Nuno Grande e a estratégia de CC
Conheço e admiro suficientemente o Prof. Nuno Grande link para ficar convencido de que o seu pronunciamento não pode ter o sentido que se arrisca a ver ser-lhe atribuído. (ver Post Dois Médicos - Duas opiniões sobre o Ministro da Saúde, António Correia de Campos (link) «Para ser bom [o Serviço Nacional de Saúde], tem de dar prejuízo, ou seja, tem de dar resposta. E dar resposta às necessidades pode significar um custo cada vez maior»
1. Numa primeira leitura, inculcada pelo contexto em que se insere de apreciação do Ministro da Saúde – cuja principal preocupação, diz Nuno Grande, é “não esgotar o orçamento” –, o Professor estaria a dar razão aos que entendem que a política de saúde não tem de sofrer limitações derivadas do volume dos recursos que lhe são afectados. Isto é, e resumindo, o problema da sustentabilidade financeira do SNS não passa de um falso problema e, mais do que isso, seria um problema ilegítimo. Para ser bom o SNS tem de dar prejuízo; resposta igual a prejuízo, não o discutam, assumam-no, porque “dar resposta às necessidades pode significar um custo cada vez maior”. Com este entendimento, o passo seguinte seria afirmar que a Etiópia, Moçambique, a Nigéria ou a Guiné (referidos apenas por serem países muito pobres) poderão ter serviços de saúde concorrenciais com os dos países mais ricos em qualidade, acessibilidade e generalidade porque, terem-nos ou não, não dependeria da quantidade de recursos que pudessem mobilizar para a saúde mas sim da vontade e das decisões dos seus governantes.
2. É evidente que estes e outros que tais disparates não são compatíveis com o Professor Nuno Grande cuja dimensão como professor e intelectual o É-pá e o Tonitosa muito justamente relevaram. NG é “um homem que incorporou e tem vivido a máxima de Abel Salazar: "QUEM SÓ SABE MEDICINA, NEM MEDICINA SABE". NG sabe muito bem, tal como CC, que “os resultados em saúde dependem pouco do sistema de saúde (não mais de 10%), segundo alguns autores”, como, há tempos, aqui referiu o Semmisericórdia (Post Despesas em saúde - Nível de riqueza dos países (1.ª parte)>link. Dependem muito mais de opções e condicionantes provindas de outras áreas, como níveis educacionais, padrões de comportamento e estilos de vida, hábitos alimentares, condições habitacionais e, em geral, do meio ambiente, áreas que, todas elas, são concorrentes com os serviços de saúde na afectação dos recursos existentes. NG sabe que as necessidades não existem apenas nos serviços de saúde, que todas exigem resposta e que dar resposta às necessidades pode significar um custo cada vez maior» que, obviamente, tem de ser pago. Há opções que têm de ser feitas e prioridades que têm de ser definidas. Obter resultados em saúde é, obviamente, o objectivo maior que a política de saúde tem de prosseguir: mais e melhor saúde para todos. Mas só numa posição autista poderia negar-se a legitimidade do Governo para as grandes opções de atribuição dos recursos e do M.S. na definição da estratégia para atingir os resultados pretendidos.
3. Não é a proclamação da independência da saúde perante os limites possibilitados pela economia nem o elogio do deficit que NG pretende fazer. Na minha leitura, o seu objectivo é duplo e suporta-se nos dois períodos da citação feita no Post Dois Médicos (link), inicialmente referido:
i) - Expressar a sua discordância da estratégia de CC, a revelar que a sua ”principal preocupação é «não esgotar o orçamento», algo que, a acontecer, e nos actuais moldes, significa apenas que o sistema não funciona” (só o sublinhado é meu);
ii) - Dizer o que todos os AH sempre consideraram ponto de ética fundamental ou limite inultrapassável para a legitimidade da sua intervenção, mas que NG considera agora oportuno reafirmar: o equilíbrio orçamental não pode ser atingido pela negação de resposta às necessidades: «Para ser bom [o Serviço Nacional de Saúde], tem de dar prejuízo, ou seja, tem de dar resposta”.
