sábado, setembro 4

Clarificação…

A clivagem político-ideológica em torno do Estado Social e, em particular, da defesa do SNS universal, geral e tendencialmente gratuito está a deixar os neo-liberais e os interesses económicos que os apoiam com os “nervos em franja”. Pedro Passos Coelho viu-se de repente “entre a espada e a parede” tendo saltado da versão “pose de Estado” para a versão de oscilo-batente ziguezagueante. Com efeito as “clientelas” começam a ficar inquietas. No que se refere à saúde façamos um ponto de situação:

- Imbróglio da revisão constitucional. Ataque ao Estado Social. Destruição do SNS. Queda vertiginosa nas sondagens;

- Estratégia dos interesses privados seriamente ameaçada. Clarificação da posição do PS. Clivagem política e ideológica em torno do SNS;

- Encerramento” (em quatro unidades) das PPP’s com gestão clínica nos hospitais públicos;

- Exposição pública do truque de camuflagem de insustentabilidade (crónica) da ADSE;

- O fim (quase certo) desse embuste que dá pelo nome de deduções fiscais na saúde e que tanto tem servido para inflacionar os custos privados em saúde para além de representar uma grosseira regressividade fiscal;

- Esgotamento do crescimento do mercado de seguros de saúde com a indisfarçável insustentabilidade deste ramo segurador nos últimos anos;

Tendo desaparecido os clássicos argumentos relativos ao acesso (dimensão e características das listas de espera em cirurgia) com inegáveis progressos no acesso e na qualidade da rede pública resta às agências de comunicação e aos jornalistas “amigos” fazer render o peixe dos resultados económico-financeiros dos hospitais públicos ou, em alternativa, um ou outro caso de natureza técnica (como por exemplo a avaria de um aparelho de ar condicionado).

Repare-se que sobre o sector privado para os mesmos temas o silêncio é a regra. Todos sabemos porquê.

Os próximos meses vão ser particularmente quentes no sector da saúde. Se os princípios que têm vindo a ser enunciados forem passados à prática acontecerá, em Portugal, pela primeira vez, uma reforma de natureza histórica.

Olinda

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11 Comments:

Blogger e-pá! said...

..."acontecerá, em Portugal, pela primeira vez, uma reforma de natureza histórica."

Toda a argumentação aduzida sobre a fracturante "clivagem político-ideológica em torno do Estado Social...", que [no actual momento político] aparta o PS do PSD, vai ser posta a prova quando a questão da sustentabilidade do SNS, saltar para cima da mesa.

De facto, os resultados económico-financeiros dos HH's que não sendo brilhantes [nem podiam ser] e, pior, têm sido trazidos a público de modo excêntrico [para não dizer desconchavado] vão questionar os moldes futuros do SNS.
Aí surgirá o inevitável confronto entre o posicionamento doutrinário [a perspectiva política] socialista ou, se quisermos, social-democrata e o pragmatismo [não é propriamente uma doutrina] do Centro e da Direita [PSD e CDS/PP], claramente neo-liberal.
Em paralelo com este inevitável cotejo surgirão os argumentos economicistas [termo que arrepia os gestores]. Se deixar-mos a discussão entrar por aí vamos afundar-nos num mar de contradições. De facto, a primeira definição a ser confrontada é o papel do Estado [lato sensu] no regime [político, económico e social].
Se aceitarmos "emagrecer" o Estado, tout court [sem especificar o quê, como e de que modo] caminharemos para a voragem neoliberal. Na realidade, as doutrinas político-económicas "coxas" caminham, invariavelmente, para o cambaluz social.
São as concepções políticas e económicas gizadas em torno dos cidadãos e do colectivo social e cultural – a Nação - , i. e., as liberdades públicas e individuais, o papel social dos meios de produção [para além do lucro], a regulação dos mercados e, finalmente, a justa repartição da riqueza que, na prática, vão definir os contornos do Estado Social e não ao contrário.

Quando o Estado não se fortalece definindo [e defendendo] áreas económicas e financeiras estratégicas [ou interesses colectivos nucleares] conservando aí posições relevantes [que não obrigatoriamente dominantes – não se trata de “golden shares”] está paulatinamente a escorregar para o objectivo neoliberal da denúncia dos vícios e das inconformidades do Estado Social, sendo um eufemístico modo de pugnar pela sua profunda mitigação [a Direita nunca falará em extinção].

Temos, na presente crise financeira que em vivemos, um exemplo paradigmático sobre a regulação do mercado. Se, como em tempos sugeriu Durão Barroso [e mais recentemente PPC voltou ao assunto], a CGD tivesse sido privatizada o que se teria passado no mercado financeiro nacional com o BPP e o BPN e, por contaminação, com os outros Bancos?
Não foi a poderosa capacidade de intervenção da CGD que acabou por regular este mercado financeiro e evitar o colapso de todo o sistema?

