quarta-feira, maio 11

Troika e mobilidade do pessoal da Saúde

Introducing rules to increase mobility of healthcare staff…
3.80. Introduzir regras para aumentar a mobilidade dos profissionais de saúde (incluindo médicos) dentro e entre regiões de saúde. Adoptar para todos os funcionários (incluindo médicos) regimes de tempo flexível, com o objectivo de reduzir em pelo menos 10% os gastos na compensação de horas extras em 2012 e outros 10% em 2013. Implementar um controlo mais rigoroso dos horários de trabalho e actividades do pessoal no hospital. (1T 2012)

A necessidade de recorrer à mobilidade dos grupos profissionais em Saúde, em serviços públicos, é sempre um sintoma de profundos problemas da funcionalidade do sistema.
Levanta, ao nível da organização, importantes questões prévias: má distribuição dos recursos humanos; desequilíbrios de pessoal em áreas especializadas; variações demográficas locais ou regionais imprevistas e, finalmente, défice [quantitativo] de profissionais.
Revela, à posteriori, falta de monitorização das vagas formativas, um deficiente processo formativo e, posteriormente, mecanismos enviesados de recrutamento, com ausência de um código de ético.
Mas, fundamentalmente, a distribuição dos recursos humanos, na Saúde, é subsidiária de um planeamento adequado, de uma rigorosa [e antecipada] previsão das necessidades [vagas a preencher]; da definição e especificação das condições de trabalho; da elaboração de estratégias de motivação profissional; da densidade demográfica e, ainda, de particularidades geográficas [vias de acessibilidade que condicionam a procura].
A cooperação entre as instituições formadoras e os locais de destino dos profissionais deverá ser permanente desde o início ao terminus da formação, devendo prosseguir para além do provimento. A necessidade de promover mecanismos compensatórios em relação aos centros formadores deve ser implementada e encarada como um estímulo para garantir um elevado nível de eficiência e a educação continuada.

A mobilidade decorrente de uma errática colmatação de necessidades prementes ou urgentes deve ser sempre temporária, i. e., limitada no tempo e, quando possível, rotativa. Não pode ser arbitrária, nem poderá significar “colocar alguém na prateleira”. A boa gestão deverá induzir as instituições de Saúde com défice de recursos humanos a perseguirem o objectivo da “auto-suficiência” e resguardarem-se da dependência de mobilizações especiais [voluntárias ou obrigatórias].
O mapeamento das competências profissionais disponíveis no País, bem como o levantamento das necessidades futuras é crucial na gestão de recursos humanos [está assinalada no memorando da troika] e, quando [bem] executado, deve reduzir as “mobilidades especiais”, a situações esporádicas.
Para além de uma adequação dos processos formativos, do conhecimento e do recrutamento existem, ainda, os problemas relacionados com o desempenho que já assinalamos neste blogue.
link

Um Hospital não é uma manta de retalhos. Existem em todos os sectores [departamentos, serviços e unidades] problemas organizativos. A solução desses problemas passa, obrigatoriamente, pelo trabalho de equipa que determina a capacidade de cumprir objectivos [contratos-programa] e a qualidade da resposta.
A mobilidade aporta a estes sectores factores perturbadores da operacionalidade das redes de conhecimento, do entrosamento inter-disciplinar e na questão das rotinas automáticas podem ser fatais, quando se espera ganhos com a complementaridade e interdependência de funções.
Um outro aspecto é a iniciativa individual que num quadro de mobilidade fica embotada. O “mobilizado”, por mais valor profissional que tenha, é sempre um estranho, logo, susceptível de criar atritos. Para além disso, sofre de uma natural inibição para defender e apresentar novas soluções para velhos problemas. O “mobilizado” assume o papel de espectador.
A mobilidade visa também, ou essencialmente, objectivos de redução de custos com o pessoal. Não é inocente a repetida ressalva no texto do memorando “[…incluindo médicos!]”.
O consumo de horas extraordinárias sempre foi um quebra-cabeças para os orçamentos hospitalares. O esquema de “tapa-buracos” permite o sistema funcionar aparentemente sem sobressaltos. Até ao dia em que seja possível fazer a avaliação da qualidade dos cuidados prestados. Um serviço de urgência ou de emergência médica não é uma estação de serviços rápidos do tipo “Midas” [passe a publicidade].

A pretensão [imposição] da troika relativamente a este quadro de mobilidade esbarra com ancestrais bloqueios da organização dos serviços de saúde e mesmo quando encarada no quadro geral da função pública, sempre suscitou enormes reticências, grande número de vezes por “irrazoabilidades” impostas pelos dirigentes.
Não é fácil até ao 1º. trimestre de 2012 [como determina o memorando da troika] regularizar situações cronicamente emperradas, atávicas.
Aliás, várias soluções de mobilidade, na área da saúde, têm sido ensaiadas no nosso País. Desde Manuela Arcanjo que, em 2001, pretendia “incentivá-la” em articulação com os Sindicatos
link à tentativa de inclusão, por Correia de Campos, no OE 2008 link até à sua “travagem”, em 2009, por Ana Jorge link temos tentativas de mobilidade para dar e vender.
Recentemente, os problemas surgidos com recursos humanos na Maternidade Alfredo da Costa, levaram o MS a enveredar pelo caminho da integração de instituições acrescida da mobilidade de médicos, por enquanto, dentro de um alargado Centro Hospitalar
link .
A solução da troika é, contudo, mais vasta e mais abrangente.
Como de resto se verifica em outras áreas, durante longos anos, não fizemos o trabalho de casa, nomeadamente na planificação dos recursos humanos, nem tratamos de uma [adequada] formação consentânea com as necessidades. Resta-nos, portanto, improvisar.
Com todos os custos inerentes para os actuais e futuros servidores do Estado [os bodes expiatórios do citado memorando da troika].


E-Pá!

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