4. Sobre este segundo item, e dando de barato a equivalência que, nos actuais moldes, NG faz entre resposta e prejuízo (ponto este que não é de somenos importância porque a boa resposta pode induzir deficit, mas nunca prejuízo), direi apenas que ele se insere na problemática da avaliação do desempenho das instituições e dos seus gestores nos diversos níveis. Se essas situações existem as ARS e a ACSS têm a obrigação estrita de as detectar e sancionar adequadamente porque a avaliação não pode incidir apenas nos aspectos quantitativos de cumprimento do contrato programa e do consequente orçamento. Mais uma vez a importância e a urgência da aprovação do Código dos Gestores e da sua avaliação saem reforçadas.
5. Quanto à estratégia de CC, diversas vezes expressei concordância com o que me parece serem alguns dos seus pontos fundamentais e que vão no mesmo sentido das mudanças em curso noutros países, designadamente no RU. Entendo, porém, que outros pontos estratégicos estão em falta ou, pelo menos, não são do meu conhecimento. Além disso, há toda a problemática ligada ao que costuma designar-se como gestão da mudança, em relação à qual, não me considerando particularmente credenciado, me parece ter havido alguma inabilidade ou falta de sentido político.
5.1 – São pontos de concordância ao nível da estratégia:
i) – A convicção que partilho de que, situando-nos no grupo de países da EU15 que mais recursos afecta à saúde (actualmente mais de 10% do PIB, em paridades de poder de compra) as insuficiências reconhecidas ao nosso SNS não deverão ser supridas através da injecção de recursos adicionais a suportar pelos impostos que pagamos. Mais ainda, ir por essa via, além de imoral porque, (num quadro em que o desperdício está subavaliado em 25%!), agravaria mais ainda o esforço exigido aos cidadãos já duramente tributados, estimularia o desperdício e a sub-produtividade, não eliminaria as insuficiências invocadas, viria em prejuízo de outras áreas igualmente carecidas, retardando a recuperação do “gap” que nos separa dos restantes parceiros da EU. Isto é, prolongaria a crise e iria acelerar a marcha no sentido da aproximação do cenário da insustentabilidade;
ii) – A reforma necessária tem de centrar-se, predominantemente, no lado da oferta, procurando a forma de extrair dos recursos disponíveis maior e melhor resposta às necessidades da população. Maior produtividade e menor desperdício são as palavras-chave e, nesta linha, devem ser particularmente relevadas diversas medidas que visam reequilibrar e racionalizar a rede de prestação de cuidados:
a) afirmação e redefinição da área e da importância dos CSP/USF, no sentido de a habilitar a dar a resposta precoce, próxima e necessária a 90 e muitos % das necessidades da população. Sobre esta temática tive oportunidade de me pronunciar na fundamentação das questões sugeridas para análise do Responsável da MCSP Link, para o qual remeto para evitar repetições);
b) reestruturação das redes de maternidades e de serviços de urgência que, embora com o efeito das reacções adversas (e custosas) conhecidas e que toda a gente presenciou, devem ser entendidas como medidas positivas de racionalização (não de racionamento), susceptíveis de, quando concretizadas, garantirem maior segurança aos utentes de serviços melhor apetrechados em recursos humanos e em equipamentos; além disso, há outras consequências benéficas esperáveis: não só de redução das despesas, principalmente de libertação de profissionais para o trabalho programado nas várias vertentes em que deve desenvolver-se (curativa, de prevenção e de promoção da saúde, incluindo a educação para a saúde);
c) a afirmação, ainda que incipiente na concretização, da rede de Cuidados Continuados, abrindo caminho para a revisão da missão dos pequenos HH, geralmente propriedade das Misericórdias e nos quais, quando existissem ou pudessem ser criadas as condições exigíveis, poderiam também ser instalados Centros de Saúde, aproximando áreas que deverão funcionar em estreita colaboração, se entendermos que ao MF compete a função de gestor da saúde do seu doente, em todas as fases de intervenção, ou pelo menos de conselheiro técnico da gestão a fazer pelo próprio doente;
d) a intervenção na rede Hospitalar, concentrando recursos (criação de CH) ou desconcentrando, como foi o caso dos HCL cuja sobrevivência com a dimensão e dispersão geográfica anteriores só por razões históricas se compreendia (faltam intervenções no mesmo sentido em Coimbra e no Porto, cidades onde subsistem Hospitais de dimensão excessiva, apesar de outros terem sido construídos ou estarem em construção);
e) a manutenção do estatuto jurídico de maior autonomia dos HH-SA, agora HH-EPE, que afastou algumas das peias legais ou burocráticas que dificultavam a gestão dos HH.