A política para ser verdadeira e confiável, além de um explícito suporte ideológico, tem de mostrar coerência. A actual “onda de privatizações” [englobando sectores económicos que não poderão deixar de ser considerados estratégicos], em nome de realidades orçamentais, é já uma incontornável cedência [parcial, pontual] a princípios neoliberais. Depois, a seu tempo, virá o assalto ao terreno social. E aí não haverá reforma e histórico será o retrocesso político e social.
Portanto, manter as guardas altas, ficar de atalaia! Não cantar loas ao incerto.

11:01 da manhã  
Blogger tambemquero said...

As questões das deduções são uma história mal contada. Por um lado, Portugal é um dos países mais generosos em matéria de dedução fiscal na Europa; por outro, verificamos que os que mais beneficiam com deduções fiscais são os mais ricos.

Quem recupera uma percentagem superior das despesas com saúde são de longe os portugueses com rendimentos mais elevados. A dedução faz-se à colecta, calcula-se primeiro o imposto e depois subtrai-se 30 por cento de despesas em saúde. Se tenho rendimentos mais elevados, consumo mais bens e serviços de saúde. O montante da despesa é ilimitado. Posso apresentar no final do ano um conjunto de facturas no valor de dez mil euros e ao meu lado está alguém de rendimentos pouco elevados que apresenta mil euros; num caso a dedução são três mil euros, noutro são 300 euros.

Jorge Simões, JP julho 07

1:33 da tarde  
Blogger Unknown said...

E quando vamos deixar de utilizar adjectivos - ainda por cima mal utilizados - para discutir factos ou rebater argumentos? O PSD, "neoliberal"? Argumentos "economicistas"?
Digam mas é como é que pensam continuar a sustentar o SNS (incluindo as PPP ocultas). Expliquem como é que o SNS custando (sem as PPP), pelo menos 2000 euros/ano a cada português que trabalha se vai continuar a financiar.
Já agora, expliquem lá porque é que o governo investe tanto na medicina privada (através da CGD)tanto cá como em Espanha.

1:42 da tarde  
Blogger DrFeelGood said...

Do que é que estão à espera?

Correia de Campos meteu na gaveta o Relatório da Sustentabilidade do SNS com a proposta de um conjunto de medidas exequíveis e justas, sem prejuízo da universalidade do sistema, e que se traduziriam na poupança de muitos milhões para o Estado.

2:04 da tarde  
Blogger Setubalense said...

Caro João, os adjectivos existem para ser utilizados. Se tem informação que lhe permita uma análise diferente partilhe-a connosco e diga-nos, então, porque razão este PSD não pode ser referenciado como neo-liberal. Quanto aos custos com a saúde Portugal gasta muito menos “per capita” com o SNS do que a média da EU. No que diz respeito à necessidade de “sustentar” o SNS confesso que prefiro que o Estado sustente as funções sociais e de soberania ao invés de andar a sustentar os “génios” do mercado do tipo BPP ou BPN. É essa mesma rapaziada que veste Prada e emplastra de gel o cabelo que se apresta a fazer parte do coro de apoio a PPC e a este PSD neo-liberal para desmantelar os serviços públicos e capturar mais umas centenas de milhões de euros para deleite das suas aventuras empreendedoras.

Finalmente quanto à CGD devo dizer que estou de acordo consigo. De facto não faz nenhum sentido que um grupo financeiro público se entretenha a “brincar” com activos não financeiros que nem sequer são de interesse estratégico. Nessa matéria adivinham-se novidades em 2011.

2:54 da tarde  
Blogger e-pá! said...

João:

Olhe que não!

Quer goste, quer não [suspeito que não] o neoliberalismo na política, na economia, no mundo financeiro, etc. e os argumentos economicistas nomeadmente na área social, existem.
São como as bruxas...pero que las hay, las hay!

Quem vai pagar é outro assunto. Mas dou-lhe uma sugestão [assim a fugir para a demagogia]:
Os "mesmos" que acudiram à hecatombe financeira, há 2 anos...
Serve?
Lembra-se?

7:48 da tarde  
Blogger Clara said...

