atinge os 40%»...
Como estamos na época dos santos populares, é natural todo este fogo de artifício.
Como parece óbvio, pelo menos em termos de conclusões da IGF, quando se "conclui"(?) que 40% do valor dos medicamentos comparticipados pelo SNS é potencialmente irregular das duas uma:
1. Ou a IGF não foi capaz de proceder a uma verdadeira análise da actividade inspecionda;
2. Ou, a ser verdade, já devia haver gente a contas com a justiça. Até porque, ao que se diz, não é a primeira vez que são apontadas irregularidades deste tipo.
Mas a isto já estamos habituados.
As nossas "INSPECÇÕES" nem sempre primam pela isenção e competência e pode muito bem ser este o caso.
Por vezes somos surpreendidos e inquiridos por pessoas que de inspectores têm o título e nada mais. Basta atentarmos nas perguntas que nos dirigem. Mas, cantam sempre de galo!
Comparticipação de Medicamentos, 40% de corrupção no nosso país e ninguém vai preso?
Afinal onde está o nosso jornalismo de investigação que não consegue explorar este verdadeiro filão?
A conclusão do relatório, relativamente à potencial corrupção, exige melhor explicação.
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