iii) – A importância que reconheço ao equilíbrio financeiro do SNS e ao cumprimento do respectivo orçamento, sem que, com isso, esteja a defender o seu primado sobre a razão de ser dos serviços de saúde que é evidentemente a prestação dos cuidados necessários e não o equilíbrio orçamental. Este é, no entanto, um importante teste de credibilidade para o SNS e para a capacidade de o MS o conseguir gerir tal comoo projecta. Falhá-lo, implicará, previsivelmente, consequências para toda a estratégia, entre elas, sério risco de se voltar ao ponto zero, como recentemente referi As Grandes Opções e o Orçamento (link) .
5.2 – Como referi, há pontos que deveriam fazer parte da estratégia e que não se vislumbram. Pelo contrário, o que transparece são sinais em sentido contrário:
a) a promoção da exclusividade pareceria, é, do ponto de vista lógico, fundamental na superação do quadro de sub-produtividade do SNS. Porém, aquilo a que assistimos é CC a abrir mão dela como moeda de troca para – imagine-se! – fazer passar o controlo biométrico da assiduidade. Mais ainda, isto verifica-se quando o maior partido da oposição afirma como ponto programático a exigência da exclusividade. Perde-se assim a oportunidade de consenso à volta de uma medida que viria trazer maior transparência num ponto a que não só eu atribuo grande importância;
b) Uma das necessidades reconhecidas no âmbito do SNS é a existência de concorrência, quer interna quer externa, e tanto se tivermos em mente a qualidade e a segurança da efectivação das prestações como se pensarmos simplesmente na promoção da produtividade dos recursos. Mas, sem avaliação não haverá concorrência ou, se a houver, será desastrosa para o SNS e para a prestação de cuidados de saúde à população. Avaliar é função da qual o MS nunca poderá demitir-se. O MS foi objecto de uma reforma orgânica. A rede de serviços prestadores sofreu transformações, como acima referi. Onde estão sinais, simples expectativas que sejam, de adequação da anterior capacidade de avaliação (pouca e pobre) às novas exigências das condições actuais e futuras? Se a intenção existe, o mínimo que pode dizer-se é que está muito bem camuflada, parecendo que, em termos do que transparece, a reforma se limitou a rebaptizar o IGIFS, agora ACSS. No entanto, as responsabilidades e as expectativas criadas pela nova legislação são bastante mais amplas.
5.3 – Quanto à gestão da mudança omitirei aspectos que me parecem mais consensuais, por isso mesmo e porque já outras vezes foram referidos. Limitar-me-ei a observar que a generalidade das boas medidas que foram decididas e anunciadas há longos meses convergem no facto de todas elas, com excepção do equilíbrio orçamental, estarem em início ou em curso de execução, sem resultados visíveis ou invocáveis. Dir-se-á que, estando em causa mudanças estruturais, são de implementação continuada e apenas o decurso do tempo poderá permitir que sejam analisadas pelos resultados.
Porventura com razão, mas isso não altera os factos: os resultados que se atingirem serão lentamente produzidos e a necessidade de se verificarem é urgente, sob pena de, provavelmente, até o equilíbrio orçamental se perder em 2008.
Aidenos.
1. Numa primeira leitura, inculcada pelo contexto em que se insere de apreciação do Ministro da Saúde – cuja principal preocupação, diz Nuno Grande, é “não esgotar o orçamento” –, o Professor estaria a dar razão aos que entendem que a política de saúde não tem de sofrer limitações derivadas do volume dos recursos que lhe são afectados. Isto é, e resumindo, o problema da sustentabilidade financeira do SNS não passa de um falso problema e, mais do que isso, seria um problema ilegítimo. Para ser bom o SNS tem de dar prejuízo; resposta igual a prejuízo, não o discutam, assumam-no, porque “dar resposta às necessidades pode significar um custo cada vez maior”. Com este entendimento, o passo seguinte seria afirmar que a Etiópia, Moçambique, a Nigéria ou a Guiné (referidos apenas por serem países muito pobres) poderão ter serviços de saúde concorrenciais com os dos países mais ricos em qualidade, acessibilidade e generalidade porque, terem-nos ou não, não dependeria da quantidade de recursos que pudessem mobilizar para a saúde mas sim da vontade e das decisões dos seus governantes.
