sexta-feira, agosto 28

Médicos sem família

Uma estranha lei foi aprovada na Assembleia da República (AR), a Lei 79/2015 de 29 de julho, obriga a que a cada criança seja atribuído um Médico de Família (MF). Parece uma lei bondosa, com a qual, à partida, todos concordariam. Traduz, porém, uma triste realidade, o Ministério da Saúde (MS) falhou a única promessa que fez ao país, a de dar a todos um MF. E falhou, não por falta de médicos, mas sim pelos cortes cegos e pelas más condições de trabalho no SNS
Efetivamente, muitos MF abandonaram o SNS para as reformas antecipadas (com penalização), para o setor privado ou para a emigração. Há em Portugal um número suficiente de MF para dar um MF a todos os portugueses! Se o MS estivesse disponível para pagar aos médicos portugueses a despesa que assumiu com os médicos cubanos (sem especialidade), seria possível que todos os portugueses tivessem um verdadeiro MF, com a especialidade de Medicina Geral e Familiar (MGF), com óbvios benefícios para os doentes e inequívocos ganhos em saúde.
As medidas implementadas pelo MS para contratar médicos reformados foram um falhanço, porque as condições oferecidas eram deploráveis. Mais uma vez, o MS demonstrou que prefere deixar cidadãos sem MF do que disponibilizar condições financeiras condignas para, transitoriamente, os MF reformados regressarem ao trabalho. 
Alguns dizem que é preciso formar mais médicos! Para investir ainda mais em formação médica para a emigração? Neste momento há cerca de 2000 jovens médicos a fazer a especialidade de MGF, pelos que alguns destes já irão obrigatoriamente para o desemprego ou para a emigração. O problema em Portugal não é de falta de médicos. Portugal é o quarto país da União Europeia com mais médicos! O MS é que não quis dar um MF a todos os portugueses, apenas para poupar mais dinheiro! Neste panorama, como se fosse possível resolver um problema através de uma lei, a AR determinou que a cada criança seja obrigatoriamente atribuído um MF! Como, se o MS não os contrata? Como, se eles continuarem a emigrar?
O curioso é que o dito MF só seria médico da criança, não da família, pois não haveria vagas para os restantes membros. Não seria um MF, mas sim algo novo inventado pela AR, um médico sem família! Já é tempo deste país deixar de aprovar leis absurdas e desnecessárias! Está ao alcance do MS, eu fá-lo-ia ainda este ano, resolver este problema e dar um MF a todos os portugueses. Bastaria contratar, durante o máximo de dois a três anos, cerca de 600 entre os 1500 MF reformados.
 JOSÉ MANUEL SILVA, 21.08.15

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