Paulo Macedo, manipulações
Existem hoje mais 20% de Anestesiologistas e fazem-se mais
33% de cirurgias no SNS que há 8 anos!
A intervenção do Senhor Ministro da Saúde na 4ª Conferência
TSF/Abbvie em Lisboa ao procurar demonstrar uma relação causa-efeito entre a
falta de anestesiologistas e a impossibilidade de se realizarem mais cirurgias,
merece da Direcção do Colégio de Anestesiologia da Ordem dos Médicos o maior
repúdio, e as seguintes considerações:
Entre 2003 e 2013 houve um crescimento nacional em cerca de
20% dos anestesiologistas, num efeito que envolveu não só o SNS como sobretudo
a disponibilidade daqueles para o sector privado.
Num espaço de tempo mais curto, entre 2005 e 2013, os
hospitais que compõem o SNS (incluindo os Hospitais das Regiões Autónomas da
Madeira e dos Açores, assim como como os Hospitais das Forças Armadas) foram
capazes de realizar mais 150.000 cirurgias, passando de 450.000 para 600.000
cirurgias, isto é, um acréscimo de 33%. Assim, é fácil entender que não são as
cirurgias as primeiras a sofrer com o menor número de anestesiologistas, mas
sim outras áreas fruto do alargamento da Especialidade para novas funções e
competências, como sejam, o efectivo controlo da dor aguda pós-operatória ou de
situações crónicas de dor, o apoio à realização de meios complementares de
diagnóstico e terapêutica, a envolvência na Medicina Intensiva, ou ainda a
nossa participação na Emergência Pré-Hospitalar.
Aliás quem acede aos relatórios oficiais da Unidade Central
de Gestão de Inscritos para Cirurgia da Administração Central do Sistema de
Saúde, IP, verifica facilmente que a mediana do tempo de espera da lista de inscritos
para cirurgia é hoje (dados de 2014, últimos disponíveis no site da ACSS) a
mais baixa dos últimos 7 anos, sendo de 2,8 meses. Por outro lado a oferta do
Serviço Nacional de Saúde tem sido sempre crescente nos últimos 7 anos,
demonstrando claramente como falsas são as declarações do Senhor Ministro da
Saúde.
Entretanto, com o início da austeridade em 2011 e o
agravamento das condições remuneratórias dos funcionários públicos em geral e
dos médicos de uma forma muito particular (em alguns casos com perdas
superiores a 30%, entre perda de vencimento no salário base e nas horas
extraordinárias, agravado com o brutal aumento de impostos), iniciou-se um
fluxo migratório destes profissionais, com particular incidência entre os
anestesiologistas, inicialmente atingindo os recém-especialistas e jovens
especialistas e mais recentemente os com maior experiência profissional.
Acrescente-se que o reconhecido valor técnico e científico dos
anestesiologistas portugueses pelos seus pares a nível internacional, torna
este fluxo migratório relativamente fácil para estes profissionais portugueses
altamente qualificados, num verdadeiro “Brain Drain” que atinge hoje como nunca
a Sociedade Portuguesa.
Contudo, têm sido algumas das medidas do actual Governo a
agravar ainda mais o anteriormente relatado quando hoje se procuram substituir
nos hospitais públicos médicos não na base de 1:1 mas sim 1:0,7. Isto é, quando
hoje se substituem 10 anestesiologistas aposentados, os novos especialistas têm
um contrato de trabalho com uma carga horária 30% inferior à dos seus colegas
que saíram do SNS. Significa assim que em 10 novos contratos médicos temos
apenas o equivalente a 7 profissionais, isto quando comparamos com a
contratualização médica na área da anestesiologia a contratos anteriores a
2010.
O Senhor Ministro da Saúde, reduz a carga horária dos
profissionais, depois dos cortes salariais e do aumento brutal de impostos,
para agora reduzir o salário de forma proporcional em relação ao tempo semanal
(às actuais 40 horas semanais, 18 horas deverão ser alocadas ao serviço de
urgência, restando apenas da carga horária semanal 55% para a actividade
electiva, isto é não-urgente), traduzindo-se esta determinação em menor despesa
é certo, mas também em menor disponibilidade de tempo daqueles profissionais.
No cenário actual não admira que o fluxo migratório,
primeiro para o sector privado, depois para o estrangeiro, aumente. Assim, por
mais anestesiologistas que se formem seremos incapazes de aumentar o nº de
anestesiologistas de forma a alargarmos rapidamente a nossa capacidade de
intervenção. Mas, independentemente do número de profissionais o mais
importante é que a prática anestésica seja de elevada segurança e qualidade,
como até aqui têm sentido os portugueses.
A Direcção do Colégio de Anestesiologia publicará em breve o
Relatório Final do Censos Anestesiologia 2014, que permitirá não só tirar uma
fotografia dos Anestesiologistas Portugueses assim como um relato
circunstanciado sobre como se organizam e o que produzem os Serviços de
Anestesiologia dos Hospitais Públicos Portugueses.
Os médicos e no caso
vertente, os anestesiologistas, não se revêm no diagnóstico traçado pelo Senhor
Ministro da Saúde. Ao invés,
consideram ser inquestionável e gravíssima a responsabilidade da actual equipa
ministerial na diáspora dos anestesiologistas portugueses, na perda de
qualidade de alguns serviços hospitalares e consequente perda de idoneidade
formativa de novos anestesiologistas, e ainda pela gravíssima situação a que
chegou o SNS.
A Direcção do Colégio de Anestesiologia da Ordem dos
Médicos, Porto, 04 de Março de 2015
……………………
Em declarações à comunicação social, Paulo Macedo disse que
apesar de a população ter diminuído, no ano passado foram feitas no SNS mais
consultas e mais cirurgias do que ano anterior. Admitiu porém que “o número de
cirurgias não pode aumentar mais por falta de anestesistas”.
Em comunicado, a Direcção do Colégio de Anestesiologia da
Ordem dos Médicos reage de forma enérgica recusando o papel de bode expiatório
mas não nega existirem problemas graves com esta especialidade no SNS.
Tavisto
Etiquetas: bater no fundo, Paulo Macedo
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