2. É evidente que estes e outros que tais disparates não são compatíveis com o Professor Nuno Grande cuja dimensão como professor e intelectual o É-pá e o Tonitosa muito justamente relevaram. NG é “um homem que incorporou e tem vivido a máxima de Abel Salazar: "QUEM SÓ SABE MEDICINA, NEM MEDICINA SABE". NG sabe muito bem, tal como CC, que “os resultados em saúde dependem pouco do sistema de saúde (não mais de 10%), segundo alguns autores”, como, há tempos, aqui referiu o Semmisericórdia (Post Despesas em saúde - Nível de riqueza dos países (1.ª parte)>link. Dependem muito mais de opções e condicionantes provindas de outras áreas, como níveis educacionais, padrões de comportamento e estilos de vida, hábitos alimentares, condições habitacionais e, em geral, do meio ambiente, áreas que, todas elas, são concorrentes com os serviços de saúde na afectação dos recursos existentes. NG sabe que as necessidades não existem apenas nos serviços de saúde, que todas exigem resposta e que dar resposta às necessidades pode significar um custo cada vez maior» que, obviamente, tem de ser pago. Há opções que têm de ser feitas e prioridades que têm de ser definidas. Obter resultados em saúde é, obviamente, o objectivo maior que a política de saúde tem de prosseguir: mais e melhor saúde para todos. Mas só numa posição autista poderia negar-se a legitimidade do Governo para as grandes opções de atribuição dos recursos e do M.S. na definição da estratégia para atingir os resultados pretendidos.
3. Não é a proclamação da independência da saúde perante os limites possibilitados pela economia nem o elogio do deficit que NG pretende fazer. Na minha leitura, o seu objectivo é duplo e suporta-se nos dois períodos da citação feita no Post Dois Médicos (link), inicialmente referido:
i) - Expressar a sua discordância da estratégia de CC, a revelar que a sua ”principal preocupação é «não esgotar o orçamento», algo que, a acontecer, e nos actuais moldes, significa apenas que o sistema não funciona” (só o sublinhado é meu);
ii) - Dizer o que todos os AH sempre consideraram ponto de ética fundamental ou limite inultrapassável para a legitimidade da sua intervenção, mas que NG considera agora oportuno reafirmar: o equilíbrio orçamental não pode ser atingido pela negação de resposta às necessidades: «Para ser bom [o Serviço Nacional de Saúde], tem de dar prejuízo, ou seja, tem de dar resposta”.
4. Sobre este segundo item, e dando de barato a equivalência que, nos actuais moldes, NG faz entre resposta e prejuízo (ponto este que não é de somenos importância porque a boa resposta pode induzir deficit, mas nunca prejuízo), direi apenas que ele se insere na problemática da avaliação do desempenho das instituições e dos seus gestores nos diversos níveis. Se essas situações existem as ARS e a ACSS têm a obrigação estrita de as detectar e sancionar adequadamente porque a avaliação não pode incidir apenas nos aspectos quantitativos de cumprimento do contrato programa e do consequente orçamento. Mais uma vez a importância e a urgência da aprovação do Código dos Gestores e da sua avaliação saem reforçadas.
5. Quanto à estratégia de CC, diversas vezes expressei concordância com o que me parece serem alguns dos seus pontos fundamentais e que vão no mesmo sentido das mudanças em curso noutros países, designadamente no RU. Entendo, porém, que outros pontos estratégicos estão em falta ou, pelo menos, não são do meu conhecimento. Além disso, há toda a problemática ligada ao que costuma designar-se como gestão da mudança, em relação à qual, não me considerando particularmente credenciado, me parece ter havido alguma inabilidade ou falta de sentido político.
