Ranking dos Hospitais
Foi divulgado o ranking dos hospitais públicos referente a
2012 link ;
O escalonamento do desempenho mostra que o Centro Hospitalar
e Universitário de Coimbra ocupa o primeiro lugar. Independentemente dos
critérios observados para a ‘construção’ deste ranking – cujas dificuldades o
próprio coordenador ressalva link - nomeadamente, dificuldades na colheita de informação,
temos de reconhecer que o grande impacto deste trabalho foi tornar-se objecto
de um inacreditável aproveitamento político.
Indicadores importantes como a mortalidade, complicações,
readmissões, custos médios, demora média, etc., escondem por vezes distorções
na acessibilidade que ainda permitem espaço a alguns hospitais para
selectivamente ‘escolher utentes’ (uns ficam com a ‘carne limpa’ e outros com o
sobrenadante incluindo a ‘ossatura’), circunstância que perverte,
decisivamente, os resultados. O ‘movimento oculto de transferências’, dentro da
rede de referenciação hospitalar, está montado para esconder ou disfarçar
muitas carências (de recursos humanos, técnicas, assistenciais e de resultados)
já que distorce e influencia a procura. A acessibilidade (passiva) é hoje
confrontada com muitos sobressaltos, um dos quais muito visível - o temporal -
consubstanciado numa ‘espera’ alongada passível de ter graves efeitos
deletérios e outro mais sub-reptício - o geográfico - que se traduz na real
possibilidade de o utente ‘só parar’ num Hospital Central. Trata-se, de facto,
de uns (entre outros) ‘ajustamentos de risco’, não despiciendo. Para ilustrar
esta realidade temos dois casos recentes (o da senhora da colonoscopia e o
jovem de Chaves) que, pondo de lado ilusões e malabarismos, encerram uma
elevada probabilidade de ser a ponta do iceberg estando, por isso, para além de
situações esporádicas e acidentais.
Mas, voltemos ao ranking do desempenho dos hospitais
públicos em 2012 link.
‘Politicamente correcto’ o presidente do CA do CHUC
endereçou o ‘prémio’ aos profissionais que aí trabalham. Revelou ter apreendido
alguma coisa com sua passagem pelo XII Governo Constitucional, presidido por
Cavaco Silva, como secretário de Estado da Saúde. Sabe, como todos nós, que a
desmotivação grassa por todos os sectores profissionais que trabalham na saúde.
Logo, tentou embrulhar o dito ‘prémio’ num floreado.
Porém, não resistiu à tentação de endossar (alienar) os
resultados afirmando que eles se deviam “à reforma hospitalar em Coimbra, a
maior e a mais complexa em Portugal, foi feita com tranquilidade e resultou num
conjunto de oportunidades que temos sabido aproveitar em prol dos nossos
doentes e do Serviço Nacional de Saúde, como estes resultados demonstram” link.
Esta visão onírica e deslocada no tempo terá influenciado o
primeiro-ministro que com a sua proverbial desfaçatez e leviandade, a que já
nos habituou, ‘colou’ os resultados a uma putativa reforma (deste Governo?) em
curso na área hospitalar. Lançando-se sobre este putativo (esta expressão é do
governante) precipício não teve qualquer rebuço em começar por atacar os ‘pais
do SNS’ catalogando-os como ‘profetas da desgraça’.
Mas o ‘estrondo’ da irresponsabilidade revela-se quando
transforma a ‘anexação’ do Hospital dos Covões pelos HUC (dando origem aos
CHUC), operação também designada por ‘fusão’. As empresas (e esse será o
entendimento do primeiro-ministro sobre os Hospitais, na maioria EPE) não se
fundem, ‘canibalizam-se’ num ritual onde sistematicamente a mais forte engole a
mais débil. Trata-se de um processo sinuoso e doloroso cujo denominador comum
são as dramáticas ‘restruturações’, leia-se, ‘cortes & despedimentos’.
