quarta-feira, setembro 14

Transplantação em Portugal: um caso de sucesso

A importância da transplantação, para os doentes e para o país, exige outra ponderação e uma atitude de apoio diversa transplantação de órgãos é uma actividade de profundo conteúdo humanístico e representa um enorme avanço da ciência médica.

A transplantação realiza-se com dois objectivos principais. Desde logo, para salvar vidas humanas, nos casos do coração, do fígado ou dos pulmões. Noutras situações, como acontece com o rim ou com o pâncreas, pretende-se melhorar, de forma radical, a qualidade e a duração da vida dessas pessoas.

No domínio da transplantação, Portugal é um caso de sucesso. Nos últimos anos, a colheita de órgãos aumentou de modo muito significativo. A par de Espanha, somos, desde 2009, o único país do mundo com mais de 30 dadores de órgãos por milhão de habitantes.

O número de transplantes de órgãos aumentou cerca de 50% entre 2006 e 2009, mantendo-se estável, desde então. Em 2010, foram realizados quase 900 transplantes de órgãos: 573 do rim, 245 do fígado, 50 do coração, 15 do pâncreas e dez dos pulmões. A lista de espera para transplante renal começou, finalmente, a descer em 2008 e essa tendência manteve-se nos anos seguintes.

Todas as comparações de qualidade indicam o sucesso do programa de transplantação português, com resultados comparáveis ou superiores aos dos restantes países desenvolvidos.

Neste contexto, é com surpresa e preocupação que se podem encarar as medidas mais recentes do Ministério da Saúde neste domínio.

Primeiro, foi a decisão de diminuir em 50% (!) os incentivos para a actividade de transplantação. Esses incentivos eram pagos aos hospitais e permitiam custear os elevados gastos em recursos humanos e técnicos que estão envolvidos. Todos percebemos que, face à situação financeira e orçamental do país, algum corte teria aqui que ser feito. Mas fica por explicar que, num cenário de redução entre os 5 e os 15% em vários sectores da saúde, a redução tenha sido muito superior nesta área específica.

Mais impressionante ainda foi a forma como o senhor ministro da Saúde se referiu a este problema, reconhecendo, sem aparente preocupação, que pode ocorrer uma diminuição do número de transplantes.

Regressemos ao essencial. Parte significativa da transplantação é realizada para salvar vidas. Quero acreditar que não são esses os casos em que a redução da actividade deixa o senhor ministro indiferente.

Resta, assim, a transplantação do rim. Mas, neste caso, há uma outra informação relevante: é que o transplante renal não só melhora a qualidade de vida, como, pasme-se, permite poupar recursos ao Serviço Nacional de Saúde.

De facto, numa primeira fase, há um custo acrescido com a transplantação do rim. Mas o rim transplantado tem uma sobrevida média de perto de 12 anos e a despesa inicial é compensada ao fim de cerca de três anos pela poupança conseguida no tratamento de substituição renal (hemodiálise ou diálise peritoneal).

É verdade que da redução dos incentivos e das declarações do Governo não resulta directamente a redução da transplantação em Portugal. Mas o risco existe e a perturbação causada ficou bem visível na digna demissão dos responsáveis da Autoridade dos Serviços de Sangue e Transplantação.

A importância da transplantação, para os doentes e para o país, exige outra ponderação e uma atitude de apoio bem diversa. Esperemos que seja essa a opção a prevalecer.

Manuel Pizarro, Médico, deputado do PS, JP 14.09.11

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2 Comments:

Blogger saudepe said...

PS acusa Governo de "tentativa de silenciamento" no caso dos transplantes

O PS mostrou-se indignado com a recusa do Governo em chamar ao Parlamento os ex-responsáveis pela transplantação em Portugal. O partido socialista acusou o PSD e CDS de tentarem "silenciar" os problemas do país.

Os socialistas apresentaram esta quarta-feira, na comissão parlamentar de Saúde, um requerimento para chamar à Assembleia da República os ex-responsáveis da Autoridade do Sangue e Transplantação, bem como representantes da Sociedade Portuguesa de Transplantação. Os partidos do Governo rejeitaram o pedido.

O deputado socialista, Manuel Pizarro, considerou que a recusa é sinónimo de "má consciência" dos partidos da maioria em relação às medidas do Governo.

"Revela que há reforçados motivos para que continuemos preocupados com a área da transplantação no nosso país. A nova maioria inaugura um estilo que se julgava ultrapassado. Em relação aos problemas que vão surgindo, opta pela tentativa de os silenciar impedindo o Parlamento de realizar a sua função de fiscalização", indignou-se o deputado e ex-secretário de Estado da Saúde.

Os socialistas apelidam de "insegurança" e "receio" a rejeição da audição dos ex-responáveis da transplantação feita pelo PSD e CDS. Requerimento esse que contou com os votos favoráveis de toda a oposição.

A polémica em torno dos transplantes surgiu depois de, em entrevista à TVI, o ministro da Saúde, Paulo Macedo, ter declarado ser preciso perceber se o país "pode sustentar o actual número de transplantes". O ministro defendeu que se pode ter uma quantidade de intervenções "tão interessantes e de qualidade" dando menos incentivos aos hospitais.

No início de Setembro, o presidente e a coordenadora nacional da Autoridade dos Serviços do Sangue e da Transplantação pediram a demissão em protesto contra as intenções do ministro da Saúde de cortar as verbas do organismo.

João Rodrigues Pena e Maria João Aguiar disseram não aceitar "que haja doentes que se podem salvar mas que vão morrer porque o país está em dificuldades económicas".

JN 14.09.11

12:09 da manhã  
Blogger maria silva said...

O ministro da saúde disse que 1,7 milhões de portugueses não tem médico de familia! Será que a maioria desses utentes que estão inscritos nos centros de saúde querem mesmo médico de famíla? A maior parte dos utentes que querem médico de família são os doente crónicos, as crianças e as grávidas pobres porque a classe média e rica prefere o pediatra e o obstreta/ginecologista. Por acaso acha que um adulto saudável quer médico de familia? Eles quando recorrem ao Centro de Saude vão para actualizar as vacinas ou quando necessitam de algum tratamento de enfermagem. Por acaso já foram efectuadas as taxas de frequencia anual destes adultos nas consultas médicas? Sabia que quando acontece alguma situação urgente a estes utentes eles procuram é o serviço de urgência e não o médico de família. Caso tenham dúvidas consultem as estatisticas dos centros de saúde e identifiquem quem são os funcionários que estão mais em falta para a população!!!!

12:05 da tarde  

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