5.1 – São pontos de concordância ao nível da estratégia:
i) – A convicção que partilho de que, situando-nos no grupo de países da EU15 que mais recursos afecta à saúde (actualmente mais de 10% do PIB, em paridades de poder de compra) as insuficiências reconhecidas ao nosso SNS não deverão ser supridas através da injecção de recursos adicionais a suportar pelos impostos que pagamos. Mais ainda, ir por essa via, além de imoral porque, (num quadro em que o desperdício está subavaliado em 25%!), agravaria mais ainda o esforço exigido aos cidadãos já duramente tributados, estimularia o desperdício e a sub-produtividade, não eliminaria as insuficiências invocadas, viria em prejuízo de outras áreas igualmente carecidas, retardando a recuperação do “gap” que nos separa dos restantes parceiros da EU. Isto é, prolongaria a crise e iria acelerar a marcha no sentido da aproximação do cenário da insustentabilidade;
ii) – A reforma necessária tem de centrar-se, predominantemente, no lado da oferta, procurando a forma de extrair dos recursos disponíveis maior e melhor resposta às necessidades da população. Maior produtividade e menor desperdício são as palavras-chave e, nesta linha, devem ser particularmente relevadas diversas medidas que visam reequilibrar e racionalizar a rede de prestação de cuidados:
a) afirmação e redefinição da área e da importância dos CSP/USF, no sentido de a habilitar a dar a resposta precoce, próxima e necessária a 90 e muitos % das necessidades da população. Sobre esta temática tive oportunidade de me pronunciar na fundamentação das questões sugeridas para análise do Responsável da MCSP Link, para o qual remeto para evitar repetições);
b) reestruturação das redes de maternidades e de serviços de urgência que, embora com o efeito das reacções adversas (e custosas) conhecidas e que toda a gente presenciou, devem ser entendidas como medidas positivas de racionalização (não de racionamento), susceptíveis de, quando concretizadas, garantirem maior segurança aos utentes de serviços melhor apetrechados em recursos humanos e em equipamentos; além disso, há outras consequências benéficas esperáveis: não só de redução das despesas, principalmente de libertação de profissionais para o trabalho programado nas várias vertentes em que deve desenvolver-se (curativa, de prevenção e de promoção da saúde, incluindo a educação para a saúde);
c) a afirmação, ainda que incipiente na concretização, da rede de Cuidados Continuados, abrindo caminho para a revisão da missão dos pequenos HH, geralmente propriedade das Misericórdias e nos quais, quando existissem ou pudessem ser criadas as condições exigíveis, poderiam também ser instalados Centros de Saúde, aproximando áreas que deverão funcionar em estreita colaboração, se entendermos que ao MF compete a função de gestor da saúde do seu doente, em todas as fases de intervenção, ou pelo menos de conselheiro técnico da gestão a fazer pelo próprio doente;
d) a intervenção na rede Hospitalar, concentrando recursos (criação de CH) ou desconcentrando, como foi o caso dos HCL cuja sobrevivência com a dimensão e dispersão geográfica anteriores só por razões históricas se compreendia (faltam intervenções no mesmo sentido em Coimbra e no Porto, cidades onde subsistem Hospitais de dimensão excessiva, apesar de outros terem sido construídos ou estarem em construção);
e) a manutenção do estatuto jurídico de maior autonomia dos HH-SA, agora HH-EPE, que afastou algumas das peias legais ou burocráticas que dificultavam a gestão dos HH.
iii) – A importância que reconheço ao equilíbrio financeiro do SNS e ao cumprimento do respectivo orçamento, sem que, com isso, esteja a defender o seu primado sobre a razão de ser dos serviços de saúde que é evidentemente a prestação dos cuidados necessários e não o equilíbrio orçamental. Este é, no entanto, um importante teste de credibilidade para o SNS e para a capacidade de o MS o conseguir gerir tal comoo projecta. Falhá-lo, implicará, previsivelmente, consequências para toda a estratégia, entre elas, sério risco de se voltar ao ponto zero, como recentemente referi As Grandes Opções e o Orçamento (link) .