Passos Coelho vive inebriado com ‘resultados’ que lhe
parecem florescer, neste inverno húmido e chuvoso (que toca também a
democracia). Os resultados assemelham-se aos cogumelos que irrompem
sazonalmente entre detritos orgânicos e, como sabemos, possuem propriedades
alucinogénias. É neste quadro alucinatório, com cheiro a bolor, que o
primeiro-ministro aparece a anunciar aos portugueses uma fantástica ‘colheita
de resultados’ auspicioso fruto das suas ‘reformas’. Disse descaradamente que
‘que o recente ranking de hospitais mostra que há melhores unidades de saúde
devido às reformas do Governo’ link
Bem, o CHUC (bem como outras centros fusões que originaram
centros hospitalares) foi criado pelo decreto-lei 30/2011, de 2 Março (i. e.,
na ‘agonia’ do Governo de José Sócrates sendo ministra da Saúde Ana Jorge) link.
Um decreto-lei que surge num ambiente político já dominado
pela ‘saga dos PEC’ (visando um apressado controlo de custos orçamentais ditado
pela crise) e que per si não encerra intrínsecas ou incontestadas virtudes no
desempenho, produção e na qualidade link.
Aliás, a demonstração desta realidade está nos ‘tropeções’ que se verificaram
entre 2011 e 2012 em alguns centros hospitalares a começar pelo de S. João no
Porto e se alongaram aos de Tondela-Viseu e Leiria-Pombal.
Logo, a apropriação pelo primeiro-ministro do resultado do
CHUC é um intolerável abuso de confiança e o lugar que pretende ocupar no pódio
político (à volta deste momento de avaliação) ‘adesiva-se’ como (mais) um
‘equívoco do marketing político’ e uma manifesta atitude demagógica .
Na realidade, o actual conselho de Administração do actual
CHUC tomou posse em Dezembro de 2011 (nomeado pelo actual ministro Paulo
Macedo). A ‘integração’ dos referidos Hospitais foi um processo lento e não
isento de percalços (notória contestação das populações e das autarquias link;link;
link;
link;
…) e, durante o ano de 2012, permaneceu num estado ‘larvar’, sendo um exemplo
marcante desta dolência e precariedade o facto de as chefias intermédias
(Direcções de Serviço) terem assumido o estatuto de provisórias e transitórias.
Uma outra marca do arranque do processo foram as dificuldades de elaborar (e
aprovar) um regulamento interno (suporte básico mínimo para garantir a
funcionalidade do alargado centro hospitalar).
Aliás, é a própria administração deste hospital que anuncia
e reconhece o fim da ‘fusão’ para o final de 2013 link
(ano posterior à analise do estudo da ENSP).
Quem já alguma vez foi ‘apanhado’ por processos de mutação
integradora deste tipo conhece bem as dificuldades e as indefinições. E o tempo
que leva a integrar culturas organizativas e funcionais díspares. O ano de 2012
foi, como não podia deixar de ser, um período de adaptação a uma imberbe e
intempestiva medida legislativa (não existiu discussão prévia nem avaliação de
impactos), que não revelou outras particularidades para além do ‘arrumar da
casa’, não lhe podendo ser imputadas particulares virtudes. Pelo que o lugar
conquistado pelo CHUC no ranking (referente a 2012) nunca poderá ser – pelo
menos em 2012 – imputado à fusão.
Todavia, o primeiro-ministro apressou-se a tomar este
comboio. Tudo o que possa cheirar a ‘bons resultados’, mesmo que ténues e
efémeros, é para ‘colonizar’ como uma grande vitória e para garantir que os
portugueses estão a usufruir de resultados, supomos que decorrentes dos
sacrifícios (que prometerão ‘oportunamente’ aligeirar).
Na verdade, estamos perante uma avaliação de desempenho dos
Hospitais que, sendo um instrumento de trabalho, se transformou numa quimera
política, em nada estimulante para os profissionais da Saúde e muito
dificilmente iludirá os utentes do SNS.
E como sabemos a quimera é uma figura mitológica que se
caracterizava por espalhar, pelas cidades e pelos campos, o fogo e a morte…
Será o que nos espera se embarcarmos nas ‘fábulas reformistas’
do primeiro-ministro.
E-Pá!
Etiquetas: E-Pá, HH, Passos Coelho
1 Comments:
Grande texto. Essa dos pais que até deram a mão a este CA quando ele estava periclitante foi pouco desenvolvida.
Enviar um comentário
<< Home