No dia em que se escreve, não sabemos ainda que bomba política vai Pedro Passos Coelho (PPC) lançar no domingo, em Castelo de Vide. O que sabemos é que qualquer que seja a potência e pontaria, a limitação dos prejuízos será a sua agenda das duas semanas seguintes. Assim aconteceu com o ultimato relativo ao 9 de Setembro, tal como havia ocorrido com a proposta de revisão constitucional. O 9 de Setembro passou de data de deflagração de um terramoto político a um prazo administrativo anódino, relativa aos poderes do Presidente na dissolução do Parlamento. O estampido de pólvora seca, seguido de geral surpresa, foi desmentido pelo próprio actor principal, emtermos que não deixaram dúvidas e que não careciam de maior explicitação sobre o que pensava de tão anormal proposta. No caso da anulação da tendencial gratuitidade do SNS, argumentaram as hostes do PSD tratar-se de um abuso interpretativo. Nunca a proposta de nova redacção para o artigo 64 afastaria a universalidade no SNS. Pois não. Tal como não é necessário constitucionalizar o acesso “universal” de qualquer cidadão a um serviço privado, de saúde, de restauração, ou de vestuário. A questão está em que a palavra universal só toma sentido constitucional quando o acesso é determinado pela necessidade publicamente reconhecida e não pela capacidade individual de pagar. O sistema de saúde que os amigos de PPC lhe sopraram ao ouvido e até mesmo passaram a escrito, era uma proposta para substituir a universalidade ancorada na necessidade e quase gratuitidade, pela regra geral do pagamento no acesso, ainda que parcial, com a excepcionalidade de não recusa por insuficiência de meios económicos. Apesar dos esforços que os encartados constitucionalistas, ou outros por eles, tenham feito na opinião publicada e até junto de editorialistas de jornais que lhes são próximos, não conseguiram apagar o nitrato de prata do seu grafti.
Os portugueses gostam de pessoas com audácia, que levam até ao fim as suas ideias, mas desencantam- se comos que desistemcedo emais ainda os que dão o dito por não dito. Tivesse PPC mantido as ideias que lançou, boas ou más, e todos estaríamos hoje a discuti-las e a compreendê-las na proporção da convicção e fundamentação com que as apresentasse. Assim, por mais tolerantes que sejam os seus amigos e parceiros, recomendando-lhe uma tardia pedagogia, ou meros caldos de galinha, a verdade é que já não sabemos o que pensa sobre estas e outras matérias. Eis por que, escrevendo à sexta-feira, não posso estar certo do que dirá no domingo. Mas o que quer que diga, bombástico ou macio, perdida a generosa receptividade inicial, deparará agora com uma interrogação. Será para valer, ou para esquecer?
CC, DE 06.09.10

12:05 da manhã  
Blogger saudepe said...

Realmente não faz sentido o Banco do Estado andar envolvido em negócios da Saúde em concorrência com grupos privados nacionais e da vizinha Espanha.

12:19 da manhã  
Blogger Unknown said...

Acho engraçado que digam isto:
" Tendo desaparecido os clássicos argumentos relativos ao acesso (dimensão e características das listas de espera em cirurgia) com inegáveis progressos no acesso e na qualidade"

E todos aplaudem ou omitem a sua opinião...

2:20 da manhã  
Blogger Unknown said...

"The world health report 2010 - Health systems financing: the path to universal coverage


The World Health Report 2010 - Health systems financing: the path to universal coverage Good health is essential to human welfare and to sustained economic and social development. WHO's Member States have set themselves the target of developing their health financing systems to ensure that all people can use health services, while being protected against financial hardship associated with paying for them. In this report, the World Health Organization maps out what countries can do to modify their financing systems so they can move more quickly towards this goal - universal coverage - and sustain the gains that have been achieved The report builds on new research and lessons learnt from country experience. It provides an action agenda for countries at all stages of development and proposes ways that the international community can better support efforts in lowincome countries to achieve universal coverage and improve health outcomes."

DE: http://www.who.int/whr/2010/en/index.html

7:06 da manhã  
Blogger e-pá! said...

Caro saudepe:

A meu ver, é óbvio que a CGD ao se imiscuir na área dos seguros de saúde está a colectar informação concreta [sobre esse "mercado"] a fim de a transaccionar no futuro [próximo ou longínquo?] aos operadores dessa área.
Ao operar no mercado com custos mensais da ordem dos 50 €, com internamento [até 20000€] e cobertura de ambulatório, construirá - durante poucos anos -um priveligiado ficheiro que vale muito dinheiro para prospecções futuras.
Até aqui - como já foi referido no Saudesa - os seguros de saúde à venda em Portugal têm sido meros “fogachos”..., que - para mal dos nossos pecados e do orçamento da Saúde – parasitam, sub-repticiamente, o SNS, nomeadamente, despojando-se da componente medicamentosa [não displicente na “construção” dos preços desses seguros].

Nesse contexto, a CGD, para já, estará no terreno a fim de procurar obter mais conhecimento e melhor informação sobre a viabilidade deste "mercado".
No meu entendimento este terreno aerá para a CGD uma área de short-term investment…[?]

A situação em relação aos HPP's é mais complexa e prender-se-à com objectivos estratégicos mais pesados, i. e., manter uma posição de liderança no mercado de seguros... e, como já foi referido, abrir portas à internacionalização [nesta área], nomeadamente em países "emergentes" sem [eficientes] sistemas públicos de saúde [Áfica?]. Na verdade, a CGD desenvolve actividades [banca comercial e de investimento, gestão de activos, crédito, seguros (saúde incluida) e imobiliário, etc] em 23 países e 4 continentes...

Enfim, business...

11:05 da manhã  

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