5.2 – Como referi, há pontos que deveriam fazer parte da estratégia e que não se vislumbram. Pelo contrário, o que transparece são sinais em sentido contrário:
a) a promoção da exclusividade pareceria, é, do ponto de vista lógico, fundamental na superação do quadro de sub-produtividade do SNS. Porém, aquilo a que assistimos é CC a abrir mão dela como moeda de troca para – imagine-se! – fazer passar o controlo biométrico da assiduidade. Mais ainda, isto verifica-se quando o maior partido da oposição afirma como ponto programático a exigência da exclusividade. Perde-se assim a oportunidade de consenso à volta de uma medida que viria trazer maior transparência num ponto a que não só eu atribuo grande importância;
b) Uma das necessidades reconhecidas no âmbito do SNS é a existência de concorrência, quer interna quer externa, e tanto se tivermos em mente a qualidade e a segurança da efectivação das prestações como se pensarmos simplesmente na promoção da produtividade dos recursos. Mas, sem avaliação não haverá concorrência ou, se a houver, será desastrosa para o SNS e para a prestação de cuidados de saúde à população. Avaliar é função da qual o MS nunca poderá demitir-se. O MS foi objecto de uma reforma orgânica. A rede de serviços prestadores sofreu transformações, como acima referi. Onde estão sinais, simples expectativas que sejam, de adequação da anterior capacidade de avaliação (pouca e pobre) às novas exigências das condições actuais e futuras? Se a intenção existe, o mínimo que pode dizer-se é que está muito bem camuflada, parecendo que, em termos do que transparece, a reforma se limitou a rebaptizar o IGIFS, agora ACSS. No entanto, as responsabilidades e as expectativas criadas pela nova legislação são bastante mais amplas.
5.3 – Quanto à gestão da mudança omitirei aspectos que me parecem mais consensuais, por isso mesmo e porque já outras vezes foram referidos. Limitar-me-ei a observar que a generalidade das boas medidas que foram decididas e anunciadas há longos meses convergem no facto de todas elas, com excepção do equilíbrio orçamental, estarem em início ou em curso de execução, sem resultados visíveis ou invocáveis. Dir-se-á que, estando em causa mudanças estruturais, são de implementação continuada e apenas o decurso do tempo poderá permitir que sejam analisadas pelos resultados.
Porventura com razão, mas isso não altera os factos: os resultados que se atingirem serão lentamente produzidos e a necessidade de se verificarem é urgente, sob pena de, provavelmente, até o equilíbrio orçamental se perder em 2008.
Aidenos.
Etiquetas: Aidenós
5 Comments:
Caro aidenós:
Algumas questões - fundamentalmente do foro político - que já me tinham despertado a atenção no post " As Grandes Opções e o Orçamento" e que, no essencial, voltam a ser repisadas no presente texto.
"o Professor estaria a dar razão aos que entendem que a política de saúde não tem de sofrer limitações derivadas do volume dos recursos que lhe são afectados".
Voltamos sempre ao mesmo.
Quem decide o volume de recursos que devem (ou não) ser afectados à Saúde:
- Os ratios europeus?
- Os macroeconomistas?
- Ou os gestores?
E, para pararmos de andar em círculo, volto a afirmar que, em minha opinião, a decisão dos recursos a afectar cabe ao poder político.
Essa a grande divergência que num quadro democrático se pode resumir na "subordinização de poderes" ou, se quisermos, na "herarquização dos poderes".
Que obviamente, tem de pesar as circunstâncias em que o País está a viver, isto é, quase 2 milhões de portugueses no limiar da pobreza, 8% de taxa de desemprego, um inusitado e complicado individamento das famílias, etc., bem como as condições particulares intrinsecas como exprime no texto (como níveis educacionais, padrões de comportamento e estilos de vida, hábitos alimentares, condições habitacionais e, em geral, do meio ambiente, ....)
Quando um Governo tem em mãos - não vamos espiolhar culpas presentes ou passadas - uma situação deste calibre, em minha opinião, tem de conjugar duas prioridades: promover o desenvolvimento (óbvio, senão não saí do "buraco") e proteger a retaguarda social (tornar a vida dos portugueses "suportável").
Estas opções políticas têm custos económicos como é óbvio. Deste modo e não ao contrário.
Sendo assim, compete ao poder político resolvê-las. Se 10% do PIB não asseguram a sustentabilidade do SNS, sejam 11%.
Como arranjá-los? Essas são as prioridades políticas que informam toda a doutrina do exercício do poder, nomeadamente, saber lidar com um facto que constantemente se oculta: a re-distribuição da riqueza.
E não ao contrário, isto é, o constante apelo ao "apertar do cinto" com a promessa qoe vêm aí dias lindos...
