
O Xavier fez bem em voltar à liça com a questão dos medicamentos e à figura do Director Clínico. Hoje, de facto, a diferença entre a boa gestão hospitalar e a gestão hospitalar de excelência, passa pelo modo como um hospital gere os seus medicamentos: se tem uma política de medicamentos, se tem uma estratégia de medicamentos, se faz uma efectiva gestão do medicamento. Isto, atendendo à fatia que os Medicamentos representam no Orçamento Hospitalar, por um lado, mas sobretudo pela importância do medicamento na missão, nos fins e atribuição principal de um Hospital, que é o de tratar doentes, o maior número de doentes possível ao menor custo. O papel principal, na gestão do medicamento, está reservado ao Director Clínico. Para além do papel insubstituível que lhe cabe enquanto tal (Director Clínico), cabe-lhe, fundamentalmente a ele, enquanto Vogal também Executivo do Conselho de Administração, propor essa política, delinear a melhor estratégia, fazer uma boa gestão, coadjuvado ou não pela Direcção dos Serviços Farmacêuticos e, eventualmente, por um Gestor de Medicamento.
A gestão da maior parte das restantes áreas do hospital pode ser feita sem dificuldade por qualquer bom administrador hospitalar, incluindo o exercício das funções de Presidente do Conselho de Administração. Talvez seja esta a razão porque estamos a verificar, na maior parte dos hospitais, uma cada vez maior eficiência na área económico-financeira, nas aquisições, na gestão informática, na gestão de doentes, na gestão dos recursos humanos, áreas onde um bom gestor (e há muitos) pode fazer um bom trabalho sem para isso precisar de grande ajuda dos médicos e até do Director Clínico. Na área do medicamento, porém, não há gestor que valha ao hospital se não estiverem verificados alguns pressupostos: que o Director Clínico seja um gestor clínico competente (como clínico e como gestor), que seja um líder efectivo da classe médica que «dirige», que saiba distinguir o acessório do essencial da sua função, que tenha a coragem, quando necessária, de afrontar os colegas, que consiga convencer, quer interna quer externamente, da bondade da sua política e tirar do seu fracasso, se fracasso tiver, as devidas ilações: assumindo a responsabilidade pelo fracasso ou, em ultima instância, demitindo-se se for demonstrado o seu fracasso ou se não conseguir convencer quem de direito da sua boa gestão.
Como diria Camões, se um fraco rei faz fraca a forte gente, um forte rei faz forte a fraca gente. Um Director Clínico «forte» pode fazer forte a fraca gente. E é sobretudo aqui que está o grande busílis dos hospitais: o rei é, na maior parte dos casos, fraco e sendo fraco não torna forte a fraca gente. Fraca por diversa razões, ou porque não se interessa pelos destinos do hospital, quando muito apenas se interessam pelo seu destino, um ou outro haverá que se interessam pelo destino do seu serviço; ou porque são ignorantes, e não maior parte das vezes, são-no (nunca vi tanta ignorância e tanta falta de cultura geral em pessoas com formação elevado nível académico como nos médicos. Nem sequer interiorizaram a célebre frase de um dos seus melhores, Abel Salazar, que dizia que o «o médico que só sabe medicina nem medicina sabe»), ou porque são arrogantes (a arrogância médica é, em regra, detestável, e, quanto mais incultos e incompetentes, mais arrogantes são), ou, pura e simplesmente, não gostam de ser médicos (apenas gostam do dinheiro que a medicina pode dar, e, alguns, nisso são exímios, estando pura e simplesmente a cagar-se para os doentes e para nós todos). Dá dó, ver o comportamento da classe médica hoje, nos hospitais (falo da classe, não de indivíduos): não têm postura de classe, não têm valores de classe, não têm pura e simplesmente valores, não conseguem ver além do seu nariz, têm preocupações rasteiras (o bom carro, as boas gajas, férias na neve, as tainadas, bahh…uns escarros, alguns!).
Onde vemos hoje médicos com a fibra de Abel Salazar, Pulido Valente, Albino Aroso, António Galhordas, Miller Guerra?
Onde vemos hoje médicos preocupados com os direitos dos doentes, com a economia do seu hospital, com a imagem do seu hospital, onde vemos hoje médicos a defender a ortodoxia (os valores clássicos da medicina. «Nunca houve nada tão perigoso e tão excitante como a ortodoxia», dizia Cheterston, citado por Slavoj Zizek. Não pensam assim os médicos, concerteza!).
Os médicos têm de se re-organizar, «re-ordinizar». A sua Ordem continua a dar a pior imagem de corporativismo que se conhece. Nós, primeiros nós, sempre nós, depois o resto. No entanto, enquanto não se «re-ordinizam», que os homens (médicos) de bem se assumam como grandes homens (médicos) de bem. Que assumam o seu papel de autênticos gestores clínicos. E assumindo-o (o papel de gestores clínicos) que transformem um mau hospital num bom hospital e um bom hospital num excelente hospital.
A pedra de toque da boa gestão clínica, da qualidade do Director Clínico, está na boa gestão do Medicamento. Gerir bem o Medicamento é dar ao doente o que ele precisa ao menor custo possível!
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