Claro que deve haver uma avaliação ao desempenho das instituições de saúde (não separaria os gestores das instituições).
Agora os 25% de desperdício calculados (segundo me parece) pelo TC, continuarão a ser um número imutável, uma espada de Dâmocles sobre a cabeça dos trabalhadores da Saúde ?
Não houve progressos no combate ao desperdício?
Não houve ganhos de eficiência?
Continuamos nos 25% até quando?
E finalmente, mesmo que a taxa do PIB afecta à saude nos 15 da UE, esteja corrigida em paridades de poder de compra, convém não julgar - nem comparar - as nossas condições sócio-económicas globais com a dos tais "15", porque não vejo que existam sistemas de paridades que as equilibrem.
E como temos piores condições económico-sociais e até culturais, temos pior Saúde, e para combater estes danos necessariamente que será preciso mais dinheiro.
´
Foi deste modo que entendi o Prof. Nuno Grande.
E, é, também, o que espero de um Governo, suportado pelo Partido Socialista, em questões de Justiça Social.
Tanto mais que os peritos que o Expresso entrevistou (Medina Carreira, Eduardo Catroga, Bagão Félix, Manuela Arcanjo e Miguel Beleza) excluem a ideia de baixar qualquer espécie de impostos, põem expressamente em causa a ortodoxia das contas do Governo e continuam a insistir no excesso de despesa, sobretudo no crescimento da despesa corrente primária.
Este palavreado esotérico esconde, como Portugal inteiro já está farto de saber, uma realidade básica: a impossibilidade de reduzir o pessoal e as funções do Estado, isto é, a impossibilidade da famigerada "reforma" que Sócrates prometeu e anda por aí a fingir que faz. Primeiro, porque os partidos, que são parte e parcela do Estado, não o permitiriam, mesmo quando na oposição pretendem que sim. Segundo, porque Sócrates, apesar do jogging, não tem feitio de suicida. E terceiro, porque se tornou dogmático na política indígena que tocar no Estado Providência e numa infinidade de "prestações sociais" (para usar essa palavra equívoca), sem utilidade ou justificação, provocaria um levantamento geral. A paralisia, no fundo, acabou por se tornar o verdadeiro destino do país.
VPV JP 04.11.07
Já agora falta concluir o artigo de hoje no Publico de VPV...
Isto é, o caminho do Iberismo como instrumento salvador da "paralisia" (...no entender de VPV subsidiárias das tais "prestações sociais", designação espúria que lhe surgiu, para atacar cá dentro o Estado Social que, reconheça-se, existe e funciona em Espanha).
Mas voltemos ao "neo-Iberismo":
Depois de Saramago, VPV.
Quem se segue na argumentação:
O capital financeiro?
Será que podemos resolver o problema do nosso futuro com uma OPV à Espanha?
Começa a ser difícil trabalhar no sector social do Estado.
Dos sectores neo-liberais, cada vez mais agressivos, temos de suportar tudo:
Desde o insulto grátis sobre a ineficiência, a ineficácia, quando não a incompetência, até ao ónus de que a "nossa morte", pura e simples, sem exéquias, seria a libertação nacional.
Muitos dos que assim falam "cresceram " no sector social público. O próprio VPV é investigador do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa...
Por alguma razão - que não confessam - essa condição de servidor do Estado - principalmente os que trabalham na área social : Saúde, Educação, etc - tornou-se um estorvo. Um bloqueio ao desenvolvimento, ao progresso e, penso eu, uns impecilhos ao livre funcionamento do mercado. Quando o mercado entra em funcionamento vêm sempre com problemas sociais (inventam pessoas económicamente débeis e socialmente problemáticas)... que "atrasam" o País e "desregulam" o sacrossanto mercado...
Mas, estou convicto, a solução para compreender e resolver a "paralisia" passa, em larga medida, por aqui. Por compreeender a doutrina conservadora e liberal. Ambas.
Na mesma tecla, o professor Marcelo, hoje, na RTP, sobre a compra das propriedaes Alentejanas, ao ritmo de dez por semana, beneficiando de linhas de crédito a trinta anos de bancos públicos espanhois.
Excelente análise, blogger esclarecido e de